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02/09/2004
Sobre proibição do barco "Women on Waves" em Portugal
Declaração Política da Deputada Heloísa Apolónia Sobre proibição do barco "Women on Waves" em Portugal
Assembleia da República, 2 de Setembro de 2004
 
 
 
 

 

 
 
 
 
Sr Presidente, Srs Deputados,

Passam ao largo da nossa costa centenas de navios por ano, carregados de hidrocarbonetos e dezenas carregados de plutónio, para alimentar programas nucleares de vários países.

A este propósito nunca ouvimos o Governo português constatar que estes navios constituem um perigo para a saúde pública e tomar por sua livre iniciativa garantias para que estas potências bombas passem na nossa zona económica exclusiva. Muito pelo contrário, perante os permanentes protestos, é costume o Governo invocar a Convenção de Montego Bay como um entrave ao impedimento de passagem desses navios.

O Prestige, como bem se recordam, esteve vai não vai para se deslocar para Portugal não fora a dimensão da tragédia ter antecipadamente impedido essa deslocação, até o Sr Ministro Paulo Portas ter deixado ao sabor das marés e nas mãos dos deuses o futuro da maré negra.

Perante tudo isto, ouvir agora do Governo que a embarcação da organização Women on Waves não pode entrar em águas territoriais portuguesas porque constitui uma ameaça para a saúde pública e que, por isso, a Convenção de Montego Bay permite impedir essa entrada, um perigo tão grande que até leva o governo a disponibilizar meios de marinha de guerra para vigiar o barco!... não fora a seriedade da questão, seria por certo a anedota do ano.

Srs Deputados, o que é que o Governo teme? Um Governo que não teme o plutónio, teme agora o quê? Os esclarecimentos? O debate? Opiniões contrárias à sua? Se já foi afirmado e reafirmado que ninguém naquela embarcação vem a Portugal violar a hipócrita e atrasada legislação portuguesa sobre o aborto, o que é que o Governo teme?

Um Governo que não percebe que a verdadeira ameaça à saúde pública no que diz respeito ao aborto são os abortos clandestinos e que convive bem com essa realidade. Um Governo que não tem pudor em ver mulheres no banco dos réus por terem interrompido uma gravidez.

Por outro lado, um Governo tão submisso à União Europeia, impede agora a livre circulação de pessoas numa contradição absoluta, baseada no princípio de que aqui não entra quem é contra as minhas ideias, demonstrando prepotência, arrogância e o nacionalismo à PP.

Esta atitude do Governo é mesquinha e inaceitável. Mas cá estaremos para ver, quando se souber da passagem de um outro navio com plutónio, como a soberania logo se vai, como as convenções internacionais e a livre circulação de embarcações vão prevalecer sobre a ameaça à saúde pública e que não há Convenção de Montego Bay que nos valha, porque a ideologia deste Governo PSD/PP não lhe permite fazer frente ao nuclear, mas a uma organização de mulheres holandesa e ao debate de ideias já permite.

Sr Presidente
Srs Deputados

Nesta declaração política “Os Verdes” pretendem ainda abordar uma outra matéria que revela uma enorme incompetência do Governo. Trata-se da forma como se lidou com os incêndios florestais neste Verão.

Perante o que vivemos no Verão de 2003, depois de tudo o que o Governo anunciou e garantiu, depois de um Ministro afirmar que este Governo preparou Portugal para enfrentar de forma mais eficaz os fogos florestais, aquilo que se verificou foi, por exemplo, que a Agência para a Prevenção do Incêndios florestais foi criada a tarde e a más horas e sem meios para intervir, verificou-se que os caminhos e pontos de água continuavam obstruídos e muitos desconhecidos, constatou-se mais uma vez descoordenação de meios e de entidades, faltaram meios de combate nos primeiros dias de incêndios, os meios aéreos chegaram tarde, bem como a ajuda militar – assim aconteceu, tudo de novo, por exemplo no Algarve.

No Algarve aos mais de 59 mil hectares de área ardida no ano passado, este ano acresceram, segundo dados oficiais, mais 30 mil e 500 hectares (perto de 1/3 da totalidade da área ardida ao nível nacional), perfazendo um total de quase 90 mil hectares ardidos em 2 anos (só em Monchique 87,2% do concelho está em cinzas), com consequências ambientais (com forte impacto em zonas protegidas), económicas (nomeadamente no que concerne à exportação de cortiça) e sociais (acentuando a desertificação e o despovoamento) catastróficas.

Perante isto o Algarve não tinha sido incluído na carta de zonas de risco, só tem uma brigada de sapadores localizada no Caldeirão e tarda na adopção de planos de prevenção, um dos quais (de S Brás de Alportel) demorou cerca de 2 anos no meio de burocracias para ser aprovado.

Perante este cenário, aterrador para quem o viu de perto, o Governo determinou não declarar situação de calamidade pública nesta zona do país, utilizando o argumento sem nexo, impedindo assim o aligeiramento de processos decorrentes dos consequentes prejuízos dos fogos, dificultando ajudas, procurando minimizar os impactos destes incêndios aos olhos da opinião pública, e, em simultâneo, escamotear que falharam as tão prometidas medidas para este Verão e afrouxar os compromissos para o futuro.

Portugal não pode continuar ao sabor das condições climatéricas que nos são oferecidas de ano para ano, porque elas são uma incógnita, o projecto SIAM que estudou os efeitos das alterações climáticas para Portugal pede-nos alerta e por isso é preciso deixar de fingir que se tomam medidas e concretizá-las efectivamente. Neste sentido “Os Verdes” vão solicitar, a breve prazo, a vinda ao parlamento dos Ministros com responsabilidade na defesa da floresta.

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