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Intervenções na Ar (Escritas)
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12/06/2019
Debate sobre o tema «Travar as culturas agrícolas intensivas e superintensivas» - DAR-I-95/4ª
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia - Assembleia da República, 12 de junho de 2019

1ª Intervenção

Sr. Presidente, Sr. Ministro, o Sr. Ministro veio aqui dizer que quer fazer um debate sério e é justamente isso que Os Verdes querem ao marcar este debate. Por isso, quero dizer-lhe, Sr. Ministro, talvez para ajustar a sua resposta, que estamos a falar de culturas intensivas e superintensivas e não apenas do olival — também do olival, mas não apenas do olival —, não podemos, por exemplo, subestimar a brutal área de amendoal que grassa por esse Alentejo fora.

Por outro lado, o Sr. Ministro diz que, relativamente a esta matéria, não quer um discurso alarmista. Os Verdes dizem que também não, mas também não queremos um discurso de branqueamento, que faça de conta que os problemas não existem.
Por isso, numa lógica séria, de lealdade e de responsabilidade, trazemos a este debate uma matéria que está a causar verdadeiros problemas ambientais e a afetar a qualidade de vida das populações.

O Sr. Ministro falou sempre do olival em sebe — de resto, o CDS também gosta de usar essa terminologia —, ambos para usarem um eufemismo e esconderem, justamente, a característica destas culturas, que são intensivas e superintensivas. E isso quer dizer qualquer coisa.
Ora bem, se o Sr. Ministro não estivesse, de facto, preocupado, não viria à Assembleia da República dizer que encomendou estudos para aferir dos impactos destas culturas, nem viria à Assembleia da República dizer que quer acabar com o apoio ao investimento a estas culturas, nem tão-pouco viria à Assembleia da República dizer que é preciso descontinuar estas manchas imensas de olival intensivo e superintensivo.
Por outro lado, o Sr. Ministro, no seu discurso, quer fugir à realidade. Quero fazer-lhe uma pergunta muito concreta: o Sr. Ministro consegue negar que estas culturas intensivas e superintensivas estão a descaraterizar completamente a paisagem rural do Alentejo? Estão! O Sr. Ministro, certamente, não o nega.

O Sr. Ministro consegue dizer que estamos a falar de culturas de regadio, que não precisam de água?
Também não o pode dizer. Mas o Sr. Ministro sabe qual é a diferença relativamente ao olival tradicional, ao olival de sequeiro.
Já agora, vou colocar-lhe uma outra questão: porque é que o Sr. Ministro não anuncia também o fim do apoio às medidas agroambientais que visam, justamente, tornar determinados modelos de produção mais sustentáveis, mas que depois não são aplicadas aos modelos de produção mais sustentáveis?

Por exemplo, se estivermos a falar de medidas para o uso eficiente da água, estes apoios podem aplicar-se às culturas intensivas e superintensivas, mas já não se aplicam ao olival tradicional. Isto tem alguma lógica, quando estamos a falar de culturas mais sustentáveis? Não faz!
Portanto, seria bom que o Sr. Ministro alargasse esse «fim dos apoios» a determinados apoios que não fazem sentido.
Por outro lado, o Sr. Ministro, se for ao terrenos falar com as populações, em concreto, também não será capaz de negar que a utilização dos pesticidas nestas culturas intensivas e superintensivas está a afetar diretamente a qualidade de vida das pessoas, tendo em conta, muitas vezes, a proximidade das suas habitações a estas culturas. Estas pessoas têm de fechar as janelas e as portas de suas casas porque não aguentam, Sr. Ministro. É bom ter em conta esta realidade.

A pergunta que Os Verdes fazem é se o Sr. Ministro está disposto a aceitar uma iniciativa que Os Verdes apresentam na Assembleia da República no sentido de promover um distanciamento dos extremos destas culturas intensivas e superintensivas às habitações, designadamente, um distanciamento de 300 m, que é, justamente, a referência usada para as culturas transgénicas a nível da contaminação de outras culturas.
Sr. Ministro, nós temos um problema sério, o das alterações climáticas, em que temos de tomar medidas concretas de mitigação, mas também de adaptação. E transformar a nossa paisagem, e não só a nossa paisagem, mas tudo aquilo que comporta alastrar pelo nosso Alentejo fora e pelo nosso território fora estas culturas intensivas e superintensivas é promover o contrário da adaptação que deveríamos estar a fazer, porque isto tem impacto concreto no gasto de água e na saturação dos solos.

O Sr. Ministro, já que gosta tanto dos estudos técnico-científicos, mas, pelos vistos, dá pouca credibilidade ao que dizem as populações, sabe perfeitamente que existem estudos direcionados para o Alentejo sobre os efeitos das alterações climáticas que determinam uma potencialidade de desertificação de solos absolutamente preocupante.
Precisamos, de facto, de medidas concretas de adaptação às alterações climáticas e uma delas passa, justamente, por travar estas culturas intensivas e superintensivas.

2ª Intervenção

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Se o Sr. Ministro quiser recordar coisas que foram ditas e até defendidas no passado — não é que esteja a comparar exatamente a realidade e as espécies em concreto, mas, se calhar, o Sr. Ministro vai perceber aquilo que Os Verdes querem dizer —, lembro-lhe que, há muitos anos, também se defendia muito as monoculturas de eucalipto por esse País fora.

