|
29/05/2019 |
Falta de pessoal na Soflusa e para a necessidade de contratação- DAR-I-89/4ª |
|
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia - Assembleia da República, 29 de maio de 2019
1ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O não investimento, por parte de sucessivos Governos, em embarcações, para garantir o transporte fluvial de passageiros no Tejo, na ligação da margem sul a Lisboa, tem promovido a degradação deste serviço público.
Com efeito, se não se compram navios novos e se se desinveste na manutenção dos navios em circulação, que, quantos mais anos passam, mais avarias vão conhecendo, não é possível garantir o transporte necessário.
E o que se veio a verificar foi um incumprimento recorrente e progressivo, até se tornar constante, dos horários programados, com um enorme prejuízo para as populações.
Acresce a este problema a falta de pessoal, que permita, através de um horário de trabalho regular, prestar o serviço regular, designadamente mestres, maquinistas e marinheiros, que formam a equipa de navegação necessária à circulação dos navios. Não é possível assegurar o serviço normal, obrigando, por exemplo, os mestres a fazer, num ano, como aconteceu no ano passado, um total de horas extraordinárias que chegou às cerca de 4000 horas, levando estes trabalhadores a uma situação de exaustão, que, para além da sua penosa situação pessoal, pode interferir com a necessária salvaguarda da segurança dos passageiros, como é fácil de compreender.
O que acontece é que a constante supressão de horários gera atrasos inevitáveis e diários para as pessoas que estudam ou trabalham em Lisboa, havendo mesmo quem já tenha sido confrontado com a possibilidade de perder o seu emprego, caso continue essa situação. Nestas circunstâncias, as pessoas têm de recorrer à alternativa de transportes, designadamente aos autocarros da TST (Transportes Sul do Tejo), que também não abundam, e tornando-se a viagem bastante mais morosa. Outras pessoas optam por levar o seu carro individual para Lisboa, com custos muito pesados para o orçamento familiar e com custos ambientais bastante significativos para a sociedade.
Esta é, resumidamente, a história da vida diária dos milhares de utentes da Soflusa.
O Partido Ecologista «Os Verdes» já confrontou aqui, neste Plenário, o Ministro do Ambiente em relação a esta situação. A resposta do Ministro resumiu-se a dizer que a culpa é dos mestres que fazem greve às horas extraordinárias, o que levou o Partido Ecologista «Os Verdes» a retorquir que, ou o Ministro assenta bem os pés na terra, ou o problema não se resolve!
Desde logo, não se pode exigir que um serviço regular seja prestado através de horas extraordinárias.
Portanto, a necessidade de contratar pessoal é um imperativo! Depois de muita pressão, o Governo anunciou, este mês, que serão contratados mais seis marinheiros, durante o ano de 2019. Essa contratação já deveria ter sido feita, para que não se chegasse a esta situação.
Porém, ao contrário do que o Governo quer fazer crer, já houve dias em que não estava marcada qualquer greve e foi suprimido um número muito significativo de carreiras na ligação Barreiro-Lisboa e Lisboa-Barreiro, como já aconteceu, por exemplo, neste mesmo mês de maio.
O problema da falta de reparação de navios é uma questão muito séria. Tem-se descuidado muito esse aspeto, assim como o dos cais de embarque e desembarque e das instalações de apoio. Tudo foi esquecido e tudo se foi degradando, por falta de manutenção. Esse é o problema da falta de investimento público: gera a incapacidade de resposta e a inoperância dos serviços públicos.
O Governo já anunciou o lançamento do concurso público para a compra de 10 novos catamarãs para o reforço da frota da Soflusa e Transtejo, mas o primeiro só circulará a partir de 2020. Até lá, em que situação se vão manter os passageiros? Têm de ser usadas soluções de recurso, que podem, designadamente, passar pela reparação de, pelo menos, três ou quatro navios que estão acostados na doca da Lisnave e que podiam ser recuperados.
Como já referi, este défice no transporte fluvial de passageiros tem levado muitas pessoas a optar pela utilização do carro individual nos seus movimentos pendulares. Este empurrar dos utentes de transportes coletivos para o transporte individual vai completamente em contraciclo com o objetivo da descarbonização e de combate às alterações climáticas, para o qual o setor dos transportes assume um contributo significativo.
O Partido Ecologista «Os Verdes» tem trabalhado afincadamente, como será justo reconhecer, para mais e melhores transportes públicos, com vista a prosseguirmos objetivos estabelecidos para a mitigação das alterações climáticas, para a formação de zonas urbanas mais sustentáveis, para a quebra de isolamento de zonas periféricas e de interior e também para garantir o direito à mobilidade das populações.
