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Início - Grupo Parlamentar - XIII Legislatura 2015/2019 - Intervenções na Ar (Escritas)
 
 
Intervenções na Ar (Escritas)
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06/06/2018
Apresentação do Projeto de Lei de Os Verdes projeto de lei n.º 568/XIII (2.ª) — Assistência a banhistas - DAR-I-93/3ª
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia - Assembleia da República, 6 de junho de 2018

1ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria começar por dizer que, pelos corredores da Assembleia da República, alguns Srs. Deputados de vários grupos parlamentares dirigiram-se a mim, manifestando alguma estranheza pelo facto de Os Verdes terem requerido o agendamento potestativo deste projeto para hoje. Quero dizer a todas e a todos os Srs. Deputados que, depois da intervenção que vou fazer, espero que compreendam a dimensão e a importância do assunto que Os Verdes trazem hoje à Assembleia da República.

Assim, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Os Verdes trazem hoje a debate, na Assembleia da República, um projeto de lei que, em termos gerais, designamos de «assistência a banhistas» e que, concretamente, traz soluções para garantir maior segurança nas praias portuguesas.
Agora, que abriu a época balnear, é um momento importante para refletirmos sobre as condições de segurança nas nossas praias, o que falha e o que é da nossa responsabilidade alterar para melhorar.

Comecemos por dados que nos merecem preocupação e que nos movem para agir em torno de soluções mais eficazes.
Segundo o Observatório do Afogamento, da Federação Portuguesa de Nadadores-Salvadores, no ano passado, morreram por afogamento pelo menos 36 pessoas antes da abertura da época balnear e, portanto, todas em locais não vigiados.

Concretizando, dados da Autoridade Marítima Nacional associam 18 mortes por afogamento a praias marítimas, de janeiro a setembro do ano passado. Dessas 18 mortes, 15 ocorreram em praias não vigiadas e três em praias vigiadas, sendo que, destas últimas, duas resultaram de congestão e uma de ataque cardíaco. Ou seja, no ano de 2017, do total de mortes por afogamento em praias marítimas, 83% deram-se em praias não vigiadas, ou porque ainda não se tinha dado a abertura da época balnear, ou porque a praia em causa não tinha vigilância durante a época balnear.
Dados do Observatório do Afogamento revelaram, mais tarde, já no final de dezembro do ano passado, que o total de mortes por afogamento em praias não vigiadas terá sido na ordem dos 89%.

Para além destes dados, a Autoridade Marítima revela que, na época balnear do ano passado, os nadadores-salvadores realizaram 434 operações de salvamento, prestaram primeiros socorros a 649 pessoas e fizeram buscas por crianças 44 vezes.
Sr.as e Srs. Deputados, estes dados revelam claramente que a vigilância nas praias salva vidas.
Ora, se a vigilância nas praias salva vidas humanas, tudo o que contribua para reforçar e alargar essa vigilância é fator de segurança e de demonstração de responsabilidade política. É esse, justamente, o objetivo do projeto de lei que hoje o Partido Ecologista «Os Verdes» traz a discussão no Parlamento.

Em bom rigor, esta é uma matéria que move Os Verdes há muitos anos. Permitam-me fazer aqui um pequeno enquadramento do processo legislativo ao longo dos anos para que se perceba o nosso ponto de partida atual.

Perante um regime de assistência a banhistas que datava de 1959 e que se encontrava desajustado daquela que era a necessidade de segurança das zonas balneares — havia já uma muito mais elevada frequência das praias por banhistas, se comparada com a década de 50 —, em 2003, tendo em conta o número muito elevado de mortes por afogamento em praias portuguesas, onde só numa semana morreram sete pessoas por afogamento na Costa de Caparica, Os Verdes apresentaram ao Parlamento um projeto de lei que partia de duas constatações. Primeira, a época balnear é restrita, tendo em conta os hábitos de frequência das praias por parte das populações; segunda, só são vigiadas as praias concessionadas, ficando as outras, portanto, desprotegidas.

Assim, nesse projeto de lei de 2003, que veio a ser discutido em 2004, Os Verdes propuseram que a época balnear fosse alargada em dois meses, ou seja, em vez de começar em 1 de junho, começaria em 1 de abril.

