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Intervenções na Ar (Escritas)
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16/01/2019
Declaração política - crescente deterioração dos CTT e defesa de processo de reversão da privatização dos CTT - DAR-I-39/4ª
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 16 de janeiro de 2019

1ª Intervenção – Declaração Política

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que está a passar-se com os CTT é uma autêntica vergonha.

As notícias sucedem-se umas atrás das outras e praticamente todos os dias somos confrontados com o anúncio do encerramento de estações de correios.

Aliás, de acordo com a Comissão de Trabalhadores dos CTT, corremos o risco de chegar-se a 2020 apenas com cerca de 200 estações, em vez das 600 existentes no início de 2018. Infelizmente é para aí que caminhamos.

Segundo dados da ANACOM, durante o ano de 2018, 33 concelhos do nosso País ficaram sem estação de Correios e, como se não bastasse, a empresa CTT anunciou a pretensão de encerrar ainda mais 15 estações, o que significa que meia centena de concelhos ficará sem estações de correios. Ou seja, mais de 15% do número total de concelhos ficam desprovidos de qualquer estação de Correios, penalizando, sobretudo, as populações do interior.

Mas esta é, infelizmente, apenas uma das consequências da decisão do Governo PSD/CDS em privatizar os CTT.

Com efeito, a decisão do Governo anterior, de entregar os CTT aos privados que, recorde-se, foram vendidos em Bolsa, ainda por cima a um preço muito abaixo do mercado, está a ter consequências muito negativas, tanto para o Estado, como para as populações, como ainda para os próprios trabalhadores dos CTT.

Por um lado, privou-se o Estado de receitas necessárias para dar resposta às políticas sociais. Recorde-se que, enquanto empresa pública, os CTT contribuíam todos os anos com importantes receitas para os cofres do Estado e ao mesmo tempo prestavam um serviço público de altíssima qualidade, facto, aliás, reconhecido também no plano internacional.

Ao fim destes anos, o Estado já perdeu centenas de milhões de euros em dividendos e o País deixou de ter um serviço de correios público, fiável e seguro.

Por outro lado, com a decisão de privatizar os CTT, PSD e CDS acabaram por sujeitar os cidadãos à constante degradação de um dos mais importantes bens de interesse público, o serviço postal. De facto, os Correios são um serviço fundamental para as populações, para o desenvolvimento do País e para a coesão territorial, desde logo porque contribuem para atenuar desequilíbrios sociais e económicos, mas também para esbater as assimetrias regionais.

Ora, cinco anos depois da privatização desta importante empresa, e face à constante degradação do serviço prestado aos cidadãos, é tempo de repensar, não o contrato de concessão, aliás descaradamente incumprido, porque isso nada resolverá, mas a própria propriedade dos CTT.

A verdade é que, após cinco anos de privatização, é hoje perfeitamente notória e crescente a deterioração e a descaracterização dos serviços de correio, o que contraria o que a própria empresa apresenta como a sua missão, visão e valores.

Os exemplos desta situação são muitos: encerram-se centenas de estações e postos — desde a privatização dos CTT, foram encerradas centenas de estações e centenas de postos de correio; foram vendidos os edifícios; foram retirados da via pública centenas de recetáculos postais; foram despedidos trabalhadores; os vínculos precários aumentaram e aumentaram os percursos de cada giro de distribuição, assim como os tempos de espera para atendimento.

Mas não ficamos por aqui: há falta de dinheiro disponível nas estações para pagamento de pensões e de outras prestações sociais; registam-se atrasos que já chegam a duas semanas na entrega de vales postais com as pensões; as situações em que o correio deixou de ser distribuído diariamente generalizaram-se — existem mesmo localidades no País onde o carteiro apenas passa uma vez por semana, e, noutras, pouco mais do que isso; populações inteiras que se veem obrigadas a deslocações de vários quilómetros até à estação mais próxima, muitas vezes sem terem transportes ou condições para o fazer; o recurso sistemático a empresas de trabalho temporário e a prestadores de serviços, entre tantos outros exemplos que aqui poderiam ser referidos.

Tudo isto sem ter em conta as necessidades e os direitos das populações e dos trabalhadores e sem garantir as condições que assegurem a celeridade, a segurança e a privacidade da correspondência.

Em resumo, a privatização trouxe menos qualidade, menos postos de trabalho, menos estações de correios, menos distribuição, menos receitas para o Estado, delapidação de património e mais encargos para as pessoas.

De facto, a esta evidente degradação do serviço é ainda necessário somar o aumento das tarifas que, desde a privatização, subiram já mais de 55%.

Ou seja, neste momento, e como resultado da privatização, os cidadãos pagam mais e a oferta do serviço é menor, ao mesmo tempo que os trabalhadores viram as suas condições de trabalho sofrer um substancial retrocesso.

