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06/11/2003
Sobre Grandes Opções do Plano e Orçamento de Estado para 2004 Encerramento na Generalidade
Intervenção da Deputada Isabel Castro Sobre Grandes Opções do Plano e Orçamento de Estado para 2004 Encerramento na Generalidade
Assembleia da República, 6 de Novembro de 2003
 
 
 
 
 

 

 

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Senhoras, Srs. Membros do Governo, Sras. e Srs. Deputados, 

O orçamento do Estado que vai ser votado merece a nossa total rejeição.

É um orçamento contra o interesse nacional.

É um orçamento indiferente às necessidades das pessoas, sobretudo das mais pobres.

É um orçamento que compromete seriamente o nosso futuro.

Este orçamento é contra o interesse nacional:

Porque precisamente no momento em que isso seria mais decisivo, não investe na qualificação e na formação dos cidadãos portugueses;

não incentiva a inovação das empresas, a modernização da economia, a alteração dos processos produtivos;

um orçamento que não aposta no combate ao desperdício, na redução da nossa factura energética, na diminuição da dependência do país face à cultura do petróleo, nas energias renováveis, na utilização de bio combustíveis e na melhoria da eficiência energética, através do uso de tecnologias mais eficientes;

O orçamento que promove o desmantelamento de serviços públicos e a desresponsabilização do Estado em domínios e funções sociais imprescindíveis para o bem estar dos cidadãos e a preservação dos nossos recursos naturais (omissões na prevenção e no combate à toxicodependência, no apoio e cuidado aos idosos, na educação, em especial no pré escolar, no ensino especial e no superior, no acesso aos cuidados de saúde, nos novos hospitais sem alma em especial em relação aos doentes crónicos, mas também no sistema de transportes, na investigação científica, no ambiente e na conservação da natureza);

Que coloca Portugal e os portugueses cada vez mais distantes do objectivo da convergência europeia .

Este orçamento é indiferente às necessidades das pessoas, em especial das mais pobres:

Que revela indiferença e falta de humanismo face à condição dos cerca de dois milhões de portugueses, atirados para a pobreza e que vivem numa situação de inaceitável exclusão e de apartheid social;

se coloca totalmente à margem da dramática situação dos cerca de meio milhão de mulheres e homens lançados no desemprego sem procurar, com rasgo e modernidade, alternativas e políticas activas para o contrariar, gerando emprego em novas áreas de serviços, de que somos ainda deficitários, concretamente nos domínios dos cuidados sociais e do ambiente;

porque reduz direitos sociais nas prestações do subsídio de desemprego, no rendimento social de inserção, no subsídio de doença, na retribuição em função da desigual capacidade, num atentado que atinge em especial os mais idosos, os doentes, os mais fragilizados da sociedade;

não cria condições essenciais de igualdade de oportunidades e de integração para os cidadãos com deficiência, antes lhes retira benefícios fiscais, e, no caso das crianças, se prepara para as segregar e deixar fora do sistema regular de ensino;

que se demite em absoluto de uma política séria de reinserção social, fazendo com que as prisões não sejam mais do que um espaço de violência, de doença e morte;

que não assegura justiça e equidade e consente a manutenção de uma situação insultuosa para os trabalhadores por conta de outrem em termos de injustiça fiscal;

porque é absolutamente incompetente no combate à criminalidade económica, e perante o agravamento da fuga e da evasão fiscais, insistindo aliás para nosso espanto a Senhora Ministra de Estado e das Finanças em afirmar, algo a despropósito, que o nosso problema nem é de falta de receitas!

Um orçamento Senhores Membros do Governo, Senhores deputados, que compromete seriamente o nosso futuro, porque ignora meios estratégicos de defesa nacional, de vigilância, de prevenção da poluição e fiscalização das nossas águas, de entre os quais, o elementar sistema de vigilância costeiro, VTS, há anos por instalar no Continente e nas regiões autónomas, permitindo-se que as nossas costas, ecossistemas e os recursos marinhos fiquem à mercê da delapidação, da pilhagem e dos poluidores sem escrúpulos;

A situação inaceitável que a catástrofe ecológica do “Prestige” evidenciou numa matéria em que estivemos ao sabor dos ventos, da vontade de Espanha, da fé e dos baldes do Senhor Ministro.

