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06/04/2004 |
Sobre o estado da educação em Portugal |
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Declaração Política da Deputada Isabel Castro Sobre o estado da educação em Portugal
Assembleia da República, 6 de Abril de 2004
Senhor Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
O abandono escolar é uma tragédia nacional!
As palavras são do Presidente da República, ontem, segundo dia da Presidência Aberta que entendeu dedicar à Educação.
Uma decisão que se deve como o próprio reconhece, retomando as suas palavras de 1998, ao facto de considerar: “ não haver tarefa mais urgente nos tempos actuais do que a educação “.
Uma semana cujo “discurso de abertura” foi deliberadamente proferido numa escola pública. A escolha que o próprio Presidente da Republica se encarregou de explicar, ao declarar ser sua intenção e cito:
“Porque quero valorizar o ensino público, um ensino que deve distinguir-se por níveis elevados de qualidade, um ensino que não sirva apenas para acolher os mais pobres ou os mais desfavorecidos”
Palavras plenas de significado político.
Em nosso entendimento, palavras de extrema oportunidade, e que pesam brutalmente sobre os partidos da maioria, pelas decisões que se estão a preparar para tomar, com a precipitada aprovação de uma Lei de Bases da Educação. Lei esta que irá institucionalizar o descomprometimento do Estado em relação à educação, num claro confronto com o disposto no nosso texto fundamental.
E consagrar na desresponsabilização do Estado em relação à escola pública, abrindo em pé de igualdade a porta ao financiamento com o dinheiro dos contribuintes do sistema privado, o abandono daquela que deveria ser a preocupação primeira do país, a qual como afirmou o Presidente da Republica: “não poder ser mera afirmação teórica”.
Mas palavras do Presidente da Republica num discurso que remete, ainda, de modo explícito para o facto de
“Portugal não tem alunos a mais, não tem diplomados a mais. Portugal tem, bem pelo contrário, índices baixíssimos de qualificação escolar”.
Palavras que evidenciam uma realidade que tem sido desprezada e põe em causa a tese mistificadora que o governo e a direita tentam, de modo sibilino, insinuar junto da opinião pública, sob pretexto de que a questão do acesso e da democratização do ensino seriam coisas ultrapassadas, assim procurando relativizar a gravidade do verdadeiro significado e amplitude do abandono por este governo do combate pela educação e a qualificação dos portugueses, e do seu desinvestimento nesta área.
Uma falácia contrariada pelo Presidente da República que como consciência crítica não deixou de alertar de aludir e cito ao facto de:
“Que Portugal não investe de mais na educação. Bem pelo contrário, necessita de investir nesta área (e muito) não apenas durante um, dois ou três anos, mas de forma continuada e persistente”.
Palavras que pesam pelo seu significado e que não podem deixar de ser politicamente interpretadas, reflectindo as análises críticas que em muitos sectores tem surgido, designadamente pelo Conselho Económico e Social, pelo brutal desinvestimento e levianos cortes do governo da maioria de direita, na educação, no pré-escolar, no ensino especial, no superior, a par das medidas de combate ao insucesso e ao abandono.
Um abandono num domínio nevrálgico em que como o Presidente da Republica lembrou, Portugal, continuar a ser, a par com da Grécia, o país da União Europeia com menor despesa total por aluno.
Uma opção particularmente grave face ao nosso défice estrutural de qualificação e de formação, muito em especial na Europa alargada e com repercussões desastrosas tendo presente o fosso que ainda nos separa de outros países e nos colocanuma posição extraordinariamente vulnerável em termos de competitividade, de desenvolvimento e de futuro no nosso país.
Palavras num discurso de abertura que remete, ainda, de modo explicito, actual e, especialmente incisivo para a transformação que a maioria e o governo estão a operar na escola, esse “bem comum” como lhe chamou o Presidente da República, que não pode segundo as suas próprias palavras ser transformado, num mero “serviço ou mercadoria”.
Afinal aquilo que precisamente neste momento, com a aprovação, neste Parlamento, da Lei de Bases da Educação vai acontecer. Uma proposta que a esmagadora maioria dos participantes nos participados debates públicos rejeitou, ainda assim que os partidos da maioria se preparam para aprovar.
