|
09/11/2015 |
Heloísa Apolónia questiona Pedro Passos Coelho no âmbito da apresentação do Programa do XX Governo Constitucional |
|
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
Heloísa Apolónia questiona Pedro Passos Coelho no âmbito da apresentação do Programa do XX Governo Constitucional
- Assembleia da República, 9 de novembro de 2015 –
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria também cumprimentá-lo, assim como aos demais Membros do Governo, às Sr.as e aos Srs. Deputados.
É do conhecimento público que o Sr. Primeiro-Ministro não gosta da Constituição da República Portuguesa…e que isso se alargou também ao PSD e ao CDS.
Mas — e lamento dizê-lo —, Sr. Primeiro-Ministro, a Constituição da República Portuguesa vale mais do que a vontade do Sr. Primeiro-Ministro. E aquilo que dita a Constituição da República Portuguesa é que as eleições legislativas servem para eleger 230 Deputados para a Assembleia da República e não um Primeiro-Ministro.
A Constituição é muito clara nesta matéria: é depois, em função das eleições, do seu resultado e da sua tradução em mandatos, que se compõe o Parlamento português. Essa composição parlamentar, assim como a correlação de forças dentro da Assembleia da República, a representatividade de cada partido político,— é fundamental para tudo o resto que daqui decorre. E dentro do resto que daqui decorre inclui-se a formação de um governo.
É assim, Sr. Primeiro-Ministro, que a Constituição determina que se faça, não determina, tão pouco, que o partido que obtém mais votos é aquele que forma governo.
Não é isso que a Constituição diz; o que a Constituição diz é que é em função dos resultados eleitorais, e, portanto, tendo em conta a correlação de forças no Parlamento, que tudo o resto decorre. Foi o que eu disse, Sr. Deputado.
Então, o que é que aconteceu nestas eleições? Houve partidos, neste caso, uma coligação, em concreto, que se comprometeu perante os eleitores com a continuidade de políticas — PSD/CDS. Outras forças políticas comprometeram-se perante os eleitores com uma mudança de políticas; se o Sr. Primeiro-Ministro contar os Deputados que estão presentes na Assembleia da República vai aperceber-se de que essa coligação que se comprometeu com a continuidade perdeu a maioria absoluta no Parlamento e tem menos Deputados, hoje, do que o conjunto das forças políticas que se comprometeram com a mudança de políticas.
E se todas têm palavra é, de facto, uma mudança de políticas que se vai verificar, em Portugal. Este foi o resultado das eleições, quer o Sr. Primeiro-Ministro goste quer não.
Agora, a que é que o Sr. Primeiro-Ministro — e isto também é importante traduzir — se propõe perante os portugueses com esta continuidade?
Acho estranho que o Sr. Primeiro-Ministro continue a falar sem olhar à dureza da realidade portuguesa. O Sr. Primeiro-Ministro consegue fazer uma intervenção sem dizer que, hoje, há mais pobres em Portugal; que hoje há mais desigualdade em Portugal; que houve uma brutal emigração em Portugal; que o emprego novo que, hoje, se cria é completamente precário.
O Sr. Primeiro-Ministro recusa-se a admitir que há financiamento ao ensino privado em detrimento do investimento no ensino público e que as privatizações lesaram o País, como bem afirmou também o Tribunal de Contas.
Também na área do ambiente, a privatização foi um lema, por exemplo, na área dos resíduos, e não está clara a vossa intenção relativamente à não privatização da água.
No setor dos transportes, tão fundamental para o combate às alterações climáticas, a vossa intenção é só privatização — olhe-se para aquilo que construíram neste Programa do Governo!
Os senhores querem inundar o País de eucaliptos. É assim que querem proteger a nossa floresta? Não se ria, Sr. Primeiro-Ministro, porque essa foi a legislação que ditaram para o País, no anterior mandato.
Os senhores falam de crescimento económico sem dizer que esse crescimento económico é ilusório relativamente àquilo que o Sr. Primeiro-Ministro diz, porque ele decorre fundamentalmente da baixa do preço do petróleo e, portanto, tem em conta fatores externos e não a mobilização do País para esse crescimento económico.
Os senhores delapidaram a Administração Pública de recursos humanos e, por isso, fragilizaram os serviços públicos prestados aos portugueses.
É esta a continuidade do modelo que os senhores se propõem praticar, em Portugal, através da continuação das vossas políticas. Mas foi a isto, Sr. Primeiro-Ministro, que os portugueses disseram que não querem, porque vos retiraram a maioria absoluta e, portanto, disseram «não» a esta continuidade, disseram: «nós não queremos mais estas políticas!
Essa leitura tem de ser feita, Sr. Primeiro-Ministro.
Então, termino mesmo, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: acho de um grande desplante que o Sr. Primeiro-Ministro venha ao Parlamento dizer que os Programas do Governo têm de ser ipsis verbis os programas eleitorais, quando o seu, de 2011, não foi, quando este, que aqui hoje vem apresentar, não é, e, fundamentalmente, quando nas anteriores eleições, em 2011, na anterior campanha eleitoral, o Sr. Primeiro-Ministro prometeu aos portugueses, já conhecendo o texto do programa da troica, que não aumentaria impostos e não cortaria salários mas, chegado ao Governo, fez exatamente o seu contrário.
A palavra vale ou não, Sr. Primeiro-Ministro?