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02/06/2005 |
Sobre a alteração das regras do sigilo bancário |
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Intervenção do deputado Francisco Madeira Lopes Sobre a alteração das regras do sigilo bancário,
Assembleia da República a 2 de Junho de 2005
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
O nosso sistema fiscal tem, de acordo com o texto da nossa lei fundamental, por principal missão a prossecução de dois grandes objectivos: a satisfação das necessidades financeiras do Estado e a repartição justa dos rendimentos e da riqueza entre a população.
Se o primeiro é absolutamente vital para a manutenção do nosso estado de direito social, o qual, por força das conquistas civilizacionais e direitos fundamentais que o homem em sociedade foi adquirindo, como o acesso à educação ou a cuidados de saúde, não pode conhecer retrocessos na prossecução de uma sociedade cada vez mais livre, justa e solidária, não menos importante se apresenta o segundo.
Com efeito, a injustiça e desigualdade existentes no nosso sistema fiscal, apontados como uma das causas que levam ao não cumprimento das suas obrigações fiscais pela parte de alguns contribuintes, é um aspecto que merece o mais firme e decisivo combate.
E, embora possa não parecer à primeira vista, é também isso que aqui está hoje em causa. A fundamental diferença entre as realidades de quem trabalha por conta de outrem, designadamente entre funcionários públicos que simplesmente pagam impostos à cabeça, descontando antes de receberem, e a realidade de profissionais liberais ou empresas, sujeitos a controlo muito menos rigoroso, associada aos ataques que neste momento sofre o sector da função pública, acusado de ser um dos grandes responsáveis pela sangria das finanças do estado, não permite vacilações quando se trata do Governo assumir as suas responsabilidades nesta área.
Por isso, o combate à fraude e evasão fiscais, à corrupção e criminalidade económica, combate esse que, apesar dos muitos discursos e boas intenções, infelizmente tarda, tem que ser, de uma forma claramente assumida, um desígnio nacional.
Neste âmbito, uma legislação adequada, completa, coerente e eficaz é fundamental. Fundamental, mas claramente insuficiente. Certamente que não basta. É preciso dotar a administração fiscal de meios materiais e humanos, em termos informáticos e inspectivos, que lhe permita levar a cabo esta tarefa fundamental.
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Não estamos em condições de recusar a implementação de todos os meios ao nosso alcance, pois só com todos os meios e a assunção clara desta tarefa como prioritária, sem hesitações ou pretextos dilatórios, se poderá fazer progressos decisivos nesta matéria. Sem deixar de salvaguardar o fundamental domínio dos direitos e garantias dos cidadãos e contribuintes, não se pode deixar de dar passos certos e seguros no sentido de dotar a administração fiscal do maior número de mecanismos que lhe permita, não só reunir elementos a posteriori, depois de detectada qualquer irregularidade ou uma fundada suspeita de irregularidade, mas para além disso, que lhe permita, através do confronto de informações bancárias com os dados obtidos através das declarações de rendimentos, despistar novas fugas e violações ao dever de pagar impostos.
Não se trata aqui de levantar ou acabar com o sigilo bancário em qualquer caso, mas sim apenas permitir à Administração Fiscal o acesso a dados fundamentais que lhe permitam construir um sistema que se apresente como menos falível, que permita cada vez menos impunidades, oferecendo cada vez mais garantias de imparcialidade e igualdade.
Por isso, “Os Verdes” declaram a sua concordância genérica com os objectivos para que tende esta iniciativa legislativa que aqui está hoje em discussão.
Este projecto de lei propõe soluções concretas que poderão ser discutíveis, como é o caso da Comissão para a transparência fiscal que prevê, e que importará certamente aprofundar em sede de especialidade no sentido de melhorar este projecto de lei com vista a torná-lo, de facto, na sua aplicação prática, num instrumento útil e eficaz sem desvirtuar o importante fim para que tende que é precisamente ajudar a acabar com a fraude e evasão fiscal, contribuindo para a construção de um sistema mais justo e igualitário.
Os proponentes desta iniciativa já demonstraram a sua disponibilidade e abertura nesse sentido, facto que consideramos fundamental para o sentido de voto que o Partido Ecologista “Os Verdes” irá exprimir na votação que decorrerá daqui a pouco.