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27/07/2020
Culturas Intensivas no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina Os Verdes Exigem Conhecer o grau de Contaminação dos Solos e Lençóis Freáticos
A deputada Mariana Silva do Grupo Parlamentar Os Verdes, entregou na Assembleia da República uma pergunta, em que questiona o Governo, através do Ministério do Ambiente e da Ação Climática, sobre a intensificação de produção no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina que se tem traduzido em grande parte pela prática de culturas cobertas (estufas, estufins e túneis) que em 2015 ocupavam já uma área de 654ha, segundo dados do ICNF, e atualmente ocupa perto de 2000 ha (dados não confirmados). Sendo que o regulamento (RCM n.º 11-B/2011e RCM n.º 179/2019) permite a exploração coberta em 40%, cerca de 4.800ha.


Pergunta:

O Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, foi criado inicialmente como Àrea de Paisagem Protegida pelo Decreto-Lei n.º 241/88, de 7 de julho e mais tarde reclassificado como Parque Natural pelo Decreto Regulamentar nº 26/95, de 21 de setembro, passando a incluir uma área marinha adjacente. Estende-se numa extensa zona costeira alcantilada e arenosa, com uma área de cerca de 131 mil ha, entre os concelhos de Sines e Vila do Bispo.

A zona alberga ainda o Sítio Rede Natura2000 – Costa Sudoeste PTCON0012 criado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 142/97 de 28 de agosto, e a Zona de Proteção Especial para as Aves (ZPE) Costa Sudoeste PTZPE0015, pelo Decreto-Lei n.º 384-B/99, de 23 de setembro.

É vasta a lista de razões que justificam a sua classificação como área a proteger. A presença de vários endemismos da flora nacional e de uma grande riqueza faunística em que a avifauna e a ictiofauna detêm um papel destacado. Esta região terá sido o último reduto de nidificação no nosso país da Águia Pesqueira (Pandion haliaetus) que não voltaria a nidificar em Portugal durante mais de 20 anos. A classificação como ZPE revela bem a importância da área para várias espécies de aves, incluindo um importante corredor migratório. Ao nível dos mamíferos destaca-se a população de lontras (Lutra lutra) no estuário do rio Mira, com hábitos marinhos, um comportamento bastante raro no nosso país. De destacar ainda as zonas húmidas do Parque como charcos temporários, juncais e arrelvados húmidos. Os Charcos Temporários Mediterrânicos constituem um dos mais notáveis e singulares habitats de água doce da Europa e são considerados um habitat prioritário pelo Anexo I da Diretiva Habitats (92/43/CEE). Neste Parque Natural encontram-se alguns dos principais núcleos de charcos temporários a nível nacional.

Em 1995 o preâmbulo do Plano de Ordenamento caracterizava a área protegida assim:

“Com efeito, quer do ponto de vista paisagístico, quer do ponto de ecológico, esta área possui uma grande diversidade, apresentando uma linha de costa caracterizada genericamente por arribas altas, cortadas por barrancos fundos, pequenas praias, ribeiras e linhas de água temporárias, estuários e sapais que albergam uma grande diversidade de habitats. De realçar ainda a existência de uma agricultura tradicional e variada, de extensas charnecas, onde ocorrem localmente áreas florestadas que, conjuntamente com as condições climáticas, determinam uma fraca humanização da paisagem. Tal permite a ocorrência de uma extraordinária riqueza faunística e florística, com algumas áreas e espécies particularmente valiosas.”

O objetivo inicial da sua classificação era exatamente travar uma ocupação desordenada que se começava a desenhar, como refere o preâmbulo do Decreto-Lei de 88, numa zona do país ainda pouco adulterada nos seus aspetos naturais. É um facto que o Parque e o seu plano de Ordenamento impediram de certa forma o crescimento de um turismo desenfreado, que já tinha descaracterizado o litoral algarvio. Mais recentemente, e dada a coexistência dentro do Parque de uma área de intervenção específica, o Perímetro de Rega do Mira, que não ficou sujeita às regras do Plano de Ordenamento do Parque Natural, tem-se vindo a assistir a uma intensificação da atividade agrícola que está a tomar proporções preocupantes e pôr em causa muitos valores do Parque e a própria saúde pública das populações.

A construção do Aproveitamento Hidroagrícola do rio Mira (AHM), em 1973, beneficiando uma área de 12.084 ha, o Perímetro de Rega do Mira (PRM), antecedeu, é certo, a classificação da área protegida, em 1988, que incorporou 11 948 ha desse perímetro de rega, ou seja 99% do total.

Mas até recentemente a atividade agrícola beneficiária do AHM não teve grande intensidade e expressão, tirando a tentativa falhada do empresário Thierry Roussel em 1991, cuja dimensão da intervenção, apadrinhada pelo então Primeiro Ministro, foi rapidamente abandonada, deixando um rasto de plásticos que ainda hoje perdura.

Nos anos mais recentes os sistemas agrícolas tradicionais que caracterizavam a paisagem têm estado a ser reconvertidos com o objetivo de intensificar a produção. Essa intensificação tem-se traduzido em grande parte pela prática de culturas cobertas (estufas, estufins e túneis) que em 2015 ocupavam já uma área de 654ha, segundo dados do ICNF, e atualmente ocupa perto de 2000 ha (dados não confirmados). Sendo que o regulamento (RCM n.º 11-B/2011e RCM n.º 179/2019) permite a exploração coberta em 40%, cerca de 4.800ha.

