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15/02/2018 |
Os Verdes continuam muito preocupados com o projeto de exploração de urânio em Retortillo (Salamanca), junto à fronteira portuguesa |
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A Deputada Heloísa Apolónia, do Grupo Parlamentar Os Verdes, entregou na Assembleia da República uma pergunta em que questiona o Governo, através do Ministério do Ambiente, sobre os impactes ambientais transfronteiriços do complexo mineiro radioativo, de urânio, previsto para Retortillo-Santidad, província de Salamanca.
Para além da pergunta ao Ministério do Ambiente, Os Verdes pretendem agendar na próxima Conferência de Líderes da AR, na terça-feira, dia 20 de fevereiro, o seu Projeto de Resolução n.º 911 /XIII-2ª que Recomenda Ao Governo que desenvolva todos os esforços junto do Estado Espanhol para travar a exploração de Urânio em Salamanca, junto à nossa fronteira.
Pergunta:
A extração e a exploração mineira de urânio é uma atividade de elevado risco, dado o potencial radioativo deste minério. Uma atividade com forte impacte ambiental e na saúde pública, com consequências que perduram por demasiados anos. De difícil controlo, a dispersão da radioatividade subjacente aumenta, substancialmente, com a remoção do minério de urânio do subsolo e consequente exposição à superfície.
Os produtos derivados do radão, com elevada radioatividade, são suscetíveis de serem facilmente libertados na atmosfera, misturando-se com as partículas sólidas, e de serem transportados a longas distâncias, entrando facilmente no sistema respiratório. Estas partículas têm ainda a particularidade de se depositarem nos ecossistemas e, por conseguinte, entrarem na cadeia alimentar, nomeadamente humana, aumentando o risco de contaminação e de doença grave.
Em Portugal a exploração de urânio, com grande expressão nos distritos de Viseu, Guarda e Coimbra, foi abandonada na viragem do século, por várias razões, nomeadamente pela forte pressão das populações, movimentos e partidos devido aos perigos inerentes.
O avançar do processo de implementação de uma exploração mineira de urânio, iniciado em 2011, por parte da empresa Berkeley Minera España SA, a cerca de 30km da fronteira portuguesa em Retortillo (Salamanca) constitui um grande risco para o nosso país, em particular para os municípios raianos de Freixo de Espada à Cinta, Figueira de Castelo Rodrigo e de Almeida e para os territórios banhados pelo rio Douro, pois este complexo mineiro insere-se na sua bacia hidrográfica.
O complexo integrará uma mina a céu aberto, a única da Europa, uma unidade de reprocessamento de urânio e de um cemitério de resíduos radioativos procedentes dessa mesma unidade que receberá urânio de outras minas, cujo mineral se processará e enriquecerá em Retortillo-Santidad, uma das quais prevista para La Alameda de Gardon, a cerca de oito quilómetros da Fronteira (Almeida).
Este problema tem merecido grande preocupação por parte do Partido Ecologista Os Verdes que tem lutado contra o avançar desta exploração de urânio e alertado a população e autarquias para os impactos que poderão advir para o nosso território com a implementação desta exploração de urânio.
Em 2013, o PEV questionou o governo português, através da pergunta n.º 2303/XII/2ª - Projeto de exploração de urânio em Espanha, junto à fronteira portuguesa, sobre a informação e conhecimento de que dispunha face aos projetos de mineração na província de Salamanca.
Em março de 2014, Os Verdes, conjuntamente com o partido congénere espanhol EQUO, reuniram com a população afetada pelo projeto e com ambientalistas de Espanha, em Villavieja de Yeltes (Salamanca) ouvindo as suas preocupações e alertas face aos impactos transversais aos dois países tendo apresentado também, em conjunto com a EQUO uma queixa à Comissão Europeia por infração e pela má aplicação da normativa comunitária em matéria da Declaração de Impacte Ambiental que foi emitida favoravelmente. A queixa que insidia em três vertentes: impactes ambientais pois a localização está prevista para área da Rede Natura 2000, pelo fracionamento do projeto, pois não foi integrada toda a exploração na Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) e pelo facto de não ter tido em conta os efeitos transfronteiriços desde projecto a céu aberto. Portugal não foi envolvido no processo de AIA.
No final de 2015, Os Verdes, após reunirem nas Cortes de Castilla y Leon, em Valladolid com o deputado José Sarrión, eleito no Parlamento da Comunidade Autónoma de Castilha e Leão e com a Plataforma Stop Urânio, para abordar os impactos ambientais e de saúde pública transfronteiriços voltaram a questionar o Ministério do Ambiente, através da pergunta n.º 151/XIII/1ª de 22 de dezembro sobre o grau de conhecimento e acompanhamento deste projeto de exploração e processamento de urânio por parte do Governo.
Na resposta foi percetível que existia um desconhecimento profundo do projeto por parte das autoridades portuguesas, pese embora já tivesse sido emitida a DIA favoravelmente e Os Verdes já tivessem alertado para esta exploração de urânio junto à fronteira.
Tendo o Ministério do Ambiente manifestado intenção de obter mais informações por parte do governo espanhol, em Junho de 2016, o Partido Ecologista Os Verdes pediu novos esclarecimentos, através da pergunta 3779/XIII/2ª. Na respetiva resposta, em setembro de 2016, o Governo referiu que:
- A Agência Portuguesa do Ambiente (APA), face à informação provinda de Espanha, considera que a exploração mineira de urânio em Retortillo-Santidad poderá ser “suscetível de ter efeitos ambientais significativos em Portugal, face: à distância da fronteira portuguesa atendendo à direção dos ventos (a qual é, com alguma regularidade, dos quadrantes E/NE); e, ressaltando com maior relevo, o facto do rio Yeltes (que divide a exploração mineira em duas zonas) ser um afluente do Rio Huebra, que desagua no troço internacional do Rio Douro (a jusante da barragem de Saucelle), considerando a importância do Rio Douro na disponibilização de água para o abastecimento público de aproximadamente 2 milhões de pessoas e para a rega de todo o Douro Vinhateiro.”
- Na sequência de diligências efetuadas junto das autoridades espanholas para a clarificação da situação dos efeitos do projeto em Retortillo-Santidad, a Junta de Castela e Leão “comunicou que considerou não ser necessário realizar consultas transfronteiriças, atendendo à distância da exploração mineira da fronteira com Portugal, tendo já sido concluído o respetivo procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental, com a emissão da correspondente Declaração de Impacte Ambiental (DIA).”
- “A possível participação do Governo da República Portuguesa poderá ser realizada, neste caso, quanto aos procedimentos ainda em tramitação, ou seja, autorização da construção da fábrica de instalação, uma vez que já terminou o processo relativamente à concessão da licença de exploração realizada pela Junta de Castela e Leão.”
- O projeto de exploração mineira de urânio é suscetível de causar efeitos ambientais significativos no nosso país, foi transmitido pelo governo português a Espanha que teriam de ser cumpridos os trâmites previstos no “Protocolo de atuação entre o Governo da República Portuguesa e o Governo do Reino de Espanha sobre a aplicação às avaliações ambientais de planos, programas e projetos com efeitos transfronteiriços”.
- De acordo com o Protocolo foi solicitado ao governo espanhol mais informação sobre este projeto de exploração de urânio, assim como a DIA, já emitida, para desencadear um procedimento de participação pública em Portugal, transmitindo os resultados ao Governo de Espanha, para que sejam tidos em conta na autorização de construção da instalação.