Sim, o Sr. Ministro lembrar-se-á: dizia-se que dava muito emprego, que gerava uma dinâmica económica imensa para a nossa floresta! Hoje, acho que já toda a gente consegue perceber o rastilho que se espalhou por este País fora. Sabe para que dinâmica, Sr. Ministro? Dos fogos florestais. Agora lembre-se o Sr. Ministro o que se perdeu em termos de emprego com esse drama dos fogos florestais e o que se tem perdido na nossa floresta. Por que é que estamos a lutar hoje? Pela floresta autóctone, Sr. Ministro. Não temos nada contra a espécie eucalipto, mas, sim, contra as imensas manchas de monocultura de eucalipto. Essa é que foi uma das desgraças da nossa floresta.

Sobre este debate em concreto, vamos ver se não cometemos o mesmo erro relativamente ao olival intensivo com outras consequências, designadamente consequências graves para as alterações climáticas: saturação de solos, desertificação de solos e consumo de água. E vamos ver se, daqui a uns anos, não estamos todos de mãos na cabeça a dizer: «O que é que andámos a fazer? Precisamos, de facto, de olival tradicional». Os Verdes, Sr. Ministro, estão a alertar em tempo útil.

O Sr. Ministro queria um debate sério, mas foi o Sr. Ministro que contribuiu para um debate pouco sério, ao ter dito que tudo isto tem custos ambientais mas que pôr uma horta à porta de casa também tem custos ambientais. Sr. Ministro, quer comparar essas duas realidades? Acho que dizer isso é mesmo não levar a sério aquilo que se está a discutir. O Sr. Ministro também disse: «Os senhores estão a contribuir para que as pessoas considerem que consumir azeite é muito perigoso». Sr. Ministro, pelo amor de Deus! Sinceramente, isso não é dar seriedade ao debate, e o Sr. Ministro sabe perfeitamente que não é isso que está em causa.

Se quer falar de qualidade, se calhar temos mesmo de falar do olival tradicional e, se calhar, temos mesmo de remeter a lógica da quantidade para o olival intensivo e superintensivo, porque essa era a primeira prioridade deste tipo de modelo, digamos assim, de olival.
O Sr. Ministro também não traz seriedade ao debate quando diz: «Não temos a certeza se há mortandade de aves ou não decorrente da recolha mecânica da azeitona, mas, se houver, é porque a biodiversidade existe».
Sr. Ministro, sinceramente, isso traz pouca seriedade ao debate!

O Sr. Ministro quer um eufemismo para a questão do superintensivo, mas também não vale a penar estar a escamotear a realidade, porque sabe que quando as culturas são de grande densidade usam mais pesticidas e mais fertilizantes. Sim, o Sr. Ministro sabe que, com essas culturas de grande densidade, há mais problemas fitossanitários. Estes problemas alastram-se de uma forma completamente diferente e mais rápida.
O Sr. Ministro sabe isso, como sabe, também, que a carga ambiental destas culturas intensivas e superintensivas é muito maior. O problema da saturação dos solos coloca-se de uma forma mais intensa e o problema relativamente à utilização do recurso à água coloca-se igualmente de uma forma mais intensa.

Sr. Ministro, já devíamos ter aprendido com problemas que se criaram no passado. Estamos sempre a dizer que as questões económicas não são incompatíveis com as questões ambientais, mas quando se coloca no prato da balança ou quando se tem de decidir sobre uma matéria económica ou uma matéria ambiental, pois a matéria económica continua sempre a valer, mesmo que os impactos ambientais sejam brutais e possam trazer problemas muito sérios no futuro.

Um dos problemas dos sucessivos Governos é o de terem tido uma visão de muito curto prazo e de não terem visão de médio e longo prazo. Estamos a confrontar-nos com um problema sério relativamente às alterações climáticas — e vou repetir isto, Sr. Ministro —, que requerem, que pedem urgentemente propostas e medidas de adaptação na área agrícola. O Sr. Ministro devia estar a dar passos largos no sentido da adaptação do nosso território à mudança climática. E volto a referir que há estudos concretos sobre o Alentejo que ditam que, se tudo continuar na mesma, vamos ter um problema sério de desertificação de solos.
Depois, venham cá falar de soberania alimentar, Sr. Ministro! Depois, não temos onde cultivar! Portanto, veja bem o que estamos a fazer no presente com impacto no futuro.

Mesmo para terminar, também gostaria de dizer ao Sr. Ministro que é bom ouvir as populações e aquilo com que elas se confrontam no dia a dia. Não podem estar as populações todas erradas, os autarcas todos errados, as associações todas erradas e, afinal, só o Governo e a direita estarem certos! Nesta matéria, não pode ser assim! Por isso, aconselho o Sr. Ministro a ir para o terreno e a ouvir concretamente as populações.
Mesmo, mesmo para terminar, refiro que o Sr. Ministro diz assim: «Então, agora o Governo é que vai ditar um distanciamento entre o extremo da cultura intensiva e superintensiva e das habitações?!» Sim! Sim, essa é uma proposta que Os Verdes fazem!
Sr. Ministro, também fizeram o mesmo relativamente às culturas transgénicas, em que se colocava a questão da contaminação. Porque é que o Governo o fez? Ah! Aí, foram a União Europeia e as multinacionais que o ditaram, não foi, Sr. Ministro?
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