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Comunicados 2014
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25/04/2014
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira na Sessão solene do 25 de Abril - 2014

Passados 40 anos sobre aquela límpida madrugada de sol e esperança com chuva de cravos e de sonhos, que imprimiu cor, liberdade, democracia e paz aos dias que lhe seguiram, que nos trouxe tanta e tanta coisa, falamos hoje de Abril. Porque Abril é o dia de que é preciso falar, todos os meses, todos os dias, mas hoje mais do que nunca.

Falar de Abril sem amarras e sem permitir que a mentira lhe roube a luz, a alegria inicial e o sonho de um povo que, 40 anos depois, continua a aspirar por um país capaz de se reencontrar com os valores que nessa madrugada, foram convocados para fazer parte do nosso destino coletivo.

Falar dessa madrugada é falar dos Capitães de Abril que, com uma determinação singular e de forma absolutamente elevada, foram capazes de dar corpo ao sentir de um povo inteiro.

Mas é também falar da resistência, do inconformismo e da coragem de tantos homens e mulheres que, partilhando causas e valores que consideravam justos, lutaram durante anos por esse dia de sol e de esperança e de chuva de cravos e de sonhos.

Por isso, em nome do Partido Ecologista “Os Verdes” gostaria de saudar os Capitães de Abril e os homens e mulheres que lutaram por um país livre, capaz de promover a paz e a justiça social.

Srª. Presidente,
Srsªs e Senhores Deputados,

Falar de Abril é falar de uma jornada. Uma jornada que enterrou definitivamente uma ditadura ao mesmo tempo que nos abriu as portas para um mar de possibilidades. Abril deixou pra trás a censura, a perseguição, as prisões politicas, a tortura, a guerra e o “Adeus até ao meu regresso”.

Pra trás ficou um País a preto e branco, cinzento, descalço, onde a mortalidade infantil imperava e o analfabetismo era moda. Onde o ensino era só para os ricos, o tal ensino de que alguns têm hoje saudades. Saudades do tempo em que se batia e humilhavam as crianças e os jovens e que mantinha o ensino ao nível da propaganda fascista, onde a régua e a cana-da-índia eram instrumentos de trabalho como o ponteiro, a lousa ou o quadro.

Tudo isso e muito mais, Abril remeteu definitivamente para os arquivos da nossa história.

Mas hoje, 40 anos depois, ainda que nos digam que são provisórios, sentimos indícios, do ressuscitar de situações que pensávamos que Abril havia resolvido.

A saúde comprava-se e a pobreza ganhava contornos de generalidade. A fome espreitava as casas e instalava-se até á mesa de muitas famílias portuguesas. A reforma era um caminho que obrigava os idosos a percorrerem as ruas de mão estendida. O trabalho não era um direito, mas um favor dos patrões. E, infelizmente, qualquer semelhança com o que vemos hoje, não é apenas pura coincidência.

Na verdade, Abril promoveu uma substancial melhoria nas condições de vida das pessoas. Representou um impulso no progresso social sem precedentes na nossa história. O pensar deixou de ser crime. Conquistamos importantes direitos políticos e sociais, que constituem hoje um valioso património da nossa democracia, de que é exemplo:

A institucionalização do SMN;
A generalização do 13º mês;
O direito a férias e respetivo subsidia;
A democratização do ensino;
A Universalização do direito á segurança social e á saúde;
A generalização das pensões de reforma e do subsídio de desemprego.
E sobretudo ganhamos o direito a sonhar com um futuro melhor.
O sonho de um país livre, com justiça social, pautado por um desenvolvimento sustentável e de preservação dos recursos naturais.
40 anos depois de 74, Portugal é um País melhor, sem dúvida, mas o percurso de lá até aqui, com particular enfoque nos últimos 3 anos, deixam-nos fortes motivos de preocupação.
Abril está a perder força. A procura da justiça social está a ser descaradamente abandonada e o Estado Social está a ser intencionalmente destruído. A fome espreita já em muitos lares portugueses.
E se em cada esquina tínhamos um amigo, agora em cada esquina temos duas pessoas sem trabalho.
Volta assim a ganhar cada vez mais atualidade a música do Sérgio quando nos diz: “somos tantos a não ter quase nada, porque há uns poucos que têm quase tudo”.
Mas isto nada tem a ver com Abril, pelo contrário, tem a ver com as opções dos vários Governos dos últimos 38 anos, que intencionalmente ou não se foram afastando dos ideias de Abril.

