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14/05/2019 |
Consagrar o direito de sufrágio aos cidadãos maiores de 16 anos - DAR-I-87/4ª |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 14 de maio de 2019
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PAN traz-nos hoje, para discussão, uma proposta no sentido de que esta Assembleia assuma poderes de revisão constitucional — é esta e só esta a proposta que hoje estamos a discutir. Sem pretender formular qualquer juízo de valor sobre a intenção, a causa ou a finalidade desta proposta — que, recorde-se, é a consagração no texto constitucional do direito de sufrágio aos cidadãos maiores de 16 anos, discussão para a qual Os Verdes manifestam toda a sua abertura, tal como, de resto, o fizemos no passado e noutras ocasiões —, o que nos parece é que o final da Legislatura não é tempo adequado para que esta Assembleia assuma poderes de revisão constitucional.
Não o é, desde logo, porque, se olharmos para trás, constatamos que, das sete revisões que a nossa Constituição já conheceu, nenhum destes processos de revisão foi conseguido ou concluído dentro do prazo de que hoje dispomos até ao final da Legislatura.
Aliás, desses sete processos de revisão constitucional, quatro deles tiveram uma duração superior a um ano, entre um ano e um ano e meio. Foi assim com a revisão da Constituição de 1982, foi assim com a revisão da Constituição de 1989, foi assim com a revisão da Constituição de 1997 e foi assim, também, com a revisão da Constituição de 2004.
Quanto aos restantes processos de revisão constitucional, apesar de terem conhecido uma duração temporal mais curta, nenhum deles foi concluído dentro do tempo de que dispomos agora, até ao final da Legislatura.
Vejamos: se, porventura, esta proposta fosse aprovada, teríamos de esperar pela apresentação do primeiro projeto de revisão constitucional para depois esperarmos mais 30 dias para que os restantes Deputados que pretendessem, eventualmente, apresentar também os seus projetos o pudessem fazer. Só depois é que o processo estaria em condições de avançar, o que nos remeteria, invariavelmente, para agosto ou, na melhor das hipóteses, para meados de julho, sendo que a Legislatura acaba em setembro e, como sabemos, se os projetos de revisão constitucional não forem votados na Legislatura em que foram apresentados, caducam.
Ora, muito provavelmente, era isso que aconteceria se esta proposta, eventualmente, fosse aprovada.
Se é verdade que a deliberação para a assunção de poderes de revisão constitucional extraordinária pode ser feita a qualquer momento, como, aliás, já aqui foi hoje referido, não nos parece, contudo, muito sensato fazê-lo a quatro meses do fim da Legislatura, ainda por cima havendo interrupções dos trabalhos em Plenário em virtude dos atos eleitorais que estão próximos e também por causa de agosto pelo meio.
Na verdade, a revisão extraordinária da Constituição representa uma espécie de válvula de segurança para permitir antecipar a revisão, mas também é verdade que é necessário que a sua motivação se prenda com elementos absolutamente imprescindíveis ou inadiáveis. Daí a exigência especialmente qualificada de quatro quintos dos Deputados em efetividade de funções para desencadear o processo de revisão.
Consideramos que, neste caso, a finalidade, a intenção ou a causa que norteia este processo não é nem imprescindível, nem inadiável, até porque, admitindo que seria objetivamente possível aquilo que só por hipótese meramente académica se pode admitir, ou seja, admitindo até que seria objetivamente possível concluir o processo neste pouco tempo de Legislatura que nos resta, essa decisão nunca teria efeitos práticos nas próximas eleições legislativas, como, de resto, já foi aqui reconhecido pelo próprio autor do projeto. Isto atesta de forma muito clara que a finalidade da proposta não é nem imprescindível, nem inadiável, premissa que deve ser central quando se requere a assunção de poderes por parte da Assembleia da República para uma revisão da Constituição do ponto de vista extraordinário.
Por fim, convém referir que não estamos perante um processo legislativo comum. De facto, quando falamos de revisão da Constituição, falamos de um processo legislativo especial, dada a relevância que a Constituição assume no nosso ordenamento jurídico enquanto lei fundamental do País. Por isso, a própria arquitetura constitucional estabelece exigências acrescidas para a sua revisão. Ora, estas exigências decorrem também da necessidade que a Constituição pretende assegurar para que o processo de revisão não se transforme num processo acelerado, feito à pressa, em cima do joelho e a mata-cavalos.
Portanto, para terminar, Os Verdes não acompanham a proposta para que esta Assembleia, nesta fase, proceda à assunção de poderes de revisão constitucional.