|
08/06/2016 |
Constituição de uma Comissão Eventual para estudar e promover uma reforma do sistema público de segurança social português (DAR-I-76/1ª) |
|
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 8 de junho de 2016
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Marco António Costa, nós, Os Verdes, olhamos para a proposta do PSD com muitas, mas muitas reservas. E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque quando olhamos para trás, sobretudo para os últimos quatro anos, constatamos que as políticas do Governo anterior, em matéria de segurança social, não fugiram muito de dois objetivos que, curiosamente, diz o Sr. Deputado (disse-o da tribuna), que o PSD agora não quer.
E quais são esses objetivos? Por um lado, a redução da despesa com prestações a pagamento, e de que os tais 600 milhões de euros que o Governo anterior pretendia retirar às pensões é apenas o exemplo; por outro lado, a privatização progressiva do sistema, com a introdução do plafonamento.
Mas o Governo PSD/CDS não se ficou por aqui, porque a sua obsessão com a austeridade acabou por multiplicar o desemprego e a emigração, que são dois fatores decisivos para a sustentabilidade da segurança social e que tiveram ainda reflexos ao nível da natalidade, degradando ainda mais as condições dessa sustentabilidade, aliás, tal como é referido na exposição de motivos da proposta do PSD, ainda que sem fazer qualquer referência à responsabilidade do anterior Governo no agravamento deste quadro, mas nós percebemos porquê.
A verdade é que se exigem medidas porque a segurança social conheceu alterações nos últimos anos, e também é verdade que essas alterações, sobretudo aquelas que o anterior Governo promoveu, tiveram sempre como objetivo controlar o aumento da despesa pública.
Vamos aos exemplos: primeiro, a suspensão da antecipação da idade de reforma, que implicou que, entre 2012 e 2014, os trabalhadores estivessem impedidos de se reformar com a idade inferior à idade legal de reforma. Seguiu-se a indexação da idade de reforma à esperança média de vida, uma medida que, aliás, veio penalizar mais a reforma antes da idade legal. Por fim, o agravamento do fator de sustentabilidade, feito pelo anterior Governo, que veio penalizar de forma muito cruel as pessoas que anteciparam a idade de reforma.
Aliás, Sr. Deputado Marco António Costa, o Governo do PSD e do CDS acabou por nem publicar a portaria com os coeficientes de revalorização dos salários que servem para o cálculo das pensões e com essa omissão, intencional ou não, a verdade é que as pessoas que se reformaram em 2015 estão a receber pensões mais baixas do que aquelas a que tinham direito. Portanto, há muito por fazer nesta área.
Antes de mais, é necessário procurar melhorar as condições de sustentabilidade financeira, económica e social do sistema de segurança social. É necessário contrariar as pressões demográficas — e aqui ganha especial importância a promoção da natalidade. É necessário procurar novas formas de financiamento e combater a fraude e a evasão contributiva, porque estas atingem hoje níveis muito preocupantes e estão a provocar a degradação das pensões, uma vez que a falta de meios financeiros acaba por ser sempre um pretexto para não se atualizarem as pensões.
Mas estas não são as únicas causas da degradação das pensões da segurança social, porque a estas teremos ainda de somar a erosão da base contributiva. Como o Sr. Deputado sabe, a parte do produto interno líquido que reverte para os trabalhadores sob a forma de ordenados e salários constitui a base através da qual são calculadas as contribuições para a segurança social.
Ora, ao que temos vindo a assistir, sobretudo nos últimos anos, é que essa base é cada vez menor, porque mais baixos têm vindo a ser os salários. Ou seja, hoje é muito maior a parcela da riqueza que é criada e que não contribui para a segurança social do que aquela que contribui, que são os ordenados e os salários. Esta tendência compromete seriamente a sustentabilidade da segurança social, obrigando a mais cortes nas pensões e impedindo a devida e justa atualização das pensões, se não se tomarem medidas.
E, Sr. Deputado Marco António Costa, é exatamente sobre esta matéria que recai o meu pedido de esclarecimento. Queria saber se o PSD está disponível para procurar soluções legislativas com vista a alargar a base de cálculo das contribuições das empresas, de forma a considerar toda a riqueza criada no País e não apenas a parte dos ordenados e salários.
Creio que era importante que o Sr. Deputado nos dissesse alguma coisa sobre esta matéria, até para podermos perceber o alcance da pretensão do PSD quando, no ponto 2.a) do projeto de resolução que nos apresenta, se refere às fontes de financiamento da segurança social. Portanto, seria importante que nos dissesse alguma coisa sobre isto.
Por fim, Sr. Deputado, o PSD propõe a constituição de uma comissão eventual para estudar uma reforma do sistema público de segurança social, matéria que já tem enquadramento no âmbito das competências da Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social. Queria perguntar-lhe, Sr. Deputado Marco António Costa, se não lhe parece que, para além de uma clara e objetiva inutilidade, esta proposta do PSD acabaria por esvaziar o trabalho da Comissão Parlamentar de Trabalho e Segurança Social?