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23/02/2016 |
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia sobre o Orçamento de Estado para 2016 |
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O voto contra que quer o PSD quer o CDS já anunciaram a este Orçamento de Estado para 2016 é bem demonstrativo que estamos perante um orçamento que contém opções de mudança. Se fosse um orçamento de continuidade, aceitá-lo-iam. E nós rejeitá-lo-íamos. Não há dúvida, portanto, que se trata de um orçamento que faz opções políticas diferentes. A reclamação de mudança que os portugueses expressaram nas últimas legislativas, atribuindo a maioria dos deputados na Assembleia da República às forças políticas que se comprometeram com mudança, tem, pois, comprovadamente tradução neste orçamento.
A verdade é que caso estivéssemos aqui, hoje, a discutir um orçamento do PSD e do CDS, estaríamos perante um documento onde continuaria a sobretaxa do IRS, continuariam os cortes salariais, continuariam congelamentos das pensões, continuariam os cortes nos apoios e prestações sociais, acresceria um corte de 600 milhões de euros na segurança social, continuariam os despedimentos na administração pública, por via da requalificação, piorando os atendimentos e a eficácia dos serviços públicos, continuaria o IVA da restauração a 23%, continuariam os valores das taxas moderadoras, continuaria o IMI a disparar sem clausula de salvaguarda… Em suma, continuaria o mesmo peso estrangulador para as famílias portuguesas, para as quais o PSD e CDS ditaram que se conformassem a um determinado nível de empobrecimento, tendo o anterior Governo chegado mesmo a referir que, ao nível dos rendimentos, nada já poderia ser como antes.
O mais revoltante é que diziam que não havia margem para alterar o estrangulamento social que impunham, mas havia sempre margem para baixar o IRC para as grandes empresas, havia margem para acabar com a contribuição do setor energético, havia margem para fazer favores à banca também por via do IMI. Para estes havia sempre margem.
Esta comparação entre aquele que se sabe que seria o orçamento de um Governo PSD/CDS e este orçamento do Governo PS sujeito a posições conjuntas assinadas com três partidos com representação parlamentar, entre os quais o PEV, é importante, porque nos permite perceber do que nos livrámos e permite ganhar uma perceção clara do que está a mudar.
E a verdade é que estamos perante um orçamento de Estado que, para usar os exemplos que dei anteriormente, põe termo à sobretaxa do IRS, devolve os salários, descongela o aumento de pensões, reforça os apoios e as prestações sociais (nomeadamente complemento solidário para idosos, rendimento social de inserção, abono de família), reduz as restrições à contratação na administração pública, baixa o IVA da restauração para 13% na maioria dos produtos, reduz as taxas moderadoras, não baixa o IRC para as grandes empresas, introduz a cláusula de salvaguarda do IMI e não isenta deste imposto os fundos imobiliários, nem acaba com a contribuição do setor energético.
Daqui resulta uma maior capacidade do país para inverter a lógica de empobrecimento, para combater o alargamento da bolsa de pobreza, para dinamizar a economia e para garantir direitos aos portugueses.
Poderão perguntar-nos: mas era este o orçamento que os Verdes construiriam? Não, não era. Um orçamento construído pelo PEV teria um outro olhar sobre investimento público fundamental, nomeadamente no ambiente, nos transportes, na educação, na saúde, na cultura e também um outro olhar sobre uma mais justa tributação entre o capital e os rendimentos.
Mas também é preciso que se diga que este não é um orçamento que o PS construiria sozinho, caso estivesse com uma maioria absoluta, porque o passado bem o demonstrou e a verdade é que as posições conjuntas assinadas com outros partidos, entre os quais o PEV, tiveram o mérito de puxar as políticas do Governo PS para medidas mais justas e muito emergentes, que o país precisa como que de pão para a boca.
No âmbito da discussão na especialidade deste orçamento de Estado, não perderemos de vista, o facto de estarmos confrontados com o desafio, que o planeta nos reclama, de adaptar os nossos estilos de vida à redução de emissões de gases com efeito de estufa.
Daremos, por isso, uma atenção muito particular a matérias como a mobilidade de passageiros, quer pelas alternativas de mobilidade suave quer do transporte coletivo. Mas não é o aumento do ISP que o vai conseguir, porque o Governo PSD/CDS tributou mais os combustíveis (embora falem como se nunca se tivessem lembrado disso), numa altura em que retiravam rendimentos às famílias e em que o preço do petróleo era bem mais elevado, e esse fator não teve resultado na diminuição do transporte individual. O que gerou diminuição do uso do transporte individual, e, já agora, também a diminuição de passageiros em transporte coletivo, foi a escalada do desemprego e da emigração fabricados pelo PSD e CDS, que dispensaram as pessoas de realizarem os seus movimentos pendulares. E essa não é evidentemente receita que se deseje repetir! É bem verdade que agora o aumento do ISP que o Governo PS propõe aparece num quadro de reposição de rendimentos e em que o preço do petróleo está muito mais baixo. Porém, se o investimento e o incentivo ao transporte coletivo não aparecerem, não se estará a trabalhar para uma mobilidade alternativa, mas apenas para arrecadação de receita.
Há outras matérias às quais o PEV dará uma atenção particular, nomeadamente a conservação da natureza e a capacidade de garantir maior preservação de ecossistemas fundamentais à promoção da qualidade de vida e da produção sustentável no país, não apenas tendo em vista maior valorização das nossas áreas protegidas, mas também de outros patrimónios tão fundamentais como os nossos rios, flagelados por inúmeras barragens e por descargas poluidoras, e da nossa floresta, flagelada pela expansão do eucalipto. O estabelecimento de regras, a fiscalização e a monitorização não são dispensáveis para o cumprimento de objetivos nestes âmbitos.
O paradigma das políticas ambientais e sociais tem que mudar. Os Verdes trabalharão para que as opções de investimento e a dinâmica económica sejam, instrumentos para gerar melhores condições ambientais e sociais em Portugal.