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29/09/2016 |
Declaração política sobre o encerramento da central nuclear de Almaraz, na província de Cáceres, por falta de segurança (DAR-I-7/2ª) |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia - Assembleia da República, 29 de setembro de 2016
1ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Brincar com o fogo» é, convenhamos, quase um eufemismo, se aplicado ao caso «central nuclear de Almaraz».
Esta central nuclear funciona, parcialmente, desde 1981, e, em pleno, desde 1983. Os seus dois reatores são em tudo semelhantes aos de Three Mile Island, nos Estados Unidos da América, onde ocorreu um brutal acidente nuclear em 1979. Almaraz expirou o seu período de vida em 2010, e impunha-se, sem qualquer reserva, o seu encerramento e o seu desmantelamento.
Porém, o Governo espanhol, ao contrário das intenções anteriormente anunciadas, decidiu prolongar o funcionamento de Almaraz, alargando a licença de atividade por mais 10 anos, até 2020. Trata-se nada mais, nada menos do que a mais velha central nuclear espanhola, absolutamente obsoleta, situada a uns escassos 100 km da fronteira portuguesa e que usa as águas do rio Tejo para a sua refrigeração.
As falhas e deficiências no funcionamento na central de Almaraz têm-se sucedido às dezenas ao longo dos anos e, à medida que se vai forçando a sua atividade, já com prazo técnico e tecnológico expirado, o normal é que vá sendo suscetível de mais falhas e que estas se revelem em recorrentes incidentes que, a qualquer momento, se podem tornar acidentes e casos muitíssimo sérios.
Só neste ano de 2016, foram detetadas avarias nas bombas de arrefecimento, houve uma paragem de um dos reatores, um incêndio num dos geradores de energia, a deteção do uso de peças com defeito nos seus geradores e a conclusão das autoridades espanholas é sempre a mesma: está tudo bem, nenhum motivo para preocupação! Isto é, evidentemente, querer fazer das pessoas tolas e demonstra uma enorme irresponsabilidade que pode vir a resultar em dramas a que não nos podemos sujeitar!
Ora, perante esta ameaça, os sucessivos governos portugueses têm sido amplamente brandos, não querendo imiscuir-se nas decisões do Estado espanhol. E o que Os Verdes reafirmam é que esta brandura é inaceitável! Se ao Governo português compete defender os interesses do seu povo e do seu território para além de uma sustentabilidade global, não é aceitável que mantenha constantemente um comportamento passivo em relação ao caso «Almaraz», que se encontra praticamente a paredes-meias com Portugal.
Soube-se, entretanto, que o Conselho de Segurança Nuclear espanhol deu um parecer favorável à instalação de um armazém para acondicionamento temporário de resíduos provenientes da laboração da central de Almaraz, que ocupará uma área de cerca de 3000 m2. Este projeto do consórcio que explora esta central nuclear, e que integra a Endesa e a Iberdrola, implica um investimento que leva a crer que está na calha um ainda maior alargamento do período de funcionamento da central de Almaraz, porque os tanques onde atualmente são armazenados os combustíveis usados nos reatores expiram em 2019, pretendendo-se, assim, que este armazém de resíduos fique construído até 2018. Se isto não é um indício claro de que se pretende a continuidade, ainda por longos anos, da central nuclear de Almaraz, digam-nos, por favor, o que é!
Perante esta situação, o Sr. Ministro do Ambiente informou, na passada terça-feira, na audição realizada na Comissão de Ambiente, que o Governo português pediu uma reunião urgente às autoridades espanholas. Os Verdes acham muito bem que se realize essa reunião urgente, que só peca por tardia.
Alertamos, contudo, para o facto de o Governo português ter uma missão da qual não se pode desviar e que passa, desde logo, por pugnar pelo cumprimento da Resolução da Assembleia da República n.º 107/2016, que recomenda ao Governo português uma intervenção junto do Governo espanhol para o encerramento da central nuclear de Almaraz.
O que queremos afirmar é que, se o Governo português contacta as autoridades espanholas para dizer que Espanha é que sabe do futuro da central nuclear e que a nós, Portugal, resta estarmos preocupados mas que confiamos em tudo quanto Espanha decidir, de pouco ou nada valerá a urgência da reunião.
O que o Governo português deve fazer é manifestar a sua total oposição à construção de um armazém temporário de resíduos e combustíveis da central nuclear e afirmar que os reatores nucleares de Almaraz já ultrapassaram o seu prazo de validade há vários anos e, para o efeito, é determinante lembrar que, nos termos do acordo de Madrid, celebrado entre Portugal e Espanha, no mês de fevereiro de 2008, Portugal tem uma palavra ativa em relação a toda esta situação de Almaraz, porque num contexto de impactos transfronteiriços não temos direito a apenas um favor de informação mas a uma efetiva participação num processo decisório.