Aos poucos acabaram por vender a nossa produção, destruíram a nossa economia e empobreceram os portugueses. O resultado das políticas desses Governos, sobretudo do atual Governo PSD/CDS, está à vista:

O desemprego atinge números nunca vistos.
Metade das pessoas desempregadas não tem acesso a qualquer apoio social.
Transformam o Direito ao trabalho num favor da entidade patronal.
Cortam nas prestações sociais.
Cortam nos salários e nas pensões.
Impõem um brutal aumento de impostos
A justiça é só para alguns.
A saúde passou a ser um luxo e o transporte de doentes uma miragem.
A educação só para quem tem capacidade económica.
Transformam os jovens licenciados em emigrantes.
Transformam Empresas do Estado que dão lucro, em negócios chorudos para o sector privado.
Transformam cidadãos com direitos em clientes com necessidades que se satisfazem no mercado.
Agravam as problemáticas ambientais;
Deixam a nossa costa à merce do clima e da agitação marítima.
Procuram mercantilizar recursos fundamentais à vida como a água;
Privatizam a EGF, deixando fora do controlo democrático o setor dos resíduos que é um sector estratégico e fundamental para o País, para a Saúde, para a qualidade de vida das pessoas e para o equilíbrio ambiental.
Um grupo rentável, com lucros acumulados nos últimos três anos na ordem dos 62 milhões de euros. Um verdadeiro monopólio natural.
A remoção do amianto não passa de um manto de promessas vãs.
Transformam a política de conservação da natureza numa oportunidade de negócio;
Levam os baldios aos compartes.
Extinguem freguesias e desrespeitam a autonomia do Poder Local.
E já que não multiplicam o pão, multiplicam a pobreza, que atinge hoje níveis nunca vistos depois da revolução.
A pobreza não para de aumentar, como não para de crescer a injustiça na distribuição da riqueza.
Mais de 40% dos desempregados e 11% dos empregados são pobres e o risco de pobreza entre os menores de 18 anos é de 24%.
Aumenta o fosso entre os mais ricos e os mais pobres.
Dois milhões e meio de portugueses em risco de pobreza: em virtude do desemprego, dos salários baixos, da carga fiscal e dos cortes nas pensões.
Hoje, em Portugal, empobrecesse a trabalhar.
Do outro lado, estão os milionários, que apenas num ano, aumentaram as suas fortunas em 17%.
Ficam alguns exemplos dos lucros das grandes empresas no ano de 2013:
Portucel: 210 milhões de euros.
GALP: 310 milhões de euros.
SONAE: 319 milhões de euros.
Jerónimo Martins: 382 milhões de euros.
BES: 517 milhões de euros.
EDP: 1005 milhões de euros.
Recorde-se que estamos a falar dos lucros de 2013, um ano de crise para a generalidade dos portugueses e quanto a 2014 ainda vão beneficiar da baixa do IRC que o Governo concedeu às empresas.

De facto, a arrogância do poder financeiro que condena à pobreza e à exclusão social grande parte da população portuguesa, traz-nos à memória os “Vampiros” do Zeca: “Eles comem tudo e não deixam nada”.

No meio de todas estas injustiças, os catequistas da austeridade, do empobrecimento, dos cortes e dos ajustamentos, falam de sinais positivos, do milagre económico, de previsões otimistas, do crescimento económico, mas com tanta conversa, a verdade é que os portugueses continuam a empobrecer.

O que é verdade é que a austeridade está a encurtar a vida dos mais velhos e a forçar a emigração dos mais novos. A aumentar o horário de trabalho e a colocar as pessoas a trabalhar mais anos e a receber menos da reforma. Com tanta austeridade e com tantos sacrifícios é oportuno perguntar o que é feito do dinheiro?


Aqui fica uma ajuda:
12 mil milhões foram para a banca.
7.300 milhões são pagos em juros da divida por ano.
1.045 milhões são concedidos em benefícios fiscais, só em 2013.
850 milhões são para pagar os encargos com as PPP
1.008 milhões em contratos swap’s.
7.000 milhões para o BPN e mais uns milhões para os submarinos.

Abril transformou o País para melhor. Muito melhor. Uma mudança estrutural e material. E se hoje estamos como estamos, devemo-lo às políticas dos Governos, que nestes 38 anos foram muitos, é verdade, mas partidos foram só três. O poder dos mercados não pode estar acima do poder do estado. Os mercados estão a tentar expulsar o estado da economia e a mercantilizar o Estado Social e os Governos têm vindo a permiti-lo.

Abril nada tem a ver com isto e, portanto, é justo que os portugueses penalizem em futuros atos eleitorais os partidos responsáveis pela situação. E já que o Governo não muda as politicas, os portugueses deveriam ter oportunidade de mudar de Governo.

40 anos depois é altura dos portugueses exigirem o reencontro com os valores de Abril e exigirem um Governo que respeite a Constituição.

Viva o 25 de Abril!


 

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