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05/04/2012 |
Sobre o reforço da estabilização financeira |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Proposta de lei n.º 51/XII (1.ª) — Altera a Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2012, aprovada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, no âmbito da iniciativa de reforço da estabilidade financeira - Retificativo e subsídios (DAR-I-93/1ª)
- Assembleia da República, 5 de Abril de 2012 –
1ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, vai desculpar-me a franqueza, mas o que acabou de dizer é de um absoluto descaramento. É um escândalo aquilo que o Governo está, neste momento, a afirmar.
Sr. Ministro, o Governo não tem legitimidade para fazer de todos nós e dos portugueses, em geral, uns tolos, porque nós não somos tolos!
Julgo que estou aqui a falar em nome de todos os portugueses. Os portugueses não são tolos para acreditarem em todas as histórias da carochinha que o Governo entenda contar.
Sr. Ministro, as televisões, ontem, prestaram um inegável serviço público ao País, porque relembraram, através da fala do Sr. Ministro, aquilo que disse em outubro do ano passado. E o Sr. Ministro — azar dos azares —, no ano passado, deu datas e disse que os subsídios de Natal e de férias eram para cortar em 2012 e 2013.
Ponto final, Sr. Ministro!
Depois — de facto, esta brincadeira com as palavras tem que se lhe diga —, houve uma alteração na conversa do Governo, que deixou de falar em 2013 e passou a falar no final do Programa de Ajustamento, o que já trazia «água no bico». Agora, vem o Sr. Primeiro-Ministro, com aquele desplante todo, ontem, como nada se tivesse passado, dizer assim: «Em 2014 acaba o Programa de Ajustamento, então vamos repor em 2015». E diz mais — coisa que o Governo nunca tinha assumido: «vamos repor gradualmente», aos poucochinhos.
O que é que isto quer dizer, Sr. Ministro? O que é isto? É um absoluto escândalo para o País, sem palavras para qualificar. Mas não pode ser, Sr. Ministro! Desculpe, mas a palavra dada neste País tem de valer alguma coisa. Os senhores não podem afirmar uma coisa ontem e, depois, no futuro, dizerem, ainda por cima, que não disseram! Então assumam-se e digam assim: «Não, nós dissemos, mentimos, aldrabámos». Peço desculpa pela expressão, mas isto tem de ser dito, porque é o que os senhores estão a fazer! Que isto custa a ouvir, custa, mas custa mais aos portugueses sentir! Não pode ser!
O Sr. Ministro tem, aqui, de esclarecer aquilo que disse em outubro, referindo 2013, e porque é que agora veio repetir o que o Sr. Primeiro-Ministro disse ontem, que eu, confesso, que quando ouvi pela primeira vez, até pensei que tinha sido algum lapso em relação às datas.
Mas não, era verdade! E Sr. Ministro das Finanças vem hoje repetir. Não pode ser! Não pode ser! Deixo aqui este grito de alerta.
Sr. Ministro, nós não temos culpa. Nós é que não temos mesmo culpa de que o Governo, agora, ande a «patinar» nas consequências das suas políticas!
Quem mais do que nós tinha alertado para isso? De resto, este Orçamento retificativo é bem prova disso. O Governo anda completamente a «patinar». Teve de rever todo o cenário macroeconómico, com menos exportações, com menos receitas fiscais, com mais recessão e mais desemprego. Para onde caminhamos, Sr. Ministro?
2ª Intervenção
Sr.ª Presidente, Sr. Ministro das Finanças, não se trata aqui da compatibilidade entre aquilo que o Sr. Ministro diz hoje e aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro disse ontem, porque, em relação a isso, está tudo bem combinadinho, «está tudo nos trinques», está tudo certo, Sr. Ministro. Trata-se, sim, da compatibilidade entre aquilo que o Governo diz hoje, pela boca do Sr. Ministro e pela boca do Sr. Primeiro-Ministro, e aquilo que dizia há pouquíssimo tempo, designadamente no final do ano passado.
Sr. Ministro, aquilo que foi assumido perante os portugueses, com o nosso voto contra, e que continuamos, hoje, a considerar um roubo profundo aos portugueses, é que os subsídios de férias e de Natal iriam ser cortados nos anos de 2012 e de 2013, ou seja, por dois anos.
Curiosamente, para este Governo, um mais um deixou de ser dois, porque um mais um passou a ser três! Não pode ser, Sr. Ministro!
Não pode ser! Nós não somos tolos! Reafirmo esta questão. E o Sr. Ministro vai ter de falar em datas concretas, ou seja, vai ter de justificar aquilo que disse em Outubro do ano passado. É que o Sr. Ministro não estava a delirar em Outubro do ano passado! Ou estava?!
E há outra coisa que o Sr. Ministro não referiu: o que é que significa esta coisa da reposição gradual? É capaz de nos explicar, por favor, o que é que isto significa?
3ª Intervenção
Sr.ª Presidente, vou tentar ser muito breve.
Quero apenas dizer ao Sr. Ministro das Finanças o seguinte: nem devagarinho, e muito devagarinho, o Sr. Ministro conseguiu convencer alguém, porque, de facto, os factos são indesmentíveis, Sr. Ministro.
Posso até, julgo eu, não citando nomes, cometer a inconfidência de que já encontrei vários Deputados da maioria lá fora, nos corredores, dando total razão àquilo que Os Verdes já denunciaram aqui, na Assembleia da República.
Por isso, vou virar-me para os Deputados da maioria para lhes dizer o seguinte: vem aí a Páscoa, Srs. Deputados, vamos aproveitar este período para refletir um bocadinho. Sugiro aos Srs. Deputados que não entrem, por favor, neste engano brutal aos portugueses, não se juntem ao Governo neste engano brutal aos portugueses, porque deve haver aí pessoas com consciência, que sabem aquilo que se passou e aquilo que se está a passar e que não entrarão neste jogo, se tiverem, de facto, essa consciência.
Os Srs. Deputados da maioria já vieram aqui dizer que o Orçamento retificativo não prevê austeridade reforçada, mas, caramba, Srs. Deputados, o Sr. Ministro hoje veio aqui anunciar mais uma medida de austeridade, anunciada também ontem pelo Sr. Primeiro-Ministro, a de que, em 2014, também vai haver cortes nos subsídios de férias e de Natal! Nós não podemos aceitar isto e é isso que pedimos que os Srs. Deputados também não o aceitem.
Mesmo para terminar, Sr.ª Presidente, quero apenas alertar os portugueses para o seguinte: de previsão em previsão, mesmo pela boca do próprio Governo, o cenário é sempre pior, é sempre mais catastrófico e isto «não cai do céu aos trambolhões», é o resultado da política que o Governo nos tem imposto.