Mais: Os Verdes propuseram que os nadadores-salvadores deixassem de ser contratados pelos concessionários das praias e passassem a ser contratados pelo Estado. De acordo com a nossa proposta à época, nas praias concessionadas, o respetivo concessionário pagaria à Autoridade Marítima uma taxa de assistência balnear, de modo a contribuir para o pagamento devido aos nadadores-salvadores da respetiva praia, mas a contratação de nadadores-salvadores seria feita pelo Estado.

Esse projeto de lei de Os Verdes foi aprovado e dele resultou a Lei n.º 44/2004, a qual assumia duas mudanças.
Uma das mudanças foi proposta através de um projeto do PSD e do CDS, que mantinha a época balnear entre 1 de junho e 30 de setembro, mas permitia que as câmaras municipais propusessem o alargamento dessa época nas praias do respetivo município. Assim, não foi acolhida a proposta de Os Verdes, de alargamento da época balnear a 1 de abril.

A outra mudança referia-se ao facto de a contratação de nadadores-salvadores passar a competir ao Estado, colmatando, assim, as lacunas de vigilância nas praias não concessionadas e nas praias vigiadas, estabelecendo que as concessionárias pagariam uma taxa ao Estado para cobrir o pagamento aos nadadores-salvadores.

Foi, portanto, acolhida a proposta feita por Os Verdes, que, efetivamente, alterava o paradigma da vigilância das praias em Portugal e garantia maior segurança aos banhistas.
O que aconteceu foi que o, então, Governo PSD/CDS não regulamentou a lei e o Governo PS, que se seguiu, teve um procedimento inaceitável, que foi o de ter alterado, por decreto-lei, uma lei aprovada por unanimidade na Assembleia da República, repondo, no que à contratação de nadadores-salvadores dizia respeito, o regime anterior. Ou seja, esse Governo fez com que tudo ficasse na mesma, como sempre tinha sido, e, por isso, só as praias concessionadas são vigiadas e as contratações competem aos concessionários.
Passados estes anos, Os Verdes consideram que é tempo de relançar o debate e de discutir novas soluções.
Desta forma, apresentamos duas propostas no nosso projeto de lei.

Em primeiro lugar, propomos que o período mínimo da época balnear seja de 1 de abril a 30 de setembro, porque os hábitos de praia dos portugueses não começam efetivamente em junho mas mais cedo. Nada temos a opor a que as câmaras municipais possam continuar a poder propor a alteração da época balnear nas praias do seu concelho, mas não podemos aceitar que usem essa prerrogativa não para alargar os prazos mas, antes, para os encurtar, com o objetivo de facilitar os encargos dos concessionários e pondo em causa a segurança dos banhistas.
Em segundo lugar, propomos que os cidadãos que frequentam as praias tenham consciência dos perigos que podem correr no caso de assumirem comportamentos de risco, pelo que o Partido Ecologista «Os Verdes» propõe que o Estado assegure campanhas de sensibilização dos cidadãos para esses mesmos perigos, sejam eles no mar ou em praias fluviais e lacustres. A verdade é que são várias as frentes em que é preciso atuar para combater posturas de risco e para desenvolver uma cultura de segurança.
Em terceiro lugar, propomos que seja o Estado, através do Instituto de Socorros a Náufragos, a assegurar a contratação de nadadores-salvadores nas praias portuguesas, sendo que, nas praias concessionadas, é justo que os concessionários assegurem, através de uma taxa, o valor a pagar aos nadadores-salvadores — custos que já hoje têm de assumir —, e que até outros agentes económicos que beneficiem das praias possam contribuir para esse pagamento. Dessa forma, nem a desculpa dos encargos para o Estado poderá ser alegada para fugir à responsabilidade de garantir maior segurança nas praias.

O projeto de lei de Os Verdes prevê, portanto, vigilância nas praias concessionadas e nas praias não concessionadas.
Sr.as e Srs. Deputados: Não vale a pena continuar a fazer de conta que os problemas e as fragilidades não existem. Continua a morrer muita gente nas nossas praias em zonas e épocas não vigiadas.
Passaram 15 anos desde que Os Verdes trouxeram pela primeira vez esta matéria à Assembleia da República. É tempo de este Parlamento agir com responsabilidade para garantir uma cultura de segurança nas nossas praias, o que implica meios e mecanismos adequados. É isso que propõe o projeto de lei que Os Verdes hoje trazem a debate na Assembleia da República.

