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12/01/2006 |
sobre a sustentabilidade da Segurança Social |
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Declaração política do Deputado Francisco Madeira Lopes acerca das recentes declarações do Sr. Ministro das Finanças sobre a sustentabilidade da Segurança Social
Lisboa, 12 de Janeiro de 2006
Sr. Presidente, Srs. Deputados,
Na última segunda – feira o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos, protagonizou no canal 1 da televisão pública um episódio tremendamente infeliz ao traçar um cenário de desastre e, mais grave, de quase inevitabilidade de ruptura e falência da sustentabilidade da nossa Segurança Social, afirmando que dentro de alguns anos, em 2015, já não haveria dinheiro para pagar as pensões de reforma.
No dia seguinte, o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, José Vieira da Silva, veio corrigir o seu colega de Governo dizendo que “existem condições para vencer as dificuldades de sustentabilidade da Segurança Social, desde que sejam tomadas as medidas adequadas”.
A Segurança Social é um dos pilares fundamentais do nosso Estado de Direito Social e Democrático, inscrito no artº 63º da Constituição da República Portuguesa, indispensável na construção da tal Sociedade livre, justa e solidária, na qual, segundo o artº 1º da nossa lei fundamental, todos deveríamos estar empenhados.
Infelizmente, os direitos e as conquistas de Abril, alcançados pelo povo português, vêem-se cada vez mais ameaçados e postos em causa.
Por alturas da discussão e aprovação do actual Código do Trabalho, entre vários ataques que este mesmo diploma veio perpetrar contra os direitos sociais e sindicais dos trabalhadores, tentou-se instalar na opinião pública, a ideia de que o direito ao trabalho e ao emprego não podiam estar garantidos a ninguém no mundo capitalista e globalizado de hoje e que, portanto, as pessoas tinham que se mentalizar para aceitar esta inevitabilidade.
Há menos tempo, já com este Governo, tentou-se passar a ideia de que não era simplesmente possível, física ou tecnicamente possível, porque é neste domínio que o Governo gosta de se colocar, como se as opções políticas dependessem apenas duma lógica tecnocrática de eficiência e não de opções ideológicas fundadas em valores, que não era simplesmente possível aumentar salários sem realizar despedimentos na Função Pública, pois a tal nos condenava a inevitabilidade do défice das contas públicas.
Esta semana, apesar de rapidamente desmentido ou contrariado pelo seu colega do Trabalho e Solidariedade Social, usando o Governo a técnica do mau polícia e do bom polícia (passo a expressão), ou do passo à frente e passo atrás, o Sr. Ministro das Finanças, com as suas declarações, teve, na opinião dos Verdes, um propósito muito claro, nada inocente, irreflectido ou que se pudesse justificar com uma eventual ignorância relativamente à situação da previdência, e que consistiu na óbvia intenção de continuar a acentuar na opinião pública a ideia de que, a sustentabilidade da Segurança Social portuguesa está, a médio prazo, posta em causa, correndo o risco de falir daqui a 10 anos, lá para 2015.
Esta ideia, sustentada no argumentário, por um lado, dos factores incontroláveis da demografia, em que as baixas taxas de natalidade e de mortalidade condenam ao envelhecimento a estrutura etária da nossa população, como no resto da Europa, factor apenas contrariado pela imigração que tem dado um contributo importante para produtividade nacional, e por outro, no desemprego que actualmente se encontra nos 7% com tendência para crescer até ao ano que vem em direcção aos 8%, que representariam factores de pressão sobre o défice da Segurança Social, vai a pouco e pouco fazendo caminho e instalando-se insidiosa e perigosamente na sociedade portuguesa, causando um evidente alarme e preocupação entre todos os portugueses que fizeram e fazem regularmente os seus descontos e cujo futuro depende do funcionamento e sustentabilidade do actual sistema de Protecção Social.
Com as declarações do Sr. Ministro das Finanças, ficaram certamente satisfeitos todos aqueles que desejariam assistir a uma corrida dos trabalhadores portugueses aos sub-sistemas complementares de reforma oferecidos, designadamente, por privados e pela banca que esperam certamente aumentar ainda mais para 2006 os astronómicos lucros que já auferiram em 2005.