O orçamento que não obstante os incêndios que incendiaram o país, e destruíram 5% do território deles não retira as devidas lições ao não consagra medidas, incentivos, políticas que travem a actual tendência de êxodo e litoralização do país, ao não estimular uma outra ocupação demográfica do território, favorecendo o emprego, a renovação e a vivificação do interior rural, que assegurassem a coesão nacional e o desenvolvimento justo e ecologicamente equilibrado.

O orçamento que despreza o desafio inadiável, no país e no planeta, para a segurança e a vida, o do combate às alterações climáticas.

Que irá obrigar o país e os portugueses a pagar a incompetência até agora manifestada para pôr em prática o Programa Nacional para as Alterações Climáticas, nomeadamente no tocante ao sector dos transportes. Um atavismo inexplicável que como o próprio governo reconheceu poderá custar o desaparecimento e desemprego das empresas nos sectores da nossa economia mais grandemente tributários do consumo de energia e o pesadíssimo custo económico para o país e os contribuintes pela continuada derrapagem nas emissões poluentes e pelo incumprimento dos objectivos de Quioto e dos compromissos assumidos no âmbito da União Europeia.

O combate perdido do desenvolvimento com sustentabilidade, a manter-se este orçamento de desinvestimento nos recursos humanos, mas também nos recursos naturais e patrimoniais e esta continuado abandono das políticas públicas de preservação do ambiente, de defesa da biodiversidade e de conservação da natureza.

O abandono que significará o atraso e um custo decerto muitíssimo mais agravado , até porque já então sem fundos comunitários, para adoptar medidas essenciais: no domínio dos resíduos, da monitorização da qualidade da água e do ar, do planeamento e gestão dos recursos hídricos, designadamente dos rios internacionais, do ordenamento do território, da prevenção de riscos, do combate à desertificação dos solos, da recuperação dos passivos ambientais designadamente os provocados pelas minas abandonadas, no controlo integrado da poluição, na prevenção do ruído, da alteração de modelos de produção e consumo, no abastecimento e tratamento de águas, dos mecanismos de participação dos cidadãos, entre tantos e tantos outros.

Questões que estão hoje na generalidade dos países em vias de ser solucionadas e no centro das políticas públicas, na perspectiva do compromisso de Johanesburgo e da estratégia para o desenvolvimento sustentável, dossier que o Primeiro Ministro chamou a si, mas lamentavelmente ignorada.

O escândalo, só comparável aquele a que se assiste, por todo o país.

Escândalos Senhora Ministra de Estado e das Finanças que nada tem a ver com desenvolvimento sustentável, mas com negócios que aqui avoquei e que tanto choque lhe causou? Escândalos direi, e insisto enquanto escolhas e operações pouco transparentes e pouco criteriosas, lesivas, no imediato ou a prazo, do interesse público.

Operações Senhora Ministra como a da Falagueira?

Operações como a do Citibank.

Mas operações outras mais, como aquelas que estão a permitir, sem racionalidade, sem sensatez, sem equilíbrio e com sacrifício dos valores ambientais, ultrapassar pareceres técnicos e avaliação de impacte ambiental, zonas de protecção especial e compromissos europeus e estão a viabilizar mega projectos turísticos, como os de Almada Douro e Verde Lago, que a prazo irão pela ilimitada pressão destruir definitivamente o litoral do sotavento algarvio e o próprio Parque Natural da Ria Formosa.

Projectos outros que se desenham e com opacidade, teimam ceder à pressão de grupos imobiliários e tentar desanexar importantes áreas protegidas, no caso do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina para de novo tentar o irracional triunfo do betão e de negócios pouco claros.

Os mesmos afinal que permitem pelo país o saque descontrolado do chamado petróleo branco, e com impunidade consentem no negócio das areais.

A cedência que explica o regresso, dos areeiros ao rio Douro, em condições que contrariam frontalmente todas as conclusões e recomendações do Inquérito Parlamentar aquando da da tragédia de Entre-os-Rios, num regresso que não é estranho ao reconhecido financiamento sempre assumido e feito as autarquias ribeirinhas.

Os negócios, por fim, inquietantes, que como um polvo, se tentam insinuar, no negócio do século, a tentativa de privatização do sector da água, que pode definitivamente por em causa o acesso a um bem suporte de vida e um direito fundamental.

Sr Presidente,

Termino, como em síntese, comecei.

Este Orçamento do Estado é, particularmente neste momento, um orçamento contra o interesse nacional.

É um orçamento que não responde às necessidades das pessoas, em especial as mais pobres.

É um orçamento que compromete seriamente o futuro!

Que merece por isso o nosso repúdio, que deveria ser chumbado.

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