|
08/05/2002 |
Sobre o Nuclear |
|
Declaração Política da Deputada Isabel Castro sobre o Nuclear
Assembleia da República, 8 de Maio de 2002
Sr. Presidente, Sras. e Srs Deputados,
O nuclear é uma ameaça permanente à paz, ao equilíbrio ecológico, à segurança, à vida no planeta.
O nuclear representa um perigo para a Humanidade.
De cuja dramática herança de Hiroshima a Chernobyl, passando por Vandellós (Espanha), Laguna Verde (México), Koslodouy (Bulgária), Tree Miles Island (EUA) ou Tokaimura (Japão) ninguém se pode esquecer ou ignorar.
O nuclear é a ameaça latente nas centrais nucleares e no funcionamento dos seus reactores.
O nuclear é a ameaça constante em cada transporte de cargas radioactivas e na possibilidade de acidente ou roubo que lhe é inerente.
O nuclear é, ainda e sempre, a ameaça perpétua da sua herança mortífera: os resíduos radioactivos.
Os resíduos cuja perigosidade é tão grande que basta um simples grama para contaminar toda a cadeia alimentar, e pôr em risco a saúde pública, o equilíbrio ambiental.
Os resíduos cuja radioactividade prevalece durante centenas e centenas de anos, como eminente e irreversível risco com o qual a indústria, não sabe, em segurança, lidar!
É pois Sr. Presidente Sras. e Srs. Deputados
Contra o esquecimento, consciente dos riscos que o nuclear envolve, tendo presente a recusa que o nosso país fez, e bem da opção nuclear, lembrando as sucessivas tomadas de posição desta Câmara, designadamente por iniciativa dos Verdes,
Contra os ensaios nucleares da França no Oceano Pacífico.
De condenação dos testes realizados pela India e da possibilidade de uma nova escalada belicista.
De viva oposição e cito: "a qualquer novo projecto de instalação de um cemitério nuclear junto à fronteira portuguesa" bem como "de empenhamento activo do Governo Português junto do Estado Espanhol para exigir informação e abandono definitivo destes projectos".
Que Os Verdes entendem, Sr. Presidente Sras., e Srs. Deputados ser este o momento oportuno para alertar, mas também para exigir do novo Executivo clareza na informação designadamente ao Parlamento. Clareza na recusa do nuclear.
O nuclear, opção que de modo preocupante foi pela mão de uma Comissária Europeia para a Energia Loyola de Palacio a propósito dos compromissos de Quioto, trazida para a agenda política.
Uma clareza que se exige face a uma opção energética, que veio introduzir uma ameaça de novo tipo à nossa segurança colectiva.
Que veio impor aos Povos, aos Governos, aos Estados, uma nova ética de responsabilidade.
O nuclear que veio questionar a nossa responsabilidade em relação às gerações futuras.
O nuclear, que veio colocar de forma imperativa o direito e o dever de cada cidadão a ser informado sobre questões que não podem escapar ao seu poder fiscalizador.
Uma responsabilidade, uma ética, particularmente exigentes no tempo em que vivemos, em que a incerteza a instabilidade, a guerra instalada em muitas regiões do planeta, coloca com especial ênfase a vulnerabilidade dos sistemas de energia instalados.
É pois essa responsabilidade, essa ética, esse direito de informar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados
Que nos faz hoje protestar, não como há dez anos contra a possibilidade dos nossos mares se transformarem numa lixeira nuclear, como a Agência da Energia Nuclear silenciosamente pretendia, no Oceano Atlântico junto à Região Autónoma dos Açores.
Esse foi um protesto bem sucedido pela pressão da comunidade internacional, que na Convenção de Londres interditou tal possibilidade.
Mas protestar hoje contra a doutrina actualmente instalada na Administração Norte Americana em relação ao nuclear, e concretamente quanto ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares cujo abandono não pode deixar de constituir uma ameaça à paz e uma porta aberta a uma nova escalada armamentista.
A responsabilidade, a ética, o direito de informar os portugueses que nos faz considerar ser legítimo questionar, em nome de quê, para interesse de quem.
Continuam os sucessivos Governos a permitir que o nosso país permaneça nas rotas do nuclear?
Em nome de quê se continua a consentir, apesar dos tremendos riscos cada vez maiores que tal autorização significa, que as nossas águas e a nossa ZEE sejam, no Continente e nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, cruzadas regularmente por cargas radioactivas designadamente de plutónio.
Uma responsabilidade, uma ética, um direito à informação que nos levam a considerar ser legítimo questionar até quando, como, em nome de quê.
Continuam submarinos nucleares a entrar, acostar e permanecer livremente no coração da Área Metropolitana de Lisboa, e no Estuário do Tejo, sem que os cidadãos portugueses se tenham de algum modo podido pronunciar sobre o inaceitável risco a que são expostos.
Uma responsabilidade. Uma ética. Um direito. Á informação dos cidadãos que são, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Que exigem, 16 anos depois da catástrofe ecológica que atingiu Chernobyl e da lição nela contida.
A lição de que a poluição e muito menos o nuclear não conhecem fronteiras.
Que questionemos, que legitimidade tem um Estado (no caso o espanhol) de impor a outro, o que este – Portugal – recusou.
Que exigem também forçosamente que não nos mantenhamos alheados do que se passa no espaço Ibérico e Peninsular de que geograficamente fazemos parte.
Que impõem que não continuemos a ser meros, e mesmo assim maus observadores do que se passa na vizinha Espanha alheios à defesa dos nossos interesses. Indiferente aos desenvolvimentos dos seus programas, nomeadamente no campo nuclear.
Os ventos que da vizinha Espanha sopram, (quer se fale de recursos hídricos quer do nuclear) de há muito exigem atenção e responsabilidade no acompanhamento destes dossiers e aconselham á adopção de uma atitude preventiva.
Desde logo no alerta para a localização das centrais nucleares espanholas, seja junto aos nossos rios internacionais como o Tejo, seja em Almaraz pela proximidade das nossas fronteiras.
Fronteiras perto das quais com Fundos Europeus, por coincidência, é claro se construiu um gigantesco complexo de enriquecimento de urânio, junto à extracção deste terrível minério em Saelices del Chico.
Fronteiras para as quais pairou já e continua a pairar ainda que de modo sigiloso, a ameaça de uma lixeira nuclear projectada pela UE neste caso com a instalação de um cemitério nuclear, para resolver o problema das centrais nucleares europeias cuja capacidade de armazenamento está prestes a esgotar.
Um cemitério cuja construção a não ser impedida significaria, se não a condenação à morte, pelo menos a ameaça permanente de contaminação de um rio - o rio Douro e de toda a Bacia e imensa região e património envolventes.
Razões de sobra, na opinião dos Verdes, a reclamar um controlo que não existe. Soluções legislativas que se não tomam. Medidas organizativas que se não vêem. Meios humanos, técnicos e financeiros que dêem suporte a um efectivo Gabinete de Protecção e Segurança Nuclear (actualmente extinto e com competências dispersas) estrutura capaz de centralizar todas as questões de segurança nuclear que se colocam nos nossos oceanos, nossos portos, nas nossas fronteiras.
Uma visão estratégica que de todo continua a faltar para lidar com o nuclear e garantir sem responsabilidades difusas a resolução, mas sobretudo a prevenção de problemas de extrema complexidade que mexem com o nosso direito à vida, ao equilíbrio ecológico e à paz.
Uma avaliação e um controle dos efeitos da poluição transfronteiriça, da segurança nuclear e dos desenvolvimentos do Programa Nuclear Espanhol não podem ser, para Portugal, meras questões técnicas, meras rotinas passíveis de ser descuradas.
Não são tão pouco questões secundárias para ficarem à mercê de diplomacias de circunstância.
São questões eminentemente políticas, que exigem um envolvimento e uma responsabilidade política ao mais alto nível, e o acompanhamento directo do Parlamento Português.
Já que são questões com consequências ambientais, sociais e económicas gravíssimas, que se reflectem no presente e condicionam o futuro.
Em suma Sr. Presidente
Srs. Deputados
O nuclear que exige que o Executivo preste contas ao Parlamento, preste contas ás populações locais, preste contas a todos os portugueses.
No fundo há que garantir que tendo Portugal recusado para si a opção nuclear se não veja hoje obrigado a aceitar as opções de outros, opções que comprometem o nosso futuro.