Apesar de todas as ressalvas quanto ao PRM no Plano de Ordenamento do Parque Natural, o facto de constituir uma área de intervenção específica, tem permitido o crescimento da área coberta de cultura intensiva o que está a criar diversos problemas de ordem ambiental, social e de saúde pública. Hoje as estufas e túneis constituem verdadeiras barreiras tanto visuais como físicas conflituando largamente com a conservação dos valores naturais para os quais o Parque foi criado e que são fundamentais para a salubridade do país e do planeta. Muitas destas coberturas de plástico estendidas até ao solo constituem verdadeiras barreiras físicas impedindo a circulação de pessoas e acima de tudo uma barreira física à fauna nomeadamente a populações mais sensíveis como micromamíferos, répteis e anfíbios agravando o verdadeiro isolamento que muitas destas espécies já vêm sofrendo como grupos de animais extremamente sensíveis.

Por outro lado, a proliferação dos campos de agricultura intensiva, quer sejam cobertos ou a descoberto, têm levado a uma significativa alteração da morfologia dos solos levando à destruição, terraplanagem e drenagem de muitas dos charcos temporárias e outras estruturas húmidas do parque, denunciados pelas populações, constatado pelo Programa LIFE Charcos da LPN em parceria com o ICNF e testemunhado em várias visitas ao local pelo PEV, ao longo dos anos mais recentes.

O que revela um grande contrassenso do financiamento comunitário. Por um lado, o Programa Life financia projetos de recuperação e proteção dos charcos temporários, por outro muitas das empresas de horticultura no PRM, recorrem ao financiamento comunitário para exercer a sua atividade que tem destruído vários desses charcos, que numa das visitas de PEV em 2010 se contabilizavam em cerca de 200.

Temos o caricato da união europeia financiar projetos que destroem os charcos temporários e depois financiar projetos para preservar e recuperar esses mesmos charcos.

Acrescem ainda as quantidades industriais de plásticos que inundam a paisagem e que para além de constituírem uma verdadeira agressão à paisagem e uma barreira física intransponível população e a própria fauna do Parque, recorrentemente se transformam em resíduo abandonado. Um resíduo que nem sempre tem o destino adequado e que importa acompanhar esse percurso, para que não aconteçam escusas com falências e incapacidades financeiras tal como aconteceu com o empreendimento agrícola de Thierry Roussel em Odemira.

Importa também apurar as quantidades de fitofármacos, adubos e outros agroquímicos lançados ao longo dos agora cerca de 2 mil hectares e o grau de contaminação dos solos assim como dos lençóis freáticos e o impacte no ecossistema, na água servida às populações, nas águas balneares e na saúde pública, já que a própria IGAMAOT em inspeção no ano 2017 identificou contaminação aquífera derivada da atividade agrícola.


Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, solicito a S. Exª O Presidente da Assembleia da República que remeta ao Governo a seguinte pergunta, para que o Ministério do Ambiente e da Ação Climática possa prestar, com caráter de urgência, os seguintes esclarecimentos:

1 – Qual a área exata atualmente (julho de 2020) de culturas agrícolas cobertas dentro do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, beneficiárias do Perímetro do Rega do Mira?

2 - Qual a quantidade média anual de agroquímicos (fertilizantes e fitossanitários e outros pesticidas) consumidos pelas culturas referidas no ponto anterior?

3 – Que análises são feitas e com que regularidade, aos solos, águas subterrâneas, e águas costeiras, para deteção de contaminação derivada das práticas agrícolas intensivas e quais os resultados?

4 – Tendo Os Verdes testemunhado, por diversas visitas, que muitas das estufas existentes, com largas dezenas de metros, se não mesmo centenas, têm as suas coberturas em plástico até ao solo, constituindo verdadeiras barreiras físicas nomeadamente à micro fauna mais sensível (Micro mamíferos, répteis e anfíbios), de que forma é que estas estruturas respeitam os objetivos de conservação da Área protegida e a salvaguarda das espécies em causa?

5 - Qual a quantidade de plásticos usados para a cobertura de estufas, estufins e túneis, na área em causa e qual tem sido o seu destino final concreto quando passam a resíduos? E os plásticos provenientes dos diversos sistemas de rega?

6 – Que medidas pensa o Ministério tomar para que as grandes quantidades de plásticos abandonados que já se veem dispersos pela região sejam recolhidos e encaminhados, assim como travar esse fenómeno?

7 - Já foram removidas as toneladas de plásticos deixadas pelo inovador PIN projeto de Thierry Roussel, no Brejão Odemira, apadrinhado pelo então Primeiro Ministro em março de 1991, e pouco tempo depois entrou em falência?

8 – Quantas e quais as empresas/explorações receberam fundos comunitários para instalação e exploração de estufas, estufins e túneis no interior do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina?

9 – Existe algum inventário completo dos charcos temporários mediterrânicos no Parque Natural e quantos foram destruídos, drenados ou terraplanados desde 1995?

10 - Quantos técnicos, técnicos superiores e vigilantes, tem atualmente o Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina ao serviço? Considera o MAAC o número suficiente para a funções de vigilância, monitorização, projetos de conservação e recuperação de habitats e espécies e análise e pareceres sobre os projetos de agricultura, turismo ou outros?


O Grupo Parlamentar Os Verdes


27 de julho de 2020
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