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12/06/2002
Sobre a Revisão da Política Comum de Pescas
Assembleia da República
Reunião Plenária N.º 19, de 12 de Junho de 2002
Debate sobre a Revisão da Política Comum de Pescas
 
 

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 20 minutos.

(...)

Srs. Deputados, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia da República, vamos dar início ao debate de interesse político relevante sobre política de pescas, (...)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, gostava de começar por referir que os pescadores, nomeadamente os portugueses, têm neste momento legitimidade para viver um período de grande insegurança relativamente ao seu futuro. De facto, a perspectiva da degradação da actividade pesqueira e a perspectiva ou a iminência do desemprego não são situações com as quais seja fácil lidar, porque, na verdade, esta perspectiva de incerteza relativamente ao seu futuro é uma questão bastante legítima.

E eu gostava de perceber exactamente o que é que, neste momento, o Governo português pode dizer aos pescadores relativamente a esta matéria. Para isso é preciso perceber o que é que claramente tem resultado das conversações com os outros países que têm interesses idênticos aos nossos, e que já aqui foram referidos.

O Sr. Ministro diz que irá até onde puder, mas isso é muito vago. Falou-se primeiro do veto, depois fala-se da minoria de bloqueio. Mas exactamente até onde é que podemos ir e que mecanismos podemos utilizar para inviabilizar definitivamente esta proposta? Creio que era fundamental que conhecêssemos estas questões concretas.

Por outro lado, gostava também de perceber a perspectiva do Governo relativamente à questão da sustentabilidade dos recursos. O Sr. Ministro referiu que a renovação da frota não é incompatível com a sustentabilidade dos recursos. Sendo que, na nossa perspectiva, esta proposta da Comissão também não dá resposta àquele que é o argumento de base para a sua apresentação, nomeadamente a preservação dos ecossistemas marinhos, gostava de perceber o que é que, na perspectiva do Governo, era fundamental fazer tendo em vista uma necessidade efectiva, que é, de facto, a sustentabilidade dos recursos.

Como o Sr. Ministro também referiu na sua intervenção, esta proposta da Comissão não tem em conta o esforço de cada Estado-membro relativamente às obrigações que tinha no que concerne à pesca. Os Estados-membros têm interesses diferentes, fizeram esforços diferentes e têm necessidades diferentes, e, por isso mesmo, esta proposta tem impactes diferentes nos diferentes Estados. Gostava, portanto, de saber se não o preocupa este modelo de construção europeia que insiste em não ter em conta as especificidades, as diversidades e as diferentes realidades de cada Estado-membro e de cada região em concreto.

O Sr. Presidente: - Para responder a todos os pedidos de esclarecimento formulados, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas. Dispõe para o efeito de 5 minutos.

O Sr. Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas: (...) - Em relação às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, direi que, como é evidente, estamos preocupados com a eminência do desemprego não só na pesca. Mas nós não somos, claramente, pela política de abates! Somos completamente contrários à política de abates, que têm um cortejo de consequências sociais que todos conhecemos.

Perguntou a Sr.ª Deputada até onde é que podemos ir. Acho piada à sua pergunta, mas não vou responder-lhe.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Não?!

O Orador: - Não lhe respondo para depois não ser acusado de andar de lado, de frente, para trás… É uma questão que pode ter a sua piada, mas à qual, por agora, não respondo, se me der licença.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não sabe!

O Orador: - Não vejo necessidade de responder nesta fase. Com toda a franqueza, penso que respostas antecipadas a estas questões só podem prejudicar a nossa negociação.

Relativamente aos ecossistemas marinhos, estamos muito de acordo com o que a Sr.ª Deputada disse. Portugal tem conseguido preservar os ecossistemas, pelo que até se tem comportado de uma maneira muito idónea nesta matéria. Estamos completamente de acordo com a sustentabilidade dos recursos e é por isso que, como temos dito no Conselho, consideramos não ser incompatível modernizar a frota e conservar os recursos. Vamos insistir nesta matéria e faremos essa demonstração ao longo do tempo que temos pela frente.

(...)

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminado o debate propriamente dito, vamos dar início às intervenções de encerramento do debate.

O Sr. Presidente: - (...) tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, que dispõe de 5 minutos.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A proposta da Comissão Europeia é apresentada em nome de um conjunto de questões ambientais, da imperiosa sustentabilidade dos recursos e da defesa dos bancos de pesca.

É legítimo reconhecer-se que Os Verdes estão, como sempre estiveram, muito sensíveis a esta questão. Mas, Srs. Deputados, é este tipo de medidas e de respostas, como as que agora são apresentadas pela Comissão, que descredibiliza a verdadeira seriedade desses mesmos objectivos. Desde logo, não é o número de unidades que constitui uma frota que determina a quantidade de captura. Lembro que a Holanda regista uma quantidade de peixe capturado que ultrapassa em muito a nossa, com um frota muito mais reduzida.