Trabalhámos, durante toda a Legislatura, por exemplo, para a inversão da tendência de sucessivos Governos de encerramento de linhas ferroviárias e de desinvestimento em material circulante, e também num aspeto determinante para mobilizar os cidadãos para a utilização dos transportes públicos: a redução do preço dos passes. De Orçamento do Estado em Orçamento do Estado, conseguimos a dedução da totalidade do IVA dos passes sociais em sede de IRS, o fim da condição de recursos do passe 4_18 e do passe sub23, e reivindicámos sempre o passe único a preços acessíveis, questão que sempre nos disseram, durante anos e anos, que era impossível de concretizar, mas que, afinal, se prova que era mesmo possível.
O que o Partido Ecologista «Os Verdes» considera é que é mesmo com medidas e investimentos concretos, atempados e eficazes que o setor dos transportes poderá corresponder ao desígnio da mitigação da mudança climática. Podem propor-se muitas medidas simbólicas para as matérias climáticas, mas nada será mais eficaz do que a concretização das múltiplas medidas concretas, que, juntas, gerarão os resultados que importa obter.
É para esse trabalho minucioso que o Partido Ecologista «Os Verdes» continuará a contribuir.
Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, alertamos, mais uma vez, para a situação em que se encontra o transporte fluvial do Tejo e para os efeitos de «esconder o lixo para baixo do tapete». O Partido Ecologista «Os Verdes» aponta soluções. Ao Ministério do Ambiente exige-se que tenha consciência da realidade e que assuma as responsabilidades que tem de assumir.
2ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradeço as questões colocadas.
Gostava de começar por responder ao Sr. Deputado Hélder Amaral e ao Sr. Deputado Bruno Vitorino, pedindo-lhes um bocadinho de honestidade política e de seriedade naquilo que dizem.
Porque é demais, de facto.
Os Srs. Deputados percebem que isto vem do passado e que os senhores tiveram uma enormíssima responsabilidade para que isto chegasse onde chegasse. Aliás, viam-nos até a reclamar e a denunciar a questão na altura em que eram Governo. Ou não se lembram?
Faziam orelhas moucas nessa altura, certamente.
Os senhores talvez se lembrem de como alienaram um dos navios fundamentais a este transporte fluvial e fundamental para transportar os utentes em condições e para cumprir os horários. Lembram-se de que tinham um plano para a alienação de mais navios? Porquê? Porque estavam a mais? Porque não faziam falta aos utentes?
Faziam! Afinal, faziam!
Lembram-se também de que não permitiam a contratação de pessoal? Ou também não se lembram, Srs. Deputados?
A memória, pelos vistos, é curta demais! O facto de os Srs. Deputados não quererem assumir as responsabilidades diretas que tiveram para que se chegasse a esta situação é demais, Srs. Deputados! É demais!
Não vamos ficar só no passado. Vamos passar para esta Legislatura. Para esta Legislatura, foram apresentadas propostas concretas a nível do Orçamento do Estado, designadamente um reforço de 5,25 milhões de euros de verba para a manutenção da Soflusa e da Transtejo, para desbloquear a contratação de pessoal e para investir na manutenção. Qual foi a resposta do PSD e do CDS? Não votar favoravelmente a proposta.
Portanto, Srs. Deputados, têm de ser, no mínimo, coerentes!
É que a razão não pode ficar só nos discursos. Ela fica, também, na atitude, designadamente no sentido de voto em relação às propostas que aqui são apresentadas e também em relação à autoria das propostas que são apresentadas.
Sr. Deputado André Pinotes Batista, gostava de lhe dizer o seguinte: um dos grandes problemas que se tem vindo a revelar por parte do PS e do Governo do PS é que anda sempre a correr atrás do prejuízo. O que é que eu quero dizer com isto? Que não age atempadamente. Confronta-se com os problemas, deixa arrastar, arrastar, arrastar, a ver se consegue não gastar dinheiro e não agir e, depois, só quando a situação está mesmo dramática é que decide tomar alguma decisão. Foi assim, por exemplo, com o Tejo. Com a poluição do Tejo foi exatamente isso que aconteceu.
Não queria que eu dissesse aquilo que o Governo tinha anunciado? Não é nenhuma estranheza! Somos muitos sérios e leais na forma como abordamos as coisas. Não tenho problema rigorosamente nenhum com isso, como é evidente.
Mas «tarde», Sr. Deputado?! E, depois, as coisas chegam a esta situação. Mas também lhe quero dizer uma coisa: não feche os olhos! O Sr. Deputado tem consciência de que mesmo quando não há greves há supressão de horários?
Então, se tem essa consciência, não pode dizer aquilo que disse! Não tente pôr o lixo debaixo do tapete, Sr. Deputado. Tem de se assumir a realidade para depois se encontrarem soluções que possam, de facto, adequar-se a essa realidade para que os problemas se resolvam.
Sr.ª Deputada Joana Mortágua, sempre considerámos e dissemos que a questão do preço dos passes era fundamental para mobilizar as pessoas para o transporte coletivo, mas o reforço da resposta era, também, uma medida absolutamente necessária. Portanto, vamos continuar a reivindicar esse reforço de resposta, que, evidentemente, não está a ser feita na medida necessária.