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Intervenções na Ar (Escritas)
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27/01/2016
Debate, requerido pelo PS, sobre política de saúde
Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 27 de janeiro de 2016

1ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro da Saúde, sabemos que o Governo anterior, do PSD/CDS, por pouco não transformou o Ministério da Saúde numa secretaria de Estado do Ministério das Finanças. Bem que tentou! Bem que tentou!

Foram quatro anos com cortes cegos numa área tão sensível como é a área da saúde, quatro anos a encerrar serviços de saúde por todo o País, quatro anos a empurrar os custos de saúde para os utentes e, por fim, quatro anos com um Governo que não escondeu as suas preocupações com os interesses do setor privado na área da saúde, incluindo a privatização/concessão de hospitais de gestão pública.

Foram quatro anos de orientações claramente indisfarçáveis e inseparáveis da linha ideológica que acompanhou a direita, ou que a direita trazia aos ombros, que colocou em causa o acesso aos cuidados de saúde pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde e que teve repercussões não só a curto mas também, como está a constatar-se, a médio e a longo prazos. O retrato é absolutamente assustador!

Lembremos o que dizia o ministro da Saúde do anterior Governo, PSD/CDS, quando se referia aos encerramentos e aos cortes na saúde: que o Governo encerrava serviços de saúde para melhorar o acesso dos portugueses aos serviços de saúde.
Pois agora estamos a ver quanto melhorou o acesso à saúde com o Governo PSD/CDS! O que se está a passar ao nível do acesso aos cuidados de saúde é uma vergonha! O cenário é desolador!

E não nos referimos apenas ao que aconteceu no inverno do ano passado, com o caos instalado nas urgências e com pessoas a morrer enquanto esperavam para serem atendidas; referimo-nos a tudo o resto. E tudo o resto é o adiamento de consultas e cirurgias, é a rutura nos serviços de urgência, é a diminuição do número de camas, obrigando muitos dos doentes a passarem dias e noites internados em corredores dos hospitais, e é a carência generalizada e evidente, sobretudo de meios humanos e não só, no Serviço Nacional de Saúde, nas unidades hospitalares e nas unidades de cuidados primários de saúde. Tudo a dificultar o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.

Mas é ainda necessário referir a quebra de rendimentos que o Governo anterior impôs às famílias, ao mesmo tempo que inflacionou, e muito, o valor das taxas moderadoras e que também vieram agravar a situação.
Ora, face a este quadro, há, de facto, muito a fazer para se conseguir fazer renascer o Serviço Nacional de Saúde e para, no mínimo, se conseguir repor o Serviço Nacional de Saúde a níveis anteriores aos da passagem do PSD e do CDS pelo Governo. Há muito trabalho pela frente!

Sr. Ministro, o Programa do Governo do Partido Socialista estabelece para a área da saúde, entre outras medidas prioritárias, a eliminação das taxas moderadoras de urgência sempre que o utente seja referenciado e a redução global dos valores das taxas moderadoras.

Há, portanto, um conjunto de medidas de isenção, de dispensa e de redução do valor das taxas moderadoras que o Governo assumiu como prioritário na área da saúde.

Sabemos que o Governo já procedeu, ou está a proceder, à análise dos potenciais impactos decorrentes das alterações legislativas das taxas moderadoras, mas, ainda assim, Sr. Ministro, gostaria que nos dissesse se a redução do valor global das taxas moderadoras e o aumento da acessibilidade aos utentes mais vulneráveis, permitindo uma adequada referenciação, já vão ter reflexos ao nível do Orçamento do Estado para 2016.

Sr. Ministro, para terminar, gostaria que nos dissesse que reflexos é que a expansão e a melhoria da rede de cuidados de saúde primários, aumentando a acessibilidade dos utentes, a sua centralidade mas, também, a confiança no Serviço Nacional de Saúde, e, ainda, o reforço dos cuidados de proximidade na área da saúde oral e visual, que, aliás, o Sr. Ministro referiu na intervenção inicial, vão ter no Orçamento do Estado para 2016, porque estas também eram matérias que constavam do Programa do Governo e que tinham uma certa natureza prioritária.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O caos nas urgências hospitalares no inverno de 2015, na sequência de demoras excessivas no atendimento de doentes, foi hoje aqui referido várias vezes.
A este propósito vem agora o Observatório dos Direitos Humanos afirmar que a ineficiência dos serviços e a reduzida capacidade de resposta que demonstraram nesse período levam a crer que se possa afirmar que o direito à saúde, tanto dos doentes que acabaram por falecer, como dos outros doentes que se encontravam em espera e que sofreram iguais demoras no seu atendimento e tratamento, foi violado.

