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14/03/2019
PROJETO DE LEI N.º 1168/XIII/4.ª - Expansão da garantia dada aos consumidores para os bens móveis e imóveis (Alteração ao Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de abril e ao Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de maio)
A prevenção tem sido uma etapa bastante secundarizada nas políticas de gestão de resíduos, e por norma, quando são apresentadas medidas, estas sustentam-se na penalização do consumidor.

Sucede que a garantia de melhores desempenhos ambientais não deve ser imputada apenas ao cidadão, mas sim para uma consciencialização global da importância de contribuir para o bem comum (e, portanto, também individual), para uma maior sustentabilidade e de modo a mitigar as alterações climáticas em curso, nomeadamente no que diz respeito à oferta que é disponibilizada aos cidadãos nos locais onde procedem aos seus atos de aquisição de bens, enquanto consumidores.

Vivemos numa sociedade do consumismo fácil e muitas vezes descartável, que gera resíduos, designadamente de embalagens, mas também produtos em fim de vida, em quantidades insustentáveis. A redução é, como sabemos, um patamar que condicionará depois todos os restantes processos de destino e tratamento destes resíduos.

A ânsia do lucro imediato e desmedido, neste atual mercado competitivo e até irracional, leva à produção e à colocação de produtos no mercado, tantas vezes não para satisfazer as necessidades dos consumidores, mas para aumentar a faturação das empresas, recorrendo a campanhas de marketing agressivas no sentido de vender a simples atualização de um produto, sem que haja qualquer vantagem explícita para o próprio consumidor, incutindo neste o sentimento e a perceção de desatualização, como se verifica com os produtos eletrónicos de que os telemóveis e os computadores são exemplos bem demonstrativos.

A pretensão das empresas venderem o maior número de produtos num curto espaço de tempo, num mercado cada vez mais estabilizado, tem tornado os produtos cada vez menos duradouros e mais descartáveis. Aliás, nesta perspetiva os fabricantes pretendem a duração mais curