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11/04/2019 |
Necessidade de alternativas à disponibilização de sacos de plástico ultraleves e de cuvetes em plásticos nos pontos de venda de pão, frutas e legumes - DAR-I-74/4ª |
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Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No final do debate sobre uma matéria tão importante como é a necessidade de criar mecanismos para nos irmos libertando da dependência do plástico, a primeira nota que Os Verdes pretendem registar diz respeito ao reconhecimento, por parte de todas as bancadas, da gravidade do problema, o que vem reforçar a importância e a oportunidade da iniciativa que Os Verdes hoje trouxeram para discussão. E ainda bem que assim é, porque o cenário é muito negro.
Na União Europeia, produzem-se cerca de 58 milhões de toneladas de plástico por ano, sendo que Portugal apresenta uma média de 31 kg por pessoa, o que, como se percebe, corresponde a um valor superior à média europeia.
De facto, aos poucos, o uso do plástico acabou por se impor e fazer parte integrante do nosso dia a dia. A sua natureza versátil, a sua durabilidade, resistência, maleabilidade e, sobretudo, o baixo custo da sua produção transformaram o plástico num material utilizado em larga escala para os mais variados fins.
Mas, como «não há bela sem senão», também no que diz respeito ao plástico é preciso olhar atentamente para o outro lado, ou seja, para as consequências da utilização em larga escala, de tanto facilitismo e de tantas vantagens.
Ora, como todos sabemos, o plástico tornou-se um problema ambiental muito sério, contaminando, designadamente, os nossos mares, com repercussões graves, nomeadamente para a fauna marinha.
As notícias sobre as consequências da utilização do plástico, que são frequentes e com uma regularidade assustadora, vão-nos dando nota de situações que deveriam ser impensáveis: aves marinhas, baleias, tartarugas e outras espécies são encontradas com o estômago literalmente repleto de plástico.
De facto, esta ameaça incide sobre as mais diversas espécies marinhas e, através da cadeia alimentar, o consumo indireto do plástico chega facilmente a outras espécies e também ao ser humano.
Com efeito, involuntariamente, com desconhecimento e sem dar por isso, a verdade é que os consumidores de peixe acabam por correr o sério risco de ingerir plástico, o que, para além da dimensão ambiental geral, tem uma incidência sobre a saúde humana e a sobrevivência de outros seres. Ou seja, quando falamos dos perigos da utilização do plástico, não falamos apenas da sua dimensão ambiental; falamos, também, da sua dimensão em termos de saúde.
Na verdade, os plásticos podem constituir elementos tóxicos para os organismos vivos ou para os ecossistemas e, mesmo se não o forem, constituem elementos estranhos que vão alterando gradualmente a composição desses mesmos ecossistemas.
Uma vez lançados em meio livre, os plásticos, através da ação dos agentes ambientais, vão-se dividindo em microplásticos que entram na cadeia alimentar, com consequências para muitas espécies, incluindo o ser humano.
Tornou-se, aliás, comum falar-se do grave problema da contaminação dos oceanos por plásticos e na entrada, cada vez mais frequente, de microplásticos nas estruturas de organismos vivos, que facilmente chegam, também, a produtos alimentares para consumo humano.
Estudos recentes não deixam dúvidas quanto à presença de microplásticos no sal utilizado para cozinha, inclusivamente em marcas portuguesas.
Mas mais: os estudos reportam, ainda, que, para além do sal, estes componentes já foram detetados noutros alimentos, como o peixe, o marisco e mesmo o mel ou a cerveja.
Diz quem sabe que cerca de 85% da poluição marinha resulta do lançamento do plástico em meio livre e o mais grave é que em 2050, se nada for feito para inverter este cenário, é muito provável que os nossos mares venham a ter mais plástico do que peixe.
Falamos, portanto, de uma realidade verdadeiramente assustadora que nos impõe a responsabilidade de agir com urgência, no sentido de prevenir a entrada de novos resíduos de plástico nos rios, nos estuários e nos oceanos.
Como é público, Os Verdes têm ao longo dos anos apresentado diversas iniciativas legislativas visando, sobretudo, a redução da utilização de embalagens e a redução da utilização de plástico e esta iniciativa legislativa é, assim, mais um contributo, mais uma proposta que Os Verdes apresentam com vista à redução da utilização do plástico.
A verdade é que os estabelecimentos comerciais continuam a ser um centro de consumo e de acumulação do plástico. Por falta de alternativas, os consumidores são muitas vezes obrigados a trazer consigo um conjunto significativo de plásticos, ainda por cima descartáveis, do qual não têm necessidade e que nem sequer reutilizarão.
