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Declarações Políticas
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11/12/2002
Sobre a Greve Geral
Declaração Política Deputada Heloísa Apolónia Sobre a Greve Geral
Assemblei da República, 11 de Dezembro de 2002
 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Sr Presidente, Srs Deputados,

As minhas primeiras palavras, nesta declaração política, são, em nome dos Verdes, de saudação e de solidariedade, e dirigem-se aos milhares e milhares de trabalhadores que ontem estiveram em greve, aderindo, construindo e reforçando um grande momento de protesto nacional. Foram trabalhadores de diferentes sectores, de inúmeras empresas, de diferentes quadrantes políticos e partidários que de norte a sul do país disseram um rotundo “não” ao pacote laboral que o Governo procura impor ao país.

Srs Deputados

Este Governo tem um objectivo: todas as áreas potenciais geradoras de lucro são para entregar ao sector privado. O sector público que serve os interesses dos cidadãos em geral, particularmente daqueles que mais carências têm, esse é para reduzir ao mínimo dos mínimos nalguns casos e noutros mesmo para eliminar, para não atentar contra os interesses das grandes empresas, da banca e até de grandes multinacionais. O Governo está a pôr em causa sectores tão necessários ao país como a saúde, fragilizando o serviço nacional de saúde, como a educação, onde a primeira preocupação do Governo foi encerrar escolas, lançar para o desemprego milhares de professores, deixar instituições de ensino sem financiamento necessário para o seu normal funcionamento, como está a pôr em causa a segurança social, através dos regimens complementares de contribuição e do plafonamento, ou o sector dos transportes, ou sectores tão estratégicos para o desenvolvimento como a água.

Definido este objectivo por parte do Governo percebe-se que a proposta de Código de Trabalho que entrou na Assembleia da República não tem outro objectivo que não o de maximizar lucros às empresas através da fragilização dos direitos dos trabalhadores. As empresas passam a poder pôr e dispor dos seus trabalhadores conforme lhes convier, hoje é preciso, amanhã não será vai para a rua, horário e local de trabalho estipulado pela empresa, pagamento do trabalho nocturno eliminado nesta primeira fase até às 23h, concerteza em futura revisão o objectivo será eliminar esse pagamento por completo, partem do princípio que mulheres a trabalhar são uma chatice, quando decidem ter filhos ficam em casa a gozar a sua licença de maternidade e quem se “lixa” é a empresa – só há um problema nesta visão das coisas, é que os trabalhadores não são coisas inanimadas, são pessoas, têm família, precisam de viver. Creio que se toda a gente se puser por um momento que seja no lugar de trabalhador com contrato a prazo anos a fio, podendo estar hoje a trabalhar e amanhã no desemprego, se toda a gente pensar como seria dramático se acontecesse consigo, então percebe o valor da luta que se tem travado neste país e que teve ontem um momento muito alto de expressão social.

Como é possível que o Governo que se diz tão preocupado com a saúde e a produtividade das empresas não tenha tomado medidas necessárias para garantir a intensificação e a melhoria da formação profissional no país, a formação de bons gestores, isto sim fundamental para uma eficácia de gestão e de trabalho nas empresas, assim como a aposta em equipamentos modernos. Porque será que na perspectiva do Governo e de muitos empresários a produtividade das empresas passa por trabalhadores sem direitos?! Isto é profundamente inaceitável. As novas gerações de trabalhadores que vivem direitos conquistados durante décadas por outros trabalhadores, têm hoje o dever para si e para futuras gerações de não deixar perdê-los, de garanti-los, de reforçá-los. Só assim a produtividade deste país será real, só assim é possível responsabilizar todas as partes pelo desenvolvimento deste país.

Sr Presidente

Srs Deputados

As diversas iniciativas de contestação às medidas anti-sociais que este Governo tem tomado, têm revelado e evidenciado, uma luta crescente de oposição às políticas do Governo, o que anunciou com alguma antecipação o sucesso desta greve geral.

Este sucesso antecipadamente adivinhado levou a que se promovessem diversas formas de pressão, na tentativa de arredar o máximo de trabalhadores da adesão a este protesto geral. Desde logo, alguns empresários optaram por incutir o receio a muitos funcionários, chantageando e moldando atitudes na procura de relacionar a opção de participação na greve com o eventual risco de perda de posto de trabalho. Foi a procura de instalar o medo, para conseguir processos de recuo de adesão à greve, medo que a precarização do trabalho que hoje existe já instala por si só.