A central nuclear de Almaraz é uma ameaça à espreita, é um risco iminente a cada instante. Em caso de acidente, teríamos sérios problemas radioativos em território português, e no rio Tejo com grande particularidade, devastando a sua biodiversidade e o tanto que a sua estabilidade representa para os portugueses.
Ao Governo português pede-se esse empenho junto do Governo espanhol e aos cidadãos portugueses uma afirmação determinada junto do Governo português e também do espanhol que garanta que o povo português está atento e decidido, perante o princípio da segurança e o princípio da responsabilidade, a lutar pela salvaguarda da nossa vida e do nosso património natural, livre de ameaças nucleares.
Os Verdes, que há mais de 30 anos persistem nesta luta, continuarão incansavelmente empenhados, na Assembleia da República e fora dela, pelo fim progressivo da energia nuclear e pelo encerramento em concreto da central nuclear de Almaraz.
Se há coisa que Fukushima, em 2011, nos ensinou foi que os graves acidentes nucleares não são história do passado, mas, sim, algo bem presente que todos temos a responsabilidade de temer e de agir consequentemente.
Pelo fim da ameaça nuclear contem sempre com Os Verdes.
2ª Intervenção
Sr.ª Presidente, começo por agradecer às Sr.as Deputadas e aos Srs. Deputados que me colocaram questões.
Sr. Deputado Telmo Correia, Os Verdes são exigentes relativamente a esta matéria, não tenha nenhuma dúvida, mas não é só, desculpe a expressão, «trinta-e-um de boca». E isto porque há Deputados que falam muito quando o Governo não está cá, e mesmo, por vezes, quando o Governo está, mas, depois, quando é para tomar medidas concretas e até posições muito veementes junto do Governo calam-se mais um bocadinho do que nós, Sr. Deputado.
Portanto, em relação a isso, acho que o Sr. Deputado não tem dúvidas mesmo nenhumas de que Os Verdes serão muito veementes. Aliás, acho que na minha intervenção até fui muito clara ao dizer que Os Verdes não concebem um pedido de reunião urgente a Espanha, a propósito de Almaraz, para ir lá dizer que estamos muito preocupados. Não, não, é para exigir os nossos próprios direitos. O que o protocolo de Madrid de 2008 nos diz é que temos o direito de participação num processo de decisório. E não podemos abdicar dele, como é evidente. É algo que o Governo português deve ter em conta para além de que, representando os interesses de Portugal e dos portugueses, há que manifestar — e deve manifestar —, de acordo com a resolução aprovada na Assembleia da República, o desejo de Portugal, que é o de que aquela central nuclear seja encerrada para segurança dos portugueses e de acordo com um princípio de responsabilidade que o Governo deve ter.
É esta a nossa postura. Não temos dúvidas nenhumas sobre isso.
Sr. Deputado Jorge Costa, acho que todos temos a responsabilidade de nos envolvermos nesta questão. Todos, Sr. Deputado: o Governo português, de acordo naturalmente com as suas responsabilidades; a Assembleia da República, que também tem tido uma intervenção muito importante nesta matéria; e todos os cidadãos portugueses e todos os autarcas, que, unidos, podem manifestar-se nos mais diversos palcos relativamente a esta questão. Isto porque a voz do povo português é, naturalmente, uma forma de pressão sobre o Governo português e sobre o Governo espanhol que acho ser extraordinariamente importante, de acordo até com os nossos direitos de participação aos mais diferentes níveis.
Sr. Deputado Bruno Coimbra, é verdade que na terça-feira tivemos aquela conversa com o Sr. Ministro e que o Sr. Ministro nos deu a novidade de que tinha pedido uma reunião urgente a Espanha. Mas, Sr. Deputado, convenhamos que, independentemente da cor dos governos que se têm alternado, dos partidos que se têm alternado no Governo, o Sr. Deputado sabe que eu tenho razão quando afirmo que tem havido uma passividade e um silêncio quase ensurdecedores quanto a esta matéria. E a força da convicção, relativamente ao encerramento da central nuclear da Almaraz e aos perigos que ela comporta para Portugal e, designadamente, para o rio Tejo, não tem sido vincada pelos diversos governos portugueses junto de Espanha, e nós julgamos que é tempo de isso acontecer. Por isso, nós, evidentemente, vamos estar vigilantes em relação ao que o Sr. Ministro do Ambiente lá vai dizer, porque ele deve explicações ao Parlamento e, por isso, tem de cá vir, depois, contar o resultado da iniciativa que tomou.
Sr.ª Deputada Luz Rosinha, só há uma garantia de que nada virá a acontecer se houver o encerramento da central nuclear de Almaraz e o seu desmantelamento. A partir daí podemos respirar de alívio.