Portanto, foi violado o direito à saúde desses doentes, o que, não sendo novidade para nós, tem, no entanto, uma importância acrescida, porque é o Observatório dos Direitos Humanos a afirmá-lo e não apenas os partidos, como Os Verdes, que, desde o início, o denunciaram.

Por outro lado, um estudo feito por uma organização sueca e que ontem foi divulgado veio dizer-nos que Portugal passou de 13.º para 20.º num ranking internacional que compara a performance dos sistemas de saúde de 35 países. O mais curioso é que o estudo conclui que os cuidados de saúde na Europa têm vindo a melhorar, apesar da crise financeira e das medidas de austeridade. Mas, no caso de Portugal, que passa de 13.º para 20.º, a saúde não melhorou, sobretudo na sequência de piores resultados no capítulo da acessibilidade aos cuidados de saúde, nomeadamente nos tempos de espera para consulta de especialidade e para cirurgias não urgentes.

Face às políticas de saúde do anterior Governo de PSD/CDS, estes números e estas conclusões não nos podem surpreender, porque, de facto, os cortes no financiamento do Serviço Nacional de Saúde, o encerramento de serviços de saúde, a perda de médicos para o sector privado e a ausência de uma política de contratação que conseguisse, de certa forma, dar resposta às necessidades do sector público fragilizaram substancialmente a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde. E nem o que aconteceu no inverno passado com a rutura nas urgências a ganhar preocupações alarmantes, nem mesmo isso, fez mover o anterior Governo que, insensível ao que se estava a passar e indiferente às consequências para o futuro, prosseguiu na sua caminhada de destruição do Serviço Nacional de Saúde e continuou com a sua política de cortes numa área tão importante como é a área da saúde.

Aliás, o Governo anterior teve, ao nível da saúde, uma postura absolutamente irresponsável e o seu raciocínio foi este: ou o sistema de saúde suportava os cortes que o Governo estava a impor — o que era, de todo, impossível e que só o PSD e o CDS não viam tamanha evidência — ou remetia as consequências para o futuro e para o divino, dizendo «Seja o que Deus quiser!». E agora aqui estamos nós a levar com as consequências das políticas do anterior Governo, que mais não fez do que engordar o mercado dos privados com interesses na área da saúde.

Ainda recentemente recebemos um ofício do Sindicato Independente dos Médicos através do qual os médicos manifestavam a sua indignação pelo que se está a passar nos serviços de urgência, onde vai reinando a imoralidade com médicos tarefeiros colocados por empresas prestadoras de serviços, muitas vezes, sem qualquer especialidade, mas com encargos para o Estado muito superiores aos encargos que resultam dos médicos especialistas do quadro. Enquanto uma empresa, que disponibiliza um médico tarefeiro, recebe 960 € por 24 horas de trabalho em serviço de urgência, um médico do quadro do SNS representa para o Estado um encargo de apenas 380 € pelo mesmo trabalho. Isto é um escândalo a que é preciso pôr cobro, Sr. Ministro. É preciso pôr cobro à inundação das empresas de trabalho temporário que estão nos hospitais. Há, portanto, muito a fazer a todos os níveis: no acesso à saúde, onde é necessário desenvolver mecanismos que coloquem as pessoas no centro do sistema e reduzam as desigualdades; na qualidade, otimizando recursos para a promoção da melhoria da gestão e da prestação de cuidados de saúde; e, também, na eficiência, estimulando a capacidade de obter mais e melhores resultados através da otimização dos instrumentos de governação e dos mecanismos participativos na gestão do Serviço Nacional de Saúde.
Em síntese, o que é preciso é devolver o acesso dos portugueses aos cuidados de saúde.
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