Mediante os riscos que este complexo mineiro de urânio pode representar para a qualidade das águas do Douro, por contaminação radiológica, por metais pesados e produtos derivados do tratamento do minério, assim como risco para a qualidade do ar nas áreas junto à fronteira, nomeadamente de partículas radioativas e contendo metais pesados, Os Verdes desencadearam em 2016 e 2017 um conjunto de iniciativas junto das populações, nomeadamente na Guarda e em Figueira de Castelo Rodrigo, e reuniões com os municípios raianos de Almeida e Freixo de Espada à Cinta, com o objetivo de os sensibilizar para a problemática em causa assim como auscultar do seu envolvimento ou não em todo este processo de licenciamento. Os Verdes fizeram ainda uma clara exposição da situação à Comunidade Intermunicipal do Douro (CIM Douro) alertando os autarcas para os impactos desta exploração de urânio na região e para a necessidade do seu envolvimento e oposição ao projeto em causa.
Tendo em consideração: (i) que de forma transversal por parte da população e autarquias, existe uma preocupação acrescida sobre o perigo que representa para os seus territórios e saúde, a entrada em funcionamento desta exploração; (ii) o avançar desta exploração de urânio no terreno, nomeadamente com o abate de árvores e grandes mobilizações de terras, tendo em vista implementação da unidade de processamento de urânio; (iii) que o governo português em setembro de 2016 referiu que foi solicitado ao governo espanhol mais informações, nomeadamente a DIA, para desencadear um procedimento de participação pública em Portugal, para que sejam tidos em conta na autorização de construção da instalação, o Partido Ecologista Os Verdes voltou a questionar o Ministério do Ambiente em março de 2017, com a pergunta n.º 3779/XIII/2ª, contudo, até ao momento, ainda não obteve qualquer resposta.
Neste sentido, Os Verdes voltam a questionar o governo pois urge desde logo esclarecer as populações, em particular as que poderão ser afetadas diretamente e permitir que estas se possam pronunciar em consulta pública sobre os impactos deste projeto nos seus territórios.
Este processo é em tudo similar ao que motivou uma queixa de Portugal à Comissão Europeia, relacionada com a decisão espanhola de construir um armazém temporário de resíduos nucleares na Central Nuclear de Almaraz, sem avaliar o impacte ambiental transfronteiriço, pois a legislação comunitária obriga os Estados-Membro da EU a consultarem os vizinhos sempre que estejam em causa decisões com efeitos transfronteiriços.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, solicito ao S. Exª O Presidente da Assembleia da República que remeta ao Governo a seguinte Pergunta, para que o Ministério do Ambiente me possa prestar os seguintes esclarecimentos:
1- Já terá o Governo português obtido, por parte do Governo de Espanha, e ao abrigo do Protocolo entre ambos os estados nesta matéria, a informação solicitada sobre os efeitos transfronteiriços do projeto de Exploração de Urânio em Retortillo-Santidad?
2- Em caso afirmativo, para quando prevê o Governo desencadear um procedimento de participação pública em Portugal, para que os portugueses em geral e as populações transfronteiriças e seus representantes em particular, possam expressar as suas preocupações, e que estas sejam tidas em conta pelo Governo de Espanha na autorização de construção da instalação?
3- Já tem esse Ministério, a informação necessária para que se possa pronunciar de forma pormenorizada sobre os impactes ambientais que poderão advir para o nosso país com o projeto de Retortillo-Santidad?
3.1- Se sim, qual o parecer do Governo Português relativamente a esta exploração de urânio a céu aberto?
4- Estando previsto neste projeto de reprocessamento em Retortillo-Santidad a utilização de ácido sulfúrico para dissolver o minério de urânio, serão as medidas adotadas suficientes para evitar ainda mais estes riscos de contaminação resultantes, para além da contaminação radiológica e por metais pesados para as águas do rio Douro, demasiado elevados e imprevisíveis?
5 – Não considera o Governo esta uma questão em tudo semelhante à que motivou a queixa à Comissão Europeia, relativamente ao Armazém Temporário de Resíduos Radioativos de Almaraz? Não deverá esta situação ter um tratamento semelhante?