Mas para além disso, Srs. Deputados, a conclusão que se pode tirar do Relatório da Sustentabilidade da Segurança Social anexo ao Orçamento de Estado de 2006, que traça um quadro negro e muito preocupante, das projecções feitas pelo Governo que procuram demonstrar que, por mais medidas que se tomem (em contradição com as recentes declarações do Sr. Ministro do Trabalho) o défice é inultrapassável com o actual sistema de financiamento de pensões e da dramática e grave afirmação do Sr. Ministro das Finanças, é que o objectivo do Governo é de, tal como fizeram recentemente com a segurança social da Função Pública, procurar justificar as medidas que já tomaram ou se preparam para tomar, no sentido de prejudicar os trabalhadores por contra de outrem do sector privado.
Sabemos que a conjuntura da Segurança Social não é fácil, e que se tem vindo a agravar fruto não só das medidas que não têm sido tomadas pelos sucessivos governos para inverter a situação, bem como da grave crise económica que tem sido acentuada pela obsessão pelo défice público, matéria em que o actual Governo do PS insiste em prosseguir aquela que foi a política de direita nos últimos anos.
Mas a verdade é que este cenário catastrófico e alarmista agora desenhado pelo Governo, não é inevitável e estamos perfeitamente a tempo, dado que a reserva do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social não só garante a sua sustentabilidade financeira a curto prazo como é suficiente para garantir margem temporal para a tomada de medidas que a garantam a mesma sustentabilidade a médio e longo prazo.
Como o estudo apresentado pelo Dr. Eugénio Rosa, até há pouco tempo deputado nesta câmara, bem demonstra as causas prendem-se, não apenas pelo simples decréscimo de população activa face aos pensionistas, mas sobretudo pela desadequação do actual sistema que, continuando a fazer recair o financiamento maioritariamente sobre as contribuições dos trabalhadores e das empresas, não tem em conta, por exemplo, o facto da riqueza média criada por cada trabalhador ter vindo gradualmente a crescer ao longo dos anos enquanto a retribuição média auferida pelo mesmo trabalhador tem vindo a descer. Ora, como esta retribuição é a base de cálculo dos descontos feitos pelas empresas, o financiamento da segurança Social não tem acompanhado o real crescimento de riqueza no nosso país, mas apenas o real decréscimo do peso dos salários e ordenados no nosso Produto Interno Bruto.
Outra das causas que contribuem para o sub-financiamento da Segurança Social, como bem denunciou ontem a CGTP, é o volume enorme de salários sub-declarados por entidades patronais e os resultados manifestamente insuficientes no combate à fraude e evasão no pagamento das contribuições e quotizações. De acordo com informações trazidas a esta Assembleia durante o debate do último orçamento de estado o Governo prevê em 2005 recuperar 200 milhões de euros de dívidas. O problema é que só entre o final de 2004 e Novembro de 2005, ou seja, sensivelmente no espaço de um ano, só a dívida declarada à Segurança Social aumentou de 2.978 milhões para 3.400 milhões de euros ou seja quase 500 milhões, mais do dobro dos 200 milhões que o Governo prevê recuperar.
Ora, perante esta situação, o que se esperava do Governo, era a tomada de medidas concretas que visassem responder ao problema, designadamente pelo lado da receita alterando o modelo de financiamento, e não, como sempre fazem, procurando cortar nas prestações sociais, descredibilizando o Sistema Público de Segurança Social, no intuito de dar lenha para a fogueira das privatizações e da desresponsabilização do Governo na fundamental tarefa de justiça e solidariedade sociais.
É isto que nós Verdes não aceitamos, é com esta visão que nós não pactuamos e aqui estamos para a denunciar.
Denunciamos e condenamos, a postura do Governo face a esta matéria, ao mesmo tempo que nos demarcamos dessa postura. Uma postura de desistência ou de criação do clima propício à desistência, de construir e acreditar num Portugal de esperança, um país onde seja possível viver em paz, com igualdade e com justiça social.