Uma lei contrária às necessidade de desenvolvimento do país, inspirada numa filosofia neo-liberal, a mesma afinal que justifica os rankings, enquanto processo de avaliação descontextualizado, que em vez de instrumento interno de diagnóstico para a melhoria da qualidade do ensino, não passam afinal de simples indicador, para melhor favorecer a nova bolsa do mercado.
Uma opção inaceitável, que se opõe à democratização da escola e favorece a “ formação de elites” que o Presidente se recusa aceitar, defendo pelo contrário a melhoria da qualificação escolar e profissional.
Ainda na alusão: “Que Portugal não investe de mais na educação. Bem pelo contrário, necessita de investir nesta área (e muito) não apenas durante um, dois ou três anos, mas de forma continuada e persistente”.
Uma referência que remete implicitamente para o enorme corte que, de modo leviano, tem vindo a ser feito pelo governo da maioria de direita na área da educação, e de especial gravidade tendo em conta o facto de Portugal, continuar a ser, a par com a Grécia, o país da União Europeia com menor despesa total por aluno.
Cortes num sector no qual não basta pois, como recorda o Presidente da República, uma desejável eficácia na gestão de meios e de recursos. Antes é preciso mais investimento. Mais investimento, não apenas durante um, dois, três anos mas de forma continuada e persistente.
Afirmações que remetem para a conclusão do Presidente da Republica de inexcedível clareza no seu discurso, ao afirmar e cito: “ que seria um erro histórico dar livre curso às ideologias do mercado que tendem a diminuir o compromisso do Estado com uma escola pública de qualidade para todos “.
Palavras implacáveis, as do Presidente da Republica, na recusa da indiferença em relação ao insucesso e ao abandono escolar, que não podem ser aceites como situações “normais” e socialmente toleráveis.
Palavras que pesam sobre a gravidade de uma situação que a pratica governativa, do Ministério da Segurança Social e do Trabalho à Educação, se têm aliás violentamente encarregado de acentuar.
Senhor Presidente
Sras. E Srs. Deputados,
Numa semana política cujo inicio ficou marcado nas escolas pelo caos provocado pela entrada em vigor do novo sistema de selecção e de colocação de professores, cujos erros grosseiros, não só põem em causa o sistema, como arrasam pela incompetência a actual equipa da Educação, a iniciativa do Presidente da Republica não pode deixar de ser politicamente compreendida na sua extrema importância e actualidade política.
Uma iniciativa lançada e que alerta, desde logo, na referência feita a propósito dos projectos desenvolvidos nas periferias urbanas de Lisboa e do Porto, para o trabalho desenvolvido pela escola, para a responsabilidade profissional, para o papel insubstituível dos professores enquanto pilares do sistema, criticando aqueles que tem um discurso dúbio sobre a sua actividade.
Uma alusão com destinatários directos, o governo, cujo discurso e a prática tem sido marcados pela sistemática hostilização pelos profissionais da educação, pelo desrespeito pelos professores, pela desvalorização da sua função social, quando não mesmo pelo insinuação caluniosa, em que a equipa se tem revelado imbatível!
Mas uma iniciativa que permite, ainda, dar visibilidade a uma actividade dentro da escola que, como por último, sublinhou implica e apela à participação e à democratização na escola, na recusa explícita de tendências autoritaristas ou saudosistas, ainda tão presentes na sociedade portuguesa.
Uma participação, como afirma o Presidente da Republica, que não impede a emergência de formas de autoridade, de tolerância, de respeito que são como enfatizou, condição necessária na relação pedagógica.
Uma reflexão também ela que a maioria deveria reter e que contrasta vivamente, também aqui, com as opções do governo da maioria de direita e constantes da sua Proposta de Lei apostada em pôr fim à gestão democrática e participada nas escolas e, pronta, também neste domínio, para operar uma ruptura com o património moldado a partir do 25 de Abril dentro do sistema educativo, abrindo as portas a um poder unipessoal, estranho à comunidade escolar e que favoreça inspirado num visão economicista, a subalternização do pedagógico com manifesto prejuízo para o interesse dos nossos jovens alunos.