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Declarações Políticas
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12/03/2003
Sobre a Guerra contra o Iraque
Declaração Política
Deputada Isabel Castro
Sobre a Guerra contra o Iraque
Assembleia da República, 12 de Março de 2003
 
 

 

 

 

Exma. Senhora Presidente

Exmos. Senhoras e Senhores Deputados

Portugal e os portugueses não estão com o 1º Ministro.

Esta é, depois do gigantismo das acções de 15 de Fevereiro em todo o mundo e em Portugal que reuniu sem barreiras religiosas, filosóficas ou políticas gente das mais variadas condições em favor da paz, a resposta de indignação e de revolta que surge por todo o país de milhares de portugueses, face ás declarações proferidas no Luxemburgo, por Durão Barroso, enquanto 1º Ministro de Portugal.

Declarações de quem se predispôs em nome do nosso país a apoiar incondicionalmente uma intervenção unilateral dos Estados Unidos da América, contra o povo do Iraque.

Ou, dito de outro modo, de quem se predispôs a aceitar uma ofensiva belicista contra um povo inocente, à margem e sem o suporte de qualquer decisão tomada pela comunidade internacional e pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Declarações reveladoras, afinal, do desprezo do Governo Português pelo direito internacional, do desdém pelos princípios definidos na Carta das Nações Unidas.

Da aceitação acrítica do regresso à barbárie, em pleno século XXI, implícita na cobertura desta agressão militar que representa o retorno à lei do mais forte, um sombrio recuo civilizacional e a dispensa de todos os sistemas de regulação criados pela comunidade internacional, depois da grande guerra que têm, não obstante as suas reconhecidas limitações, procurado a gestão global de bens pertença de todos e a resposta a questões de que depende o futuro da humanidade.

Declarações que põe em causa os meios, até agora os únicos existentes, para tentar impedir o caos, o arbítrio, o recurso à força das armas nas relações e nas tomadas de decisão, à escala planetária.

Declarações, ainda, do 1º Ministro Durão Barroso que representam, na sua desumanidade, a atitude cobarde de quem escolhe colocar-se não ao lado da vida e nos caminhos da paz e na margem daqueles que acreditam e lutam pela resolução pacífica dos conflitos entre os povos, mas servilmente ao lado dos senhores da guerra, da violência e da indústria da morte.

Uma atitude chocante visível em declarações de enorme agressividade que constituem pelo modo como foram proferidas e, para todos os efeitos, a proclamação de uma declaração de guerra e a condenação à morte de vidas inocentes de um país dominado por um tirano, com todas as dramáticas consequências para o interesse nacional, mas também para a desordem, a insegurança e a crise planetária que irá naturalmente gerar.

Declaração essa de guerra do 1º Ministro da maior gravidade e que constitucionalmente lhe não cabe.

Uma atitude Sras. e Srs. Deputados, que constitui desde logo uma afronta inqualificável ao Presidente da República que publicamente se tem posicionado, repetidas vezes, como é natural, favorável a uma solução pacífica para o problema do Iraque, respeitadora do direito internacional e no quadro exclusivo das Nações Unidas.

Uma atitude do 1º Ministro que representa, em segundo lugar, o menosprezo total pelo Parlamento, a casa comum da democracia e pelos cidadãos através dos partidos, nele representados, bem como pelos cidadãos que nas ruas manifestaram de forma eloquente a sua viva oposição à guerra.

Uma atitude política, a de alinhamento com uma guerra preventiva, com uma acção belicista e a declaração de guerra contra um povo que representa ainda, uma grosseira violação da Constituição já que não se reporta – como é evidente – a uma mera menor questão de política externa, cuja competência possa em exclusivo ao executivo caber, mas o pronunciamento sobre uma matéria cuja solenidade, como o é da decisão sobre a vida e a morte, a paz ou a guerra, tem de ser por todos, desde logo pelo Presidente da República, nos devidos termos tomada, com respeito pelo direito internacional pelo qual se pauta a política externa da República Portuguesa na relação com os outros povos.

Uma decisão, Sras. e Srs. deputados,

Nos termos irresponsáveis da atitude tomada e das declarações feitas pelo 1º Ministro Português, a que se juntou de forma canhestra o actual inquilino das necessidades, que vem pôr a nu a hipocrisia do Governo Português e a sua permanente fuga à verdade perante os portugueses, na abordagem desta delicada questão perante a qual nos temos de posicionar.

Uma permanente fuga à verdade e uma hipocrisia que tem sido a marca constante do 1º Ministro e do Governo da maioria em todo este processo.

Uma fuga permanente e uma hipocrisia com efeito, que conduziram bem cedo a um comportamento acrítico e seguidista do Governo em relação aos EUA e à tomada de uma iniciativa impulsionada pela actual administração norte americana em seu favor e contra a procura de uma posição construtiva e comum da Europa, em favor da paz como o foi a subscrição, à margem do Parlamento, da chamada carta dos 8 de manifesto carácter divisionária e de inviabilização de uma posição da União Europeia em favor de uma solução pacífica para o médio oriente e o Iraque;

Uma fuga permanente à verdade e uma hipocrisia que explicam, em segundo lugar, de igual modo o recurso à bandeira de conveniência sob a qual o 1.º Ministro Durão Barroso, se entrincheirou no debate na ar, ao evocar a sua identificação com a declaração comum saída do Conselho Extraordinário de Bruxelas do passado dia 17 de Fevereiro, também ela o artificio utilizado para se abrigar das suas verdadeiras intenções, esconder das opções do Governo que manifestamente com elas não coincidem na procura da paz aí expressa, a na busca de uma solução pacífica para o desarmamento do Iraque, na recusa da inevitabilidade de guerra, que na prática se nega, no reconhecimento do papel insubstituível do direito internacional e das Nações Unidas para travar uma guerra de que à partida este Governo, é partidário.

Uma atitude que mais não foi do que o recurso encontrado pelo 1º Ministro para com a sua própria bandeira de conveniência, mentir aos portugueses e esconder da opinião pública a irracionalidade, a ameaça, o risco para Portugal, das opções que verdadeiramente defende.

Opções que não obstante a campanha da mentira desencadeada, irão significar, na escolha dos caminhos de guerra não a destruição de um ditador, Saddam, mas a morte, o sofrimento, e a dor precisamente daqueles que são as suas vitimas, os civis, as mulheres e as crianças iraquianas inocentes que actualmente já sofrem de doença por subnutrição ou escassez de água, e que serão as mais brutalmente visadas nesta agressão, não só no imediato, mas a prazo, na catástrofe ecológica que a guerra forçosamente irá provocar.

A mentira de uma guerra que não é feita pela procura do equilíbrio, da paz, da liberdade e do fim da pobreza nesta conturbada região, como o discurso moldado na mentira pretende fazer crer, mas pela pilhagem de recursos naturais, no caso o petróleo e a água, pela vontade hegemónica de dominação de uma região cujo mapa se pretende redesenhar, pela escolha da morte e da indústria que alimenta contra a vida e contra a paz.

Uma guerra pois no entendimento dos Verdes e de muitos cidadãos do mundo, ética e politicamente inaceitável assim o entendemos (e milhões de outros seres das mais diversas crenças políticas, filosóficas ou religiosas no planeta) Sras. e Srs. Deputados.

Uma guerra que deixa o mundo de luto, semeia o sofrimento, a destruição e a morte e contra a qual é nosso dever, em nome da vida, da paz, e da humanidade condenar sem hesitações e não desistir de tentar, como é nossa responsabilidade, como nos impõe a nossa condição de seres humanos, por todos os meios ao nosso alcance, procurar evitar.

Disse.

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