Portanto, a redução do número de embarcações não determina, por si só, a redução do esforço de pesca. As técnicas, o tipo de embarcação e outros factores são imprescindíveis nesta abordagem. Assim, o objectivo central da Comissão - abater barcos, reduzir substancialmente o número de pescadores - não é a solução para a sustentabilidade dos recursos.

Fala-se na defesa dos recursos, mas esquece-se de que o transporte marítimo tem implicações negativas nos mesmos, de que a poluição marítima contribui para a sua redução e eliminação, de que se tem apostado em quase nada na investigação em torno desses recursos. Logo, é imperioso agir sobre estes elementos para assegurar sustentabilidade, mas disto a Comissão não fala. Nem tão-pouco se tomam, como prioritárias, medidas como os períodos de paragem biológica, para garantir sustentabilidade, respeitando as épocas de reprodução, ou como a aposta em segmentos de frota menos predadores, ou como a exigência de técnicas mais selectivas. Aquilo que, na verdade, se toma como prioritário é a destruição da pesca, reduzindo-a em cerca de 60%, com o abate de cerca de 8500 embarcações e a eliminação de cerca de 28 000 postos de trabalho.

Uma política comum de pescas que tem tido como prioridade, e continua a tê-la, com todo o fulgor, a destruição da actividade pesqueira e a nossa, cada vez menor, auto-suficiência é um falhanço. Importamos cada vez mais pescado, mas não vejo a Comissão preocupada com o controlo dos produtos que vêm de fora ou com a degradação dos recursos que se promovem noutros mares. Somos cada vez mais dependentes do exterior na nossa alimentação e no peixe em concreto - não é outra a realidade -, o que é especialmente grave num dos países de maior consumo de peixe, como é o caso de Portugal.

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Outra questão que nos parece sobremaneira grave é esta insistência num modelo da construção europeia que resiste permanentemente a tomar em conta a especificidade e as diferentes realidades de cada Estado-membro.

Então, se um país como Portugal ultrapassou os objectivos que lhe estipularam ao nível da destruição da frota pesqueira - e nós abatemos, como aqui foi referido insistentemente, mais de 40% da nossa frota -, tendo abatido mais barcos do que o devido, como é que pode ser tratado da mesma forma como, por exemplo, a Holanda, que, para além de não ter diminuído, ainda a aumentou a sua frota?

A Europa continua a basear-se numa matemática pouco humanizada e realista - isto é como dizer que, se um não come peixe e o outro come cinco, então a média de consumo é de 2,5. Pede-se o mesmo sacrifício a quem não pode, nem deve, sacrificar-se da mesma forma.

Num país de mar, como Portugal, onde, apesar de tudo, a pesca ainda é um sector estratégico, é fácil adivinhar o problema económico que esta proposta da Comissão Europeia constitui. Para além disso, é facilmente perceptível o drama social que ela comporta num sector que tem sido tão penalizado e para o qual o objectivo central continua a ser a sua destruição, com a consequente eliminação de postos de trabalho e, pior ainda, sem garantias de uma efectiva sustentabilidade dos recursos e da efectiva qualidade do pescado e com a agravante de uma dependência do exterior cada vez maior.

É verdade que a degradação da biodiversidade e a destruição dos ecossistemas marinhos têm sido uma realidade. Mas a resposta não é aquela que a Comissão quer dar, certamente com outros interesses por detrás, porque tem necessariamente de olhar a todas as formas de delapidação desses recursos, tem de ter em conta as diferentes realidades dentro da União Europeia e os diferentes esforços que foram empreendidos pelos Estados-membros. Não pode ser chegar e transformar um instrumento financeiro de orientação de pesca virado para a reconversão e modernização da frota num mecanismo de abate da frota e de despedimento orientado de pescadores.

Por outro lado, partir do princípio de que os pescadores não são os mais interessados na sustentabilidade dos recursos de pesca, sendo que é o seu emprego e o seu futuro que estão em causa, é partir de uma lógica completamente errada. É preciso uma maior participação dos pescadores na gestão da política de pescas, envolvê-los nas decisões e nas medidas necessárias a tomar para cumprir determinados objectivos, que, neste caso, é a da preservação de uma actividade pela garantia dos recursos. É aos pescadores que isto mais interessa.

Sr. Ministro, o futuro da pesca em Portugal está em perigo. Creio que, hoje, houve unanimidade nesta Câmara relativamente a esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe para concluir, pois já se esgotou o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Termino, Sr. Presidente, dizendo que lamento que algumas questões importantes tenham ficado por esclarecer, tais como a da prorrogação das 12 milhas para uso exclusivo do nosso país e a nossa estratégia com Espanha no que toca a esta matéria, ou até onde se pode ir de facto na defesa dos nossos interesses.

Pena é que o Governo não tenha sido tão esclarecedor relativamente a esta matéria, mas, de todo o modo, realço a grande oportunidade deste debate.

Vozes de Os Verdes (...): - Muito bem!

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