Exmo(a) Sr(a) Deputado(a)
5 de Fevereiro de 2004
Cara(o) Deputada(o),
O Governo ultimou dois projectos de diploma para um novo enquadramento legal do regime de protecção e de titularidade dos recursos hídricos.
Considerando a relevância que o recurso água tem para a vida, atendendo ao facto que se trata de um bem imprescindível e que o seu estatuto de protecção é determinante para a sua disponibilidade e qualidade, é, então, facilmente perceptível que se trata de uma matéria de importância fundamental para o país e para o modo de desenvolvimento do nosso território.
Ocorre, porém, que o Governo determinou que não apresentaria uma Proposta de Lei ao Parlamento, submetendo, em vez disso, os seus anteprojectos a autorização legislativa da Assembleia da República.
Significa isto que o Parlamento português não vai participar na elaboração da nova Lei Quadro da Água, como impropriamente, afinal, se lhe tem chamado. O próprio site do INAG, onde os cidadãos podem consultar os projectos de diplomas, designa-os de "Nova lei da água" e o portal do Ministério das Cidades, do Ordenamento do Território e do Ambiente designa-os de "Propostas de Lei Quadro da Água", induzindo os cidadãos em erro sobre a forma pela qual o Governo optou para elaborar estes diplomas.
Entretanto, as declarações do Sr Ministro Amílcar Theias sobre esta opção foram preocupantes. Na Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente do passado dia 21 de Janeiro, confrontado pelos Verdes sobre o facto do Governo estar a arredar a Assembleia da República deste processo, o Sr Ministro referiu o seguinte:
§ (A lei quadro da água) "está disponível no portal do Governo e no site do INAG".
§ (Durante o período de consulta pública) "espero receber contributos de muitas entidades e, desde já, convido os Srs Deputados, se me permitirem que vos enderece este convite, a me enviarem os comentários que tiverem a fazer sobre a lei".
§ "Os diplomas têm disposições bastante técnicas, e com este nível de discussões… eu achei que era preferível, em lugar de fazer uma lei, submeter a uma alteração legislativa… Com este tipo de discursos daqui a dois anos ainda estamos a discutir os 111 artigos".
Ou seja, o Sr Ministro "teve a bondade" de dirigir um convite aos Deputados para fazerem comentários, durante o período em que se disponibilizou para receber contributos dos cidadãos (que por sinal terminava daí a quatro dias) sobre aquela que é entendida como a Lei Quadro da Água. Para além disso, o Sr Ministro considerou que os Deputados não tinham condições para discutir um diploma que é objecto de muitas noções técnicas. E, mais, considerou que se a "Lei" viesse à Assembleia da República, daqui a 2 anos ainda a andaríamos a discutir, considerando que o Parlamento atrapalha!
Tudo isto, constitui um profundo desrespeito pela Assembleia da República, a casa comum da democracia, representativa do povo português!
Pensamos que nenhum dos Deputados à Assembleia da República duvidará do facto de que se os diplomas em causa vierem ao Parlamento, e aqui forem elaborados, poderão receber contributos extremamente válidos e enriquecedores da parte de qualquer dos Grupos Parlamentares, que poderão levar à elaboração de um diploma mais rico, que cumpra o seu objectivo de protecção dos recursos hídricos.
Estamos inclusivamente a falar de diplomas que revogarão toda a legislação que actualmente existe sobre propriedade e protecção dos recursos hídricos. Estamos a falar de diplomas determinantes, por isso pedimos-lhe que, independentemente da opinião que tem sobre o conteúdo dos projectos em causa, contribua para que a Assembleia da República seja envolvida na elaboração da Lei Quadro da Água, que contribua para que este processo legislativo corra no Parlamento. Por isso, fazemos um apelo para que não aceite o pedido de autorização legislativa que o Governo vai fazer à Assembleia da República.
As Deputadas do Grupo Parlamentar "Os Verdes"
Heloísa Apolónia e Isabel Castro
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