Pesquisa avançada
 
 
Intervenções na AR
Partilhar

|

Imprimir página
23/02/2006
sobre o encerramento de escolas do 1º Ciclo
Declaração política do Deputado Francisco Madeira Lopes, sobre o encerramento de escolas do 1º ciclo
23 de Fevereiro de 2006
 
 

 

 
 
 
 
 
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
 
A tarefa de edificar, cuidar e desenvolver o edifício da educação pública de qualidade e da escola democrática, universal e inclusiva é das mais nobres tarefas que podem competir a qualquer Governo Constitucional do nosso Estado de Direito Democrático e Social.

A reestruturação da rede escolar nacional, é, desde há longa data, tema recorrente de debates, propostas e alvo de preocupações e considerações diversas por parte de órgãos com responsabilidades políticas, nacionais e locais, e também por parte das escolas, pedagogos e da comunidade educativa em geral.

Não é possível pensar em erradicar o analfabetismo e a iliteracia de Portugal, ou em inverter os preocupantes e vergonhosos números do abandono e insucesso escolares sem atacar o problema na sua raiz e este passa, necessariamente, o que tem de ser assumido sem tibiezas, pelas péssimas condições, em que se encontram, em muitos casos, as escolas de 1º ciclo no nosso país.

Um parque escolar altamente envelhecido e degradado, sem equipamentos nem materiais, com problemas de segurança, sem aquecimento, com instalações sanitárias deficientes, com falta de professores, professores de apoio, psicólogos, assistentes sociais, auxiliares da função educativa, determinam logo à partida a existência de exclusão e a reprodução de desigualdades desde este nível de ensino que se prolongarão e agravarão nos níveis subsequentes.

Esta é a realidade escolar que milhares de crianças conheceram e conhecem hoje em dia em Portugal, e com a qual pais, encarregados de educação, famílias e profissionais de educação, docentes e não docentes, se debatem todos os dias numa luta desigual contra uma realidade adversa em que os baixos níveis de sucesso escolar andam de mãos dadas com a debilidade económica, a desestruturação familiar, com a pobreza.

Esta é uma realidade sobejamente conhecida, que se arrasta no tempo, mas contra a qual os sucessivos Governos pouco ou nada têm feito.

Torna-se por isso fundamental e inadiável, há muitos anos aliás que se justificaria, a adopção de um plano de investimentos sério e coerente, com calendário de objectivos claramente traçado, a realizar nas escolas de 1º ciclo, visando dotar todos estes equipamentos em funcionamento com as condições necessárias a promover um verdadeira combate ao insucesso escolar e à exclusão social.

E esta só se faz com escolas capazmente equipadas, em meios e em profissionais, mas também e harmoniosamente integradas e interligadas no meio sócio-económico donde provêm os alunos, promovendo uma estreita cooperação e participação das famílias e de toda a comunidade envolvente no processo de aprendizagem.

Não vai assim tão longe o tempo em que, sob a capa de Reordenamento da rede escolar, o Ministro da Educação do então Governo de direita, David Justino, assumiu o objectivo de encerrar 200 escolas durante o ano lectivo de 2003/2004.

Actualmente, a Ministra da Educação deste Governo dito Socialista, que de verdadeiramente Socialista cada vez tem menos, ao abrigo, mais uma vez, “de um programa de reorganização da rede e de melhoria das condições de ensino”, anunciou em Outubro do ano passado, que encerrariam 512 escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico em todos o país.

Cinco meses depois, ficámos a saber, por declarações da Sra. Ministra que, afinal, as 512 escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico a encerrar no país nonuplicaram, isto é, transformaram-se subitamente em 4.500 escolas de 1º ciclo que se estima encerrar gradualmente, apesar de se não saber com que horizonte temporal. Ou seja, o Ministério prevê encerrar cerca de 60% do total de 7.569 escolas deste nível de ensino existentes no nosso país.

Mais afirmou a Sra. Ministra que estas 4.500 escolas estão identificadas há dez anos.

Já hoje de manhã, a Sra. Ministra terá declarado que prevêem encerrar 1.500 escolas, voltando a baralhar os números num jogo de avanços e recuos que em nada contribuem para o esclarecimento das verdadeiras intenções do governo nesta matéria.

A forma como foi anunciada esta intenção, que pode vir a ter resultados desastrosos, tomada em secretismo e sem qualquer diálogo prévio comas populações ou com os docentes e suas organizações representativas, bem como os critérios administrativos cegos que à mesma presidem, de encerrar todas as escolas com menos de 20 alunos e com taxas de aproveitamento inferiores à média nacional, revela que por detrás desta medida está, antes de mais nada, e apesar das supostas e alegadas boas intenções de melhorar as condições de ensino daqueles alunos, razões economicistas de poupança de dinheiro a curto prazo, sem ter em atenção que essa poupança poderá extremamente dispendiosa ao desenvolvimento integrado, equilibrado, harmonioso e sustentável do país no futuro próximo.

Para o Partido Ecologista Os Verdes não é possível desenquadrar esta situação do ordenamento do território e das opções que a esse nível se fazem.

É obrigatório lembrar que, se existem escolas abandonadas e isoladas e com más condições de ensino e aprendizagem no nosso país, a funcionar com poucos alunos, é porque se situam em zonas abandonadas, isoladas e esquecidas pelo poder, onde a pobreza, a emigração, a fuga para o litoral e a desertificação alastram como um cancro e para as quais não tem havido políticas de ordenamento de território e de correcção de assimetrias regionais capazes de as travar, porque tem faltado vontade política para o fazer.

Face a isto, a solução não é, não pode ser o constante fecho de serviços fundamentais para as populações, como os serviços de urgência nos centros de saúde ou as escolas de 1º ciclo, que mais não servem para confirmar o esquecimento a que são votadas essas regiões desfavorecidas, condenando-as definitivamente à morte. É quase certo que onde fecha hoje uma escola, nunca mais voltará a mesma a abrir, ficando o seu espaço à mercê da ruína ou à espera de um projecto de especulação imobiliária ou de turismo de aldeia. É preciso uma outra política e uma outra visão.

A escola não pode ser vista separada do meio e contexto geográfico, social e económico em que se insere, nem o encerramento de escolas pode ser visto separado de uma política correcta de ordenamento do território.

O facto da luta das populações e justas reivindicações de muitas autarquias, lutando contra a desertificação e despovoamento dos seus territórios, já ter conseguido, nalguns casos retrocessos, só vem reforçar a ideia de que esta medida foi gizada a regra e esquadro sem consideração pela realidade concreta de cada escola, de cada freguesia, de cada município, de cada região.

Perante esta situação, e para que não venham a ser vítimas os alunos, famílias e professores dessas escolas, impõe-se, e o Partido Ecologista Os Verdes exige, que o Governo faça uma paragem em todo este processo, para ouvir todos os interessados, designadamente os representantes dos pais e encarregados de educação, autarcas e docentes, a fim de evitar o que pode vir a ser um tremendo erro de consequências irreparáveis.

Voltar