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07/01/2016 |
Debate de atualidade sobre consolidação das reformas na justiça |
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Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 7 de janeiro de 2016
Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A justiça é um pilar absolutamente fundamental da nossa democracia. É essencial num Estado de direito democrático.
E face à situação da justiça em Portugal, marcada sobretudo pela morosidade e onde inundam as pendências processuais, exige-se que os Governo assumam como função — que, de resto, é sua — trabalhar no sentido de construir um sistema de justiça mais célere, mais eficiente e, sobretudo, mais acessível aos cidadãos.
E o que fez o Governo PSD/CDS nos últimos quatro anos? Fez exatamente o contrário.
Primeiro, aumentou as custas judiciais para que os cidadãos não recorram aos tribunais, negando, dessa forma, o acesso ao direito à justiça, que é obrigação do Estado garantir, e, depois, encerrou dezenas de tribunais, afastando ainda mais a justiça dos cidadãos.
Encerrou tribunais, desqualificou-os em meras extensões, concentrou valências judiciais nas capitais de distrito e, sobretudo, afastou os cidadãos, ainda mais, da justiça, um direito que a nossa Constituição eleva como direito fundamental.
O Governo PSD/CDS impôs um conjunto de critérios injustos com vista à redução de tribunais em muitas localidades, sem ter sequer em conta o meio onde se insere cada um dos tribunais, as características socioeconómicas e até a acessibilidade em termos de mobilidade das populações.
O resultado não podia ser outro: o agravamento das condições de acesso dos portugueses à justiça, sobretudo daqueles que vivem com mais dificuldades económicas.
Com o encerramento dos tribunais que o Governo PSD/CDS protagonizou, o volume processual dos tribunais encerrados foi transferido para outros tribunais que já na altura estavam completamente atulhados em processos.
Mais, em muitos casos, o Governo PSD/CDS nem sequer respeitou os critérios que ele próprio definiu. Referimo-nos, por exemplo, ao critério do volume processual inferior a 250 processos ou, ainda, ao critério do tribunal que passou a receber os processos distar do tribunal de origem de um tempo inferior a uma hora. Ou seja, o Governo PSD/CDS nem sequer respeitou os critérios que ele próprio definiu para o tal mapa judiciário.
Portanto, com essa decisão, o Governo PSD/CDS afastou ainda mais os cidadãos da justiça, sobretudo nas regiões com mobilidade mais dificultada, e tornou a justiça mais cara, porque agora é também preciso acrescentar os custos da deslocação. E como se fosse pouco, o Governo PSD/CDS ainda teimou em fazer entrar em vigor o novo mapa judiciário sem ter acautelado o essencial, de forma a garantir o normal funcionamento dos tribunais.
Como consequência, a entrada em vigor do mapa judiciário do anterior Governo representou uma embrulhada sem paralelo na nossa História. Foi uma vergonha o que se passou, com o caos instalado na justiça e com a paralisação dos tribunais.
Foi isto e só isto que o então Governo conseguiu com a sua reforma: o regresso à era do papel, dos faxes, das cartas registadas e das fotocópias. Consultar processos passou a ser uma tarefa tão difícil como procurar uma agulha no meio de um palheiro. Uma vergonha!
E agora vem o PSD acenar com o relatório do FMI. O FMI que, aliás, deve estar muito preocupado com a vida dos cidadãos portugueses e com o seu acesso à justiça! Até acho que, se dependesse da vontade exclusiva do FMI, só haveria um tribunal em Portugal e chamar-se-ia Fundo Monetário Internacional.
Portanto, Srs. Deputados, para avaliarmos a situação da justiça nos últimos quatro anos seria melhor olhar para outros relatórios. Por exemplo, para o relatório de gestão da Comarca de Lisboa, que, recentemente, nos deu conta da falta de dinheiro para impressoras, para toners, para envelopes e até para lâmpadas; para a segurança dos edifícios do campus da justiça, com os pórticos de segurança de detetores de metais avariados à entrada dos edifícios, isto já para não falar do sistema de aquecimento; para a falta de funcionários judiciais.
Também poderíamos olhar para o que diz a Associação Sindical de Juízes, que, ainda há pouco tempo, dirigiu uma carta ao Conselho Superior da Magistratura dando conta da prolongada avaria nos elevadores no Palácio da Justiça do Porto. Uma falha que está a causar dificuldades no transporte de processos e impede, também, o acesso de pessoas com mobilidade reduzida ao Tribunal de Trabalho, um tribunal que, como se compreende, recebe muitas pessoas com mobilidade reduzida devido a acidentes de trabalho.
Em vez de ouvir o que o FMI diz sobre a justiça em Portugal, talvez fosse melhor, mais adequado, ouvir as populações que residem nos concelhos onde o Governo PSD/CDS encerrou os tribunais. Seria bom ouvir as pessoas, porque é para elas que o governo deve governar e não para o FMI. Seria bom ouvir as pessoas que vivem em Boticas, em Murça, em Sabrosa, em Mesão Frio, em Resende, em Paredes de Coura, e por aí fora, são 47 tribunais. Seria bom ouvir essas pessoas porque, Sr.ª Ministra, nós consideramos que chega de governar para o FMI, é tempo de governar para as pessoas, para os portugueses.