2ª Intervenção – responde a pedidos de esclarecimento

Sr. Presidente, quero agradecer aos Srs. Deputados do PSD, do PS e do PCP as considerações e as questões que colocaram.
Gostava de dizer que, de facto, assumi na minha intervenção que o projeto de lei de Os Verdes visa, efetivamente, uma mudança de paradigma. Não tenho dúvida rigorosamente nenhuma sobre isso. Só discordo do Sr. Deputado João Torres em relação a uma coisa: é que o Sr. Deputado afirma perentoriamente que o modelo atual é eficaz e eu considero que o modelo atual não é eficaz e que há formas de o melhorar — aliás, é isso que estamos a propor à Assembleia da República —, para que tenhamos menos mortes nas nossas praias. É este o objetivo central do projeto de lei que Os Verdes agora apresentam.

Os números são muitos claros: fora da época balnear há mais mortes nas nossas praias, que não estão vigiadas, porque não estamos dentro da época balnear; dentro da época balnear, nas praias que não são vigiadas, ou seja, naquelas que não estão concessionadas, há mais mortes do que nas praias concessionadas. E os números revelam-nos isto com tal clareza que a conclusão só pode ser uma: se reforçarmos a vigilância nas nossas praias e alargarmos essa vigilância teremos uma maior eficácia no combate, digamos assim, a essas mortes nas nossas praias, que ainda são em número bastante avultado. É isso que nos deve mover.

Por outro lado, gostava de dizer o seguinte: não pomos em causa o facto de as câmaras municipais poderem ter uma palavra a dizer sobre a questão da época balnear — evidentemente, consideramo-lo até positivo —, mas na lógica de alargamento e não de encurtamento da época balnear. Aquilo que entendemos é que, tendo em conta os hábitos dos portugueses atualmente, o período fixo da época balnear não deveria ter início em 1 de junho mas, sim, em 1 de abril e, a partir daí, o alargamento continuaria sempre a ser possível.

Agora, há uma questão. Por exemplo, o PSD dita uma solução que parece muito prática mas que não é eficaz, que é a de dizer: «Nós resolvemos esse problema de uma forma muito clara e muito rápida: concessionamos mais praias». Pois, Sr. Deputado, mas há praias que não serão concessionadas e manter-se-á sempre o mesmo problema. Há praias que são frequentadas mas não serão concessionadas, logo, na lógica do Sr. Deputado, não terão nadador-salvador e, portanto, não terão a segurança que é devido assegurar aos frequentadores dessa praia.
Por outro lado, há uma questão central que é colocada em várias intervenções e que tem a ver com os custos para o Estado ou o modelo de financiamento que poderia ser adotado.
O Sr. Deputado Jorge Machado referiu aqui, e muito bem, que o custo brutal para a sociedade é o das mortes que se verificam nas praias pelo facto de não haver vigilância ou que a vigilância poderia evitar, e este é um dado que devemos ter em conta.

Não, Sr. Deputado! Sabe porquê? É que os bombeiros também custam qualquer coisa ao Estado, não é verdade?!
E a proteção civil também custa qualquer coisa ao Estado, mas o Sr. Deputado não o põe em causa. Por que é que põe em causa a vigilância nas praias? Custa-lhe que o Estado dê mais alguma coisa?
Acho que a segurança das populações, de facto, tem custos que é preciso assegurar e nós temos de o assumir.

Mas, para além disso, aquilo que propomos é o seguinte: relativamente às praias concessionadas, não propomos descartar, se me permitem a expressão, os concessionários do pagamento. Aquilo que dizemos é que quem contrata é a Autoridade Marítima, a Autoridade Marítima assegura essa contratação, através do pagamento de uma taxa por parte dos concessionários, para que esse pagamento seja assegurado.
Portanto, em termos práticos, ao nível do projeto de lei de Os Verdes, isto não assumiria muito mais custos para o Estado.

E o Sr. Deputado diz-me assim: «Está bem, e nas praias não concessionadas?». Isso é bem verdade, aliás, o Sr. Deputado Jorge Machado também referiu aqui uma questão com a qual concordo e que considero muito importante, que é a de percecionar que agentes económicos beneficiam efetivamente da dinâmica de uma determinada praia para que também eles possam contribuir para o pagamento da vigilância dessa praia. Eu acho que isto é inteiramente justo! Não devem ser apenas os concessionários dos bares das praias a contribuir, mas também todos os agentes económicos que beneficiam, de facto, da dinâmica dessas praias.

Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, acho que a grande vantagem deste projeto de lei que Os Verdes, hoje, trazem aqui à Assembleia da República é a de abrir um debate que estava amortecido, que estava a dormir. Os Verdes acordam este Parlamento para esta questão.
Assim, estamos disponíveis para baixar o projeto de lei à comissão, sem votação, de modo a que todas as Sr.as Deputadas e todos os Srs. Deputados se empenhem na discussão e na melhoria do modelo para salvaguardar a segurança das populações.

3ª Intervenção – responde a pedidos de esclarecimento

Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do CDS-PP as considerações e as questões que colocaram.
Em concreto, sobre o alargamento do período fixo, digamos assim, da época balnear, que Os Verdes propõem que seja de 1 de abril a 30 de setembro, Srs. Deputados, Os Verdes estão plenamente dispostos a discutir prazos adequados para o alargamento deste período.
O que nos moveu para puxar, digamos assim, o início da época balnear para 1 de abril foi a inegável maior frequência das praias, ou pelo menos o início, por parte dos portugueses, por exemplo, em períodos de férias da Páscoa, em que se verifica já uma grande afluência nas diversas praias do nosso País. De modo a abranger essa maior afluência, considerámos que seria um prazo adequado.

Mas é evidente que estamos dispostos, em sede de especialidade, a discutir concretamente a maior adequação do prazo de uma época balnear fixa, sem, repetindo o que disse há pouco, desconsiderar ou pôr em causa, sequer, a hipótese de as câmaras municipais, de acordo com a realidade concreta do seu município, poderem sugerir o alargamento do prazo para a época balnear.

A nós preocupa-nos também a questão dos comportamentos individuais e da segurança que cada pessoa também deve ter numa lógica de autoproteção. Essa foi uma questão que Os Verdes também trouxeram como proposta relativamente aos incêndios florestais.
É importante criar esta cultura da autoproteção, porque a nossa proteção individual é também a proteção do coletivo, como é evidente. Portanto, a sociedade tem tudo a ganhar com isso. Daí que Os Verdes, no seu projeto, apresentem uma proposta concreta relativamente à necessidade de formação, de sensibilização dos cidadãos para não terem comportamentos de risco e para uma cultura efetiva de segurança.

Há uma coisa que nos preocupa, Sr. Deputado João Rebelo: a falta de dados disponibilizados aos cidadãos — coloco a questão assim. Tem toda a razão relativamente a isso. Por exemplo, se quisermos conhecer efetivamente os dados das mortes nas praias portuguesas em 2018, não é fácil aceder a eles, porque não estão disponíveis.

Em relação à disponibilização de dados, como o Sr. Deputado bem dizia, concordo que sejam, até, discriminadas as causas das mortes nas praias, já que algumas delas não são por afogamento — mas aqui falamos concretamente das mortes por afogamento. É importante que esses dados sejam disponibilizados para que, através deles, que devem ser rigorosos, possamos também avaliar as situações da melhor forma para criar as melhores soluções. Portanto, a matéria da falta de dados, na nossa perspetiva, é importante.

Relativamente à falta de meios, à falta de pessoal, à falta de formação, pois, Sr. Deputado, se não começarmos agora, daqui a três, quatro, cinco anos temos exatamente o mesmo argumento. Considero que é muito importante que esta discussão se possa fazer agora em comissão, que possamos ouvir entidades, que possamos melhorar o texto e discutir, refletir sobre a melhor solução para criar um modelo mais robusto para o objetivo central de Os Verdes: gerar maior segurança no nosso território, nas nossas praias, nas mais diversas vertentes.

Os Verdes têm trazido aqui, por exemplo, a questão da pressão que tem sido feita sobre a nossa costa que gera a fragilidade das nossas arribas, designadamente quanto aos processos de erosão, que têm problemas concretos e promovem a insegurança das populações, concretamente também nas nossas praias. Como temos tido essa intervenção, trazemos outra vertente de intervenção de segurança nas nossas praias, que tem a ver justamente com a matéria da assistência a banhistas e da presença de nadadores-salvadores.
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