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13/10/2005
Sobre Lei da Nacionalidade
Intervenção proferida pelo Deputado José Luís Ferreira Apresentação do projecto de lei de “Os Verdes” que altera a Lei da Nacionalidade
 

 
 
 
 
 
 
 
Senhor Presidente, Sras. e Srs. Deputados,

Nos últimos anos, sobretudo na Europa, o debate em torno do fenómeno migratório tem vindo a acentuar a necessidade de repensar e ajustar as leis da nacionalidade a uma nova realidade que já há algum tempo deixou de ser meramente conjuntural.

Com efeito, a realidade da imigração, passou nos últimos anos a fazer parte integrante do nosso quotidiano e a marcar, de forma politicamente relevante, a nossa realidade, presente e futura.

E é exactamente neste contexto de fluxos migratórios, que tem percorrido toda a Europa e também o nosso país, que a questão da lei da nacionalidade tem sido chamada com regularidade para a agenda política.

Sobre nós paira ainda uma responsabilidade acrescida no que diz respeito à necessidade de criar condições que permitam, aos que cá se encontram, aquilo que para os portugueses, no estrangeiro, reivindicamos, um estatuto de cidadania.

Responsabilidades acrescidas que derivam da dupla condição de país, a um tempo de emigrantes e de migrados.

Assim, por um lado, a partida, de alguns portugueses que continuam ainda a procurar noutros países e noutros continentes, aquilo que o seu País não lhes garante, de forma satisfatória.

Por outro lado, a crescente condição que assumimos de país de destino de imigrantes, não só de pessoas que no passado pertenceram, no tempo colonial, a um só pais, pessoas que partilham a nossa língua e que comungam a mesma herança histórica, política e cultural, mas também de novas comunidades vindas da Europa central e de leste que aqui se têm, igualmente, procurado fixar.

 

 

É neste quadro que entendemos a oportunidade política deste debate e desta iniciativa política de “Os Verdes”, que procura, alterando a lei da nacionalidade, criar condições que favoreçam a plena integração destes cidadãos imigrantes, pondo fim a uma situação injusta e inaceitável que gera marginalização, discriminação e exclusão social.

Um projecto que tem como destinatários, sobretudo muitos daqueles que são considerados, pelo estatuto jurídico que lhes é imposto, estrangeiros, apesar dos seus olhos nunca terem visto, ao longo da sua vida, outro país que não o nosso.

Uma alteração à lei da nacionalidade, à semelhança das reformas que diversos países europeus têm levado a cabo, face à nova geografia que caracteriza as sociedades contemporâneas, que favoreça o direito à cidadania de imigrantes e de emigrados.

Uma mudança que pretende introduzir um conteúdo actualista, à lei em vigor desde 1981 e definir um novo critério para atribuição da nacionalidade, capaz de assegurar o exercício de direitos fundamentais, quer se trate do direito à nacionalidade, e do direito à não discriminação, quer da prevenção do racismo e da xenofobia.

Situações que a actual lei da nacionalidade não assegura, bem pelo contrário.

A actual lei tem proporcionado profundas injustiças, contribuindo para situações de incapacidade de integração adequada de imigrantes na sociedade portuguesa, e consequentemente para situações de exclusão social.

Desde logo, a prevalência do critério do jus sanguinis sobre o critério do jus soli tem permitido que muitos jovens, filhos de imigrantes em Portugal, e já nascidos e criados no nosso país, sejam considerados estrangeiros, quando não conhecem outra sociedade que não a nossa, quando é aqui que devem estar plenamente integrados.

Um absurdo legal que em Portugal é particularmente chocante, atendendo à nossa dupla condição de país de emigrantes, mas cada vez mais de país de imigrados, e se reflecte dramaticamente no quotidiano dos cidadãos imigrantes e, em particular, das pessoas já nascidas em Portugal, remetidos à condição de quase apátridas, com todas as consequências humanas, sociais e culturais daí decorrentes, cuja gravidade não pode continuar a ser subestimada.