Depois foi a definição dos serviços mínimos pelo Governo, de uma forma perfeitamente abusiva e autoritária, inventando noções muito abrangentes de serviços imprescindíveis, procurando que o impacto da greve fosse minimizado.

E no decurso da greve houve ainda alguma tensão e pressão policial numa atitude claramente intolerante e provocatória em relação a quem legitimamente exercia o seu direito.

Apesar de todas estas tentativas de constrangimento e de redução do âmbito desta greve geral, não há dúvidas que esta cumpriu de longe os seus objectivos. Pôs os portugueses a reflectir, a procurar conhecer, a debater os ensaios do Governo para fragilizar os trabalhadores, generalizando ainda mais o sentimento de justeza destas iniciativas e destas formas de protesto, conquistando mais adeptos para a necessidade de exigência de justiça social neste país.

Mas se esta greve geral foi clara nos seus propósitos, foi também claríssima nos seus resultados. O país passou ontem uma mensagem muito evidente ao Governo, de profundo descontentamento em relação às medidas anti-sociais que tem tomado e de uma vontade inequívoca por parte dos trabalhadores de indisponibilidade total para prescindir e abdicar de direitos conquistados durante décadas e décadas, que foram conquistados porque eram justos. E é importante não esquecer o papel fulcral que o movimento sindical teve na conquista desses direitos.

Procurar ignorar o que aconteceu ontem é uma aberração governativa, e o que é inacreditável, Sr Presidente e Srs Deputados, é que depois dos resultados da greve geral o Governo, com toda a sua postura de arrogância, tenha voltado a referir que não se desviará um milímetro dos seus propósitos, palavras do Sr 1º Ministro. Afinal, pergunto eu, o Governo está a negociar ou a concertar o quê, quando há não sei quanto tempo afirma peremptoriamente que não se desviará um milímetro das suas intenções em relação ao pacote laboral. Negociações-fantoche destas já são bem conhecidas, é por isso que “Os Verdes” consideram que esta greve geral foi muito oportuna, foi atempada, porque deixar que o facto se consume mais e mais, deixar que se aprove a proposta de lei, é tardar na resposta e colher os seus frutos. O país deu ontem uma resposta justamente necessária à medida da gravidade da legislação laboral que o Governo quer impor.

Certamente que perante uma atitude insistente em propostas desonestas para os trabalhadores, em respostas intolerantes por parte do Governo, os trabalhadores portugueses adoptarão outras formas de luta, diversificadas, mas ganhando sempre mais adeptos e, desde já quero deixar claro que contarão sempre com a solidariedade de “Os Verdes” nessas iniciativas.

Sr Presidente

Srs Deputados

Aproveitando o facto de estar a produzir uma declaração política, não posso deixar de manifestar a profunda preocupação dos Verdes em relação ao facto de o Navio Prestige estar já num processo de ruptura do casco edos depósitos que contêm o fuel que leva a uma previsão de libertação de entre 125 a 250 toneladas dia, num processo que pode arrastar este desastre ecológico com muita intensidade por mais de 3 anos.

As consequências ambientais, sociais e económicas desta catástrofe ecológica são já de grande proporção, mas as conhecidas provavelmente ainda muito aquém da dimensão que poderão atingir.

Portugal, já atingido por manchas muito significativas de fuel a escassos quilómetros da nossa costa, e sem previsões concretas em relação a futuras consequências, porque agora dependemos do sabor dos ventos, deve tomar uma atitude muito veemente de exigência de intervenção também por parte e no âmbito da União Europeia.

Aproveito também para anunciar que uma delegação de “Os Verdes” estará novamente amanhã em Caminha e na Galiza e a Comissão Executiva Nacional de "Os Verdes" reunirá no próximo sábado no Porto, onde serão apresentados um pacote de iniciativas legislativas que visam precisamente adoptar medidas preventivas e eficazes contra este tipo de desastres ecológicos que de tão previsíveis que eram assumem uma responsabilidade muito mais significativa e muito mais preocupante, e com maior gravidade quando os Governos erram e tardam nas respostas adequadas. Melhor que remediar, com tantos prejuízos, é sempre prevenir.

Disse

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