Assim acontece, por exemplo, na seção de frutas e legumes onde são disponibilizados sacos ultraleves como embalagem primária de produtos vendidos a granel. O mesmo acontece com o agrupamento ou acondicionamento de frutas e legumes em esferovite e revestidos a película aderente plástica convencional, frequentemente usada em cozinha.
Ora, estas embalagens têm apenas a função de acondicionamento ou agrupamento dos produtos alimentares e nada têm a ver com a preservação da qualidade dos produtos, os quais são, de resto, também, muitas vezes vendidos a granel.
Esta realidade pode e deve ser diferente e é nesse sentido, e com esse propósito, que Os Verdes trouxeram hoje para discussão a sua proposta, o seu contributo, com a convicção de que a oferta de mercado é determinante para atingir objetivos mais sustentáveis e que as opções dos consumidores, sendo importantes, não são suficientes na medida em que os consumidores, muitas vezes, acabam mesmo por não ter opção.
Propomos, assim, que os estabelecimentos comerciais fiquem impedidos de disponibilizar sacos de plástico ultraleves para embalamento primário ou transporte de pão, frutas e legumes e de vender frutas e legumes acondicionados em cuvetes descartáveis que contenham plástico ou em esferovite.
Desta forma, devem os agentes distribuidores disponibilizar ao consumidor alternativas de embalagem primária para pão, frutas e legumes, vendidos a granel nos pontos de venda, compostos por outros materiais mais sustentáveis.
Por outro lado, e simultaneamente, os estabelecimentos comerciais devem adaptar-se aos consumidores que pretendam levar os seus sacos próprios para acondicionar as frutas e legumes vendidos a granel ou o pão que compram.
Para além disso, Os Verdes propõem, ainda, que o Governo promova campanhas de sensibilização dos consumidores para o uso de sacos próprios não descartáveis nos atos de compra de pão, frutas e legumes, bem como ações de sensibilização dirigidas aos responsáveis pelos estabelecimentos comerciais, para que estes se adaptem ao uso de sacos próprios, não descartáveis, por parte dos consumidores.
Com esta proposta, Os Verdes fazem a sua parte e dão o seu contributo no sentido de travar esta verdadeira praga que tomou conta do nosso dia a dia.
No âmbito desta discussão, convém também não perder de vista o alcance que esta proposta representa no que diz respeito à política dos três R em matéria de resíduos.
Como sabemos, os três R não são aleatórios, obedecem a critérios em termos de hierarquia e em termos de prioridade e o primeiro R, que diz respeito à redução, impõe-se sobre os restantes, o que significa que a reutilização e a reciclagem vêm depois em termos de prioridades.
De facto, a não produção de um resíduo é a todos os níveis e a todos os títulos mais sustentável do que a sua produção, mesmo que o seu destino seja a reutilização ou a sua reciclagem, e esta proposta incide exatamente no primeiro R, isto é, no R da redução dos resíduos.
Quanto às reservas daqueles que encontram dificuldades neste combate, na proposta que Os Verdes hoje trazem para discussão, porque será um problema para o mercado, porque não há alternativas, deixo um exemplo: quando a Assembleia aprovou há uns anos, e por proposta de Os Verdes, uma resolução para que a Assembleia da República passasse a usar exclusivamente papel reciclado, também era uma chatice porque o papel era mais húmido e as impressoras e fotocopiadoras encravavam constantemente com o papel reciclado.
«O mercado não estava preparado», diziam alguns.
A verdade é que, dois dias depois dessa decisão, já as máquinas estavam preparadas e devidamente calibradas para receber o papel reciclado e sem quaisquer problemas, como, de resto, hoje podemos constatar.
É que a procura também é decisiva nas regras do mercado e nos modos de produção e é isso que se pretende com esta iniciativa legislativa.
Para além disso, Os Verdes reafirmam total disponibilidade para, em sede de especialidade, poder acolher contributos das restantes bancadas, de forma a melhorar o conteúdo desta proposta, desde que, naturalmente, não se desvirtue o seu objeto central.
Assim, quando, de seguida, procedermos à votação do projeto de lei de Os Verdes, que acabámos de discutir, cada bancada assumirá as suas responsabilidades e, por aquilo que se pôde perceber durante o debate, estarão em sintonia com o combate que a todos deve mobilizar.
Nós, Os Verdes, fizemos a nossa parte, pelos oceanos, pelos ecossistemas, pelo ambiente, mas também pela nossa saúde.