A nosso ver, não faz sentido que, designadamente, a esta segunda geração, seja recusada a condição de cidadãos portugueses na sua plenitude.

Razões estas bastantes que justificam, em nossa opinião, a prioridade em mudar o regime jurídico da atribuição da nacionalidade. Razões a que acresce a nossa tradição humanista, o respeito pelos direitos humanos e também a responsabilidade de prevenir fenómenos de exclusão, de marginalização e de injustiça.

É, pois, a própria lei da nacionalidade que está a funcionar como um obstáculo ao justo reconhecimento de cidadãos que são plenamente portugueses e que, dessa forma, lhes retira direitos e contribui para uma óptica discriminatória e marginalizadora dessas pessoas.

Para além disso, a lei da nacionalidade comporta critérios que não fazem qualquer sentido e são profundamente subjectivos, como a necessidade de comprovação de meios de subsistência suficientes para a aquisição da nacionalidade por naturalização, critério que não está claramente definido e vem criar uma discriminação em função da condição económica dos indivíduos.

Outras situações de injustiça decorrentes da actual lei da nacionalidade poderiam ser apontadas, como é o caso da omissão relativamente às situações de união de facto, por exemplo.

Face a esta realidade, “Os Verdes” pretendem alterar esta lei injusta e adequá-la aos tempos que vivemos, no essencial, de forma a:

• Atribuir automaticamente a nacionalidade portuguesa a filhos de cidadãos estrangeiros que se encontrem em Portugal, desde que não de modo ocasional.

• Eliminar dos requisitos obrigatórios para aquisição de nacionalidade portuguesa por naturalização, o critério da capacidade de subsistência.

• Eliminar o período mínimo de vigência do casamento para efeitos de aquisição de nacionalidade.

• Equiparar a união de facto ao casamento, para efeitos de aquisição de nacionalidade, fixando a obrigatoriedade de um período mínimo de dois anos de vigência daquela relação familiar, prevenindo assim eventuais fraudes.

 


Senhor Presidente, Sras. e Srs. Deputadas,

São estas, em suma, as linhas orientadoras do nosso projecto, cuja matriz humanista respeita a nossa história, a interpreta e a faz evoluir num sentido que assegure o respeito pelos direitos humanos, os valores da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.

Um projecto, uma iniciativa legislativa, que tem como destinatários todos aqueles que, por origem ou livre expressão de vontade, pretendem e estão em condições de partilhar o sentido de pertença à comunidade de cidadãos portugueses, que é o Estado democrático.

Aqueles cidadãos que se têm por portugueses e aqueles, mulheres e homens, a quem o direito português entende dever reconhecer essa qualidade.

Trata-se assim, nos termos propostos, de assegurar bem mais do que a consagração do direito a adquirir a nacionalidade, de atribuir a qualidade de português, de reconhecer e de assegurar o direito de cidadania portuguesa, não mais condicionado pela herança de sangue, a pessoas cujo nascimento, ligação efectiva ao nosso país e vontade expressa, assim o justifique.

“Os Verdes” pretendem assim, tal como outros partidos nesta câmara, contribuir para uma nova abordagem da questão da nacionalidade e influenciar a evolução do actual regime jurídico, de forma a moldar uma solução estável que melhor corresponda à corporização de um direito constitucionalmente consagrado, o direito à cidadania portuguesa.

Uma proposta que irá contribuir certamente para tornar Portugal um país mais coeso, mais forte, mais identificado com as suas próprias raízes e mais enriquecido pela diversidade.


Ver tambêm:

Projecto de Lei Nº. 31/X Projecto de Lei- Altera a Lei da Nacionalidade (Lei N.º 37/81, De 3 De Outubro, com as Alterações Introduzidas pela Lei N.º 25/94, de 19 de Agosto)

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