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28/04/2004
Sobre Descentralização
Declaração Política do Deputado Álvaro Saraiva no debate sobre “Descentralização”
Assembleia da República, 28 de Abril de 2004
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Senhor Presidente, Srs. Deputados,

O Poder Local Democrático é uma das grandes conquistas da Revolução de Abril.

Poderíamos estar aqui a tarde toda a citar as inúmeras razões que fundamentam o que inicialmente disse. Mas provavelmente, a mais importante é a que se prende com a revolução nas infraestruturas verificadas no território.

Desde 1979, ano em que pela primeira vez o País viu aprovada a primeira Lei de Finanças Locais, as Freguesias e os Municípios atingiram níveis de serviço, nunca vistos, nos campos da recolha de resíduos sólidos e líquidos, no abastecimento de água, na cultura, no desporto, na educação pré-escolar e básica e na construção de estradas.

Actualmente, a exigência dos cidadãos é cada vez maior, conscientes e esclarecidos acerca dos seus direitos, enquanto clientes/utilizadores dos serviços autárquicos, aliada a uma descentralização de competências que tem vindo a atribuir sucessivas responsabilidades às Autarquias, obrigando--as a uma multiplicidade de funções, em permanente interacção com os diversos segmentos da população:

Munícipes, empresas e os demais agentes sociais, económicos e culturais.

A transferência de competências para as Autarquias sem a respectiva compensação financeira é uma fraude.

Existe legislação aprovada desde 1999 – concretamente a Lei 159/99 de 14 de Setembro, sobre o quadro de transferências de atribuições e competências para as Autarquias locais, sem que nada ou quase nada tenha sido feito nos anos decorridos, ou seja transfere-se cada vez mais “trabalho” mas a devida compensação financeira fica para as calendas gregas.

Sr. Presidente
Srs. Deputados

A legislação publicada em 2003 – Leis 10/2003 e 11/2003 de 13 de Maio, não foi nada mais do que “um logro” para a aniquilação das regiões administrativas.

Em nosso entender, uma politica séria de descentralização só é verdadeiramente eficaz de concretizar com a instituição de um novo nível de poder administrativo. O modelo de descentralização apresentado, pode transformar-se num perigo para as fragilidades das regiões desfavorecidas.

Constatamos que no litoral urbano criaram-se unidades com alguma sustentabilidade de coerência, no interior criou-se um ambiente de ruptura. A Lei publicada e na qual assenta esta nova organização territorial, é negativa. É um convite ao desmoronamento da organização do território, mais, em nosso entender é uma porta aberta à liquidação do ordenamento do território e um obstáculo real a um desenvolvimento ecologicamente equilibrado.

Esta descentralização assenta em critérios de população e não de necessidades de ordenamento.

Concordamos com o Senhor Presidente da Republica quando aponta 3 princípios para a descentralização:

- o principio da escala, para que os territórios ganhem competitividade;

- o principio da racionalidade de forma para que se perceba, porque é que surge determinada comunidade urbana e que não seja por amizade;

- o principio da competitividade para que os municípios não destruam as organizações existentes.

Sr. Presidente
Srs. Deputados

Deveríamos aprender com a experiência do funcionamento das actuais Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto no que concerne ao seu funcionamento. Pensamos que é um tremendo erro continuar a insistir nos órgãos constituídos a partir dos eleitos das Câmaras Municipais, reafirma-mos que é um tremendo erro continuar a alimentar ilusões e não contribuir para a resolução dos efectivos problemas com que estas importantes áreas se debatem.

Continuamos a insistir que a eleição directa e universal dos órgãos era e é o melhor caminho.

O Governo, o actual e já o anterior também, diz que quer descentralizar, então tem que dizer, preto no branco, no concreto. Mas também é necessário identificar com rigor a forma de descentralizar, as atribuições são diferentes das competências.

A experiência de 1984 com os transportes escolares deve estar sempre presente, com bons resultados em termos de quantidade e qualidade do serviço que passou a ser prestado, mas com graves repercussões financeiras para os Municípios.

O que o Senhor Primeiro-ministro apresentou no XIV Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses foi o mesmo que apresentou há 2 anos.

Dois anos na mesma é muito tempo. Não se sentiu nenhum avanço na descentralização, que em nosso entender é uma forma eficaz de dar resposta mais rápida aos problemas das populações.

Durante este tempo todo o que o Governo fez foi transferir competências indesejáveis para a Administração Central. É o caso das competências dos Governos Civis que foram transferidas para as Autarquias através do Dec.Lei 264/2002 e do 310/2002, que atribui às Câmaras Municipais competências no licenciamento e da fiscalização em áreas “importantíssimas” que vai do guarda-nocturno à venda de lotarias e até ao arrumador de carros…etc.

A isto nós não chamamos descentralização, chamamos alívio para a Administração Central. O que nós queremos ver é de facto uma verdadeira descentralização mas devidamente compensada com os respectivos meios financeiros. Nunca é demais relembrar que 45% do investimento público é feito com 15% da receita, ou seja, isto quer dizer que os Municípios num horizonte de 1 milhão de euros só recebem 150 mil e com estes fazem um investimento de 450 mil euros. A Administração Central por sua vez com 85% de receita só realiza 55% de investimento, apenas mais 10% que os Municípios.

É urgente uma nova Lei de Finanças Locais, que permita de facto aos municípios terem uma politica sustentada para a resolução dos problemas das populações.

É fundamental que o Governo pense que tem que emagrecer a Administração Central e transferir os meios financeiros a afectar aos Municípios.

Este modelo de descentralização leva-nos a concluir que o Governo está a “navegar num lago de águas paradas, no entanto agita as águas para dar a entender que navega a todo o vapor e em mar alto”.

Continuamos a afirmar que a constituição das regiões administrativas e a implementação de um vasto processo de regionalização seriam as condições básicas estruturais para a descentralização e a definição de uma politica global de desenvolvimento de acordo com as potencialidades e condições ecológicas de cada região.

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