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29/10/2018 |
Debate conjunto, na generalidade, das Propostas de Lei n.os 155/XIII/4.ª (GOV) — Aprova as Grandes Opções do Plano para 2019 e 156/XIII/4.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2019 - DAR-I-18/4ª |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 29 de outubro de 2018
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças, permita-me que faça um comentário em relação à forma pouco respeitosa com que o Sr. Deputado Adão Silva se referiu às posições conjuntas que o PS celebrou com os partidos à sua esquerda e, em concreto, com o Partido Ecologista «Os Verdes».
Gostaria de lhe dizer duas coisas, Sr. Deputado: essas negociações, ou as posições conjuntas, merecem respeito, porque foram construídas a pensar nos portugueses.
E sabe outra coisa, Sr. Deputado Adão Silva? Que eu tenha conhecimento — e está aqui o Sr. Primeiro-Ministro, que o pode confirmar —, não houve, nem durante essas negociações nem depois, nenhum dirigente dos partidos à esquerda do PS que se tenha chegado ao pé do Sr. Primeiro-Ministro, que tenha feito uma birra absolutamente irrevogável e que tenha obrigado o Sr. Primeiro-Ministro a alterar a Lei Orgânica do Governo para criar o cargo de Vice-Primeiro-Ministro!
Portanto, mais respeito, Sr. Deputado!
Sr. Ministro das Finanças, concordamos consigo, achamos que este Orçamento acompanha, de facto, as linhas essenciais dos últimos três Orçamentos desta Legislatura, ou seja, este Orçamento assinala um esforço assumido de, pelo menos, colocar as coisas no sítio, depois da desarrumação que a passagem da direita pelos destinos do País acabou por provocar, nomeadamente ao nível dos direitos e rendimentos das famílias, mas também ao nível da qualidade dos serviços públicos.
Mas, Sr. Ministro, há um dado que tem de estar presente nesta discussão: tal como os três últimos Orçamentos, este Orçamento não pode ser comparado com os do PSD e do CDS, por um motivo muito simples. É que, neste Orçamento, discutimos o valor das devoluções, se é muito ou se é pouco; nos Orçamentos do PSD e do CDS, aquilo que se discutia era a dimensão dos cortes, se eram muitos ou se eram poucos, se eram justos ou se eram injustos.
Portanto, não pode ser este o termo de comparação. A comparação tem de ser feita entre aquilo que este Orçamento propõe e aquilo que é socialmente justo, entre aquilo que este Orçamento propõe e aquilo a que as pessoas e as famílias têm direito.
Sr. Ministro, sendo este o último Orçamento desta Legislatura, o sentimento generalizado que fica é o de que sabe a pouco, porque, afinal, o Governo acabou por fazer os serviços mínimos ao nível da justiça social e do desenvolvimento do País e, em algumas matérias, nem os serviços mínimos fez.
As contas são fáceis de fazer: se a economia está a ter um bom desempenho, é justo que esse bom desempenho tenha reflexos positivos na vida das pessoas, exatamente na mesma proporção. E, quando falamos de reflexos positivos, falamos não só dos direitos e rendimentos das pessoas mas também da qualidade dos serviços públicos, porque, se não se valorizarem os salários e se não se melhorarem os serviços públicos, quando a economia está a ter um bom desempenho, então, quando será o tempo de proceder à devolução de rendimentos e salários e de reforçar a qualidade dos serviços públicos?! Quando será a altura de tomar decisões que vão ao encontro das justas e legítimas aspirações das pessoas senão quando a economia dá sinais positivos?!
Sr. Ministro, para Os Verdes, aquilo que se perspetiva, quanto ao aumento dos salários dos trabalhadores da Administração Pública, parece ser insuficiente a todos os níveis e em todas as dimensões. É insuficiente quando comparamos os salários médios do nosso País com os dos outros países europeus, é injusto quando comparamos o valor desse aumento com o das verbas que estão previstas para financiar a banca — recordo que são mais 850 milhões de euros só para recapitalizar o Novo Banco — e é absolutamente injusto quando comparado com os montantes que estão previstos para o custo das parcerias público-privadas, que, recordo, ascendem a 1692 milhões de euros.
Sr. Ministro, não lhe pergunto se acha isto justo ou injusto, mas pergunto-lhe, desde já, se acha que este aumento dos salários dos trabalhadores da Administração Pública está em sintonia com o desempenho da nossa economia. E a sua resposta, Sr. Ministro, terá de ter presentes dois elementos: a devolução de direitos e rendimentos às famílias acabou por ser decisiva para o desempenho da economia e os salários dos trabalhadores da Administração Pública estão congelados há 10 anos. Portanto, Sr. Ministro, a minha pergunta é no sentido de saber se acha que este aumento dos salários vai acompanhar o crescimento da economia.
Além disso, Sr. Ministro, os serviços públicos exigem um investimento forte e de qualidade, até porque, como sabemos, o anterior Governo deixou-os numa situação absolutamente fragilizada, a todos os níveis e em todos os setores. Nesta matéria, Os Verdes sublinham a necessidade de olhar para os transportes públicos, muito em particular para a ferrovia, com olhos de ver.
Assim, Sr. Ministro, gostaria de saber qual é a abertura e a disponibilidade do Governo para, em sede de discussão na especialidade, acolher algumas das propostas de Os Verdes, nomeadamente no que diz respeito à aquisição de material circulante e também ao reforço de trabalhadores, tanto na CP (Comboios de Portugal, EPE) quanto na EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário, SA).
Naturalmente, em sede de discussão na especialidade, Os Verdes não vão desistir e vão insistir nessas e noutras propostas, designadamente em torno da necessidade de continuarmos a reforçar os meios ao nível da conservação da natureza e também de criarmos incentivos para os produtores florestais que queiram investir em produções de espécies autóctones.
Para terminar, Sr. Ministro das Finanças, reconhecemos que este Orçamento do Estado transporta elementos positivos, nomeadamente no que se refere aos aumentos das pensões de reforma, à gratuitidade dos manuais escolares e à redução dos custos no acesso aos transportes públicos. Mas, Sr. Ministro, se não fosse a forma como o Governo olha para as imposições externas, nomeadamente para o tratado orçamental e para o défice, não temos dúvidas de que, certamente, «outro galo cantaria». O poema até podia ser o mesmo mas, certamente, «outro galo cantaria» e as pessoas e os nossos recursos naturais teriam mais importância neste Orçamento.
Se não fosse a forma como o Governo olha e encara as parcerias público-privadas e as ajudas à banca, Sr. Ministro, o poema podia ser o mesmo mas, certamente, «outro galo cantaria».
A pergunta que lhe deixo, Sr. Ministro, é exatamente no sentido de saber se acompanha esta leitura, de que, se não fossem essas opções estratégicas por parte do Governo relativamente ao tratado orçamental, ao défice, às parcerias público-privadas e às ajudas à banca, este Orçamento poderia pensar muito mais nas pessoas e nos recursos naturais.