Em bom rigor, o que se está a passar nos CTT não é próprio de um Estado de direito. Os acionistas continuam a apoderar-se, sob a forma de dividendos, de todos os lucros gerados pela empresa e até a distribuírem dividendos superiores aos lucros, descapitalizando completamente os CTT.

Só entre 2013 e 2016, foram distribuídos mais de 270 milhões de euros em dividendos, ou seja, cerca de um terço da receita total da privatização.
A tudo isto acresce ainda o facto de o Banco CTT ter sido implementado sobre a estrutura de estações de correio, funcionando nas instalações e com os trabalhadores dos Correios, que são desviados dos balcões dos serviços postais para os balcões do serviço do Banco, o que está a provocar um substancial aumento nas filas de espera.

Definitivamente, a administração remete o serviço postal para segundo ou terceiro plano. O que agora interessa é o Banco CTT, e só o Banco CTT.

Para terminar, gostaria de dizer o seguinte: cinco anos após a privatização dos CTT, e face ao que assistimos, Os Verdes não têm dúvidas de que se impõe avançar com o processo de reversão da privatização dos CTT de forma a que a sua propriedade e gestão regressem à esfera do Estado, a única forma de recuperar a qualidade e a universalidade do serviço público postal no nosso País.

2ª Intervenção – responde a pedidos de esclarecimento

Sr. Presidente, começo por agradecer os pedidos de esclarecimento formulados pelos Srs. Deputados Hélder Amaral, Luís Moreira Testa, Heitor de Sousa e Bruno Dias.

Sr. Deputado Hélder Amaral, quanto às lágrimas, do que tenho receio é de chegarmos ao fim desta Legislatura e haver Deputados que ainda não tenham percebido a circunstância que se vive.

Eu sei que estavam habituados a fazer birras irrevogáveis que até obrigavam o então Primeiro-Ministro a alterar a lei orgânica do Governo para criar o cargo de Vice-Primeiro-Ministro. Connosco não tem havido isso.

Connosco, há uma posição conjunta que tem sido respeitada e que é fundamental.

Mas, Sr. Deputado, o senhor não pode dizer que aumentaram em não sei quantos os postos de correio e, ao mesmo tempo, dizer que o CDS está preocupado com a qualidade do serviço. Se diz que aumentaram os postos, então…

Agora, os postos de correio vão para as livrarias, para as lojas dos trezentos!? Mas nós estamos a falar de quê, Sr. Deputado? De postos de correio?!
Sr. Deputado, também não sei onde foi buscar a ideia de que os autarcas têm pacificamente concordado com o encerramento! Não sei a que autarquias se refere, só se forem as autarquias do CDS. É que, das autarquias que conheço — e, aliás, já fui a várias —, eram todas contra o encerramento dos Correios.

O Sr. Deputado Luís Moreira Testa pergunta o que há a fazer face ao quadro que está traçado. Sr. Deputado, acho que a resposta está no que foi dito por um camarada seu, Artur Penedos, que, na semana passada, escreveu um artigo no Público, cujo título é o seguinte: É urgente reverter a privatização dos CTT. Acho que a resposta está aí, Sr. Deputado.

Sr. Deputado Heitor de Sousa, quanto às licenças bancárias, é verdade, tem razão. E o que sucede é que, quando foi com o BES ou com o BPN, ninguém levantou qualquer problema com licenças bancárias e, portanto, aqui deveríamos estar na mesma situação.

O Sr. Deputado tem também razão ao dizer que este é um ano crucial para esta Assembleia decidir se quer manter os CTT na esfera privada ou se é altura de o serviço postal regressar à esfera do Estado. Nós consideramos que é absolutamente decisivo que venha para a esfera do Estado.

Inclusivamente, já apresentámos, há alguns meses, uma iniciativa legislativa nesse sentido, exatamente para haver uma reversão do processo de privatização dos CTT, de forma a que a propriedade e a gestão regressem à esfera pública porque essa é a única forma de garantir a qualidade do serviço prestado.

Sr. Deputado Bruno Dias, claro que é urgente fazer essa reversão, e quanto mais cedo melhor. É que, quanto mais tarde se fizer, menos estações de correio haverá e mais prejuízos haverá para o Estado, porque, como referi há pouco na tribuna, só em dois anos os acionistas já recuperaram um terço do investimento que fizeram. Se calhar, é por isso que o Sr. Pires de Lima diz que foi um excelente negócio. Pois foi! Só que ele não diz é para quem foi um excelente negócio!

Mas nós sabemos! Para as populações não foi um bom negócio. Para os autarcas não foi um bom negócio. E para o Estado foi um péssimo negócio, com o qual ainda hoje estamos a sofrer.


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