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14/12/2007
Tratado de Lisboa
DECLARAÇÃO POLÍTICA SOBRE A ASSINATURA DO TRATADO DE LISBOA
Deputado Francisco Madeira Lopes
13 de Dezembro de 2007


  

Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Lisboa engalanou-se hoje para receber no Mosteiro dos Jerónimos a cerimónia da assinatura do novo Tratado Europeu.

Espalharam-se pela capital referências ao Tratado e aos 27 países Estados-Membros, em rosas multicolores translúcidas, garantiu-se uma vasta operação de cobertura mediática que começou nos últimos dias abarcando os mais pequenos pormenores da cerimónia, desde o eléctrico que vai transportar os chefes de estado europeus até aos trabalhos da construção do palco, o programa musical e o almoço.

Franquearam-se os transportes públicos e a entrada nos museus com acesso gratuito todo o dia, publicou-se e distribuiu-se uma brochura em todos os grandes jornais e procurou-se até dar uma imagem de preocupação ambiental com a compensação do carbono emitido nas deslocações de avião dos líderes europeus com a plantação de árvores autóctones no Parque Nacional da Peneda Gerês para sequestro de carbono mesmo que não exista qualquer plano de reflorestação ou mesmo que não fosse esta a altura ou a prioridade para aquela área protegida.

Enfim, o Governo esforçou-se por criar em Lisboa um ambiente de festa e de celebração montando uma grande operação de charme e folclore, esbanjando-se dinheiro para colocar em cena a primeira grande acção de campanha pró-tratado de Lisboa.

Ontem “Os Verdes”, durante a reunião de auscultação dos partidos da oposição com representação parlamentar para preparação da próxima reunião do Conselho Europeu, deram os parabéns ao Sr. Primeiro-Ministro por ter alcançado aquele que foi o maior objectivo escolhido pela Presidência portuguesa da União Europeia: a assinatura do novo Tratado.

Mas hoje “Os Verdes” dão os pêsames aos portugueses e aos restantes europeus pelo mesmo facto.

Porque o facto de o Tratado envergar o nome de Lisboa, à semelhança da estratégia e da agenda que em 2000, também ganharam o mesmo nome, não faz destes necessariamente algo de positivo para Portugal ou para os portugueses.

Já a Estratégia de Lisboa, foi apresentada bem vestida de objectivos nobres e positivos como o eram o pleno emprego, a redução da pobreza e das desigualdades, assentes nos pilares de uma sociedade sustentada cada vez mais no conhecimento e na tecnologia e na transformação do mercado europeu no mercado mais competitivo do mundo até 2010, tem-se, apesar disso, revelado exactamente o oposto.

Com efeito, aquilo que a implementação da agenda de Lisboa nos diferentes países da União Europeia tem trazido, como em Portugal, é a debilidade do crescimento económico ligado às privatizações e liberalizações dos mais diferentes sectores, como os transportes, a água, a energia, os serviços públicos, a crise no emprego e o aumento do desemprego, aumento e agravamento da pobreza, injustiça na repartição dos rendimentos e o agravamento do fosso das desigualdades sociais e da exclusão social.

Esta agenda, aliás, continua a dar os seus frutos podres como se verificou na semana passada em que o Conselho Europeu que reuniu os Ministros do Trabalho, deu mais um passo na implementação do modelo da flexigurança a nível da União, que se anuncia, também em Portugal, mais como uma via rápida para o despedimento de trabalhadores e por este caminho para a degradação das condições de trabalho e de vida e até da capacidade de contestação social e de luta pelos seus direitos do que garantindo justas e efectivas contrapartidas e assistência social em situação de desemprego ou de “transição entre empregos” como agora soe dizer-se.

Da mesma forma, este Tratado, bem pode chamar-se de Lisboa para o Sr. Primeiro-Ministro enfeitar orgulhosamente a lapela; bem pode pretender anunciar o fim do fantasma da pseudo-crise inventada pelos grandes da Europa interessados em deter cada vez mais poder e cada vez mais absoluto, isto é, livre de constrangimentos e dos aborrecimentos que implicam a participação democrática; bem pode anunciar mais cidadania e decisões mais democráticas que esta propaganda não resiste a uma leitura atenta do seu conteúdo.

De Tratado Constitucional para Tratado de Lisboa, este Tratado já foi Reformador, Institucional, Tratado Simplificado ou Mini-Tratado, mas, apesar das sucessivas operações plásticas e dos potes de maquilhagem usados ele continua basicamente a ser na sua essência o mesmo Tratado que Holandeses e Franceses recusaram já em referendo.

O abandono da denominação de Constituição, ou tratado Constitucional, do hino europeu e da bandeira como símbolos, pouco valem face à atribuição de personalidade Jurídica à União Europeia, deixando esta apenas de representar os estados-membros, face ao crescimento de competências das instituições europeias retiradas aos estados-membros, nomeadamente na área da justiça e dos assuntos internos.

Pouco valem face ao fim das presidências rotativas, a diminuição do número de deputados e de comissários que pode significar para alguns países ficar fora da comissão por 50 anos, face ao desaparecimento da unanimidade nas decisões do conselho num grande número de matérias, face à criação do Alto Representante da União para os negócios estrangeiros e a Política de Segurança, mesmo que já não se chame Ministro dos Negócios Estrangeiros da União, face ao reforço da via militarista de uma Defesa Comum Europeia.

Para aqueles que de uma forma simplista querem fazer crer às pessoas, num discurso de uma cassete gasta e falsa de que quem está contra este tratado está contra a Europa e a construção europeia, “Os Verdes” respondem que este Tratado não é a favor da construção europeia é a favor da desconstrução europeia. Não é a favor da Europa assente nos princípios fundadores da cooperação, solidariedade e igualdade entre Estados membros e entre os povos europeus, é antes a favor da destruição desse ideal de Europa constituída por nações vizinhas soberanas que trabalham em prol de um futuro comum melhor para todos e substitui-o por outra Europa: uma Europa cada vez mais federal, mais militarista, que concentra poderes e rouba competências aos Estados nacionais, como no caso dos recursos marinhos, que assenta na fundamental desigualdade entre Estados subjugando os mais pequenos, como Portugal, à vontade dos maiores como a Alemanha, a França e o Reino-Unido.

“Os Verdes” voltam hoje a relembrar que perante um tratado, que não é apenas mais um Tratado, que perante os compromissos assumidos pelo PS, depois de termos alterado a constituição para permitir aos portugueses pronunciarem-se directamente sobre o rumo da construção europeia, defenderão intransigentemente a submissão da decisão de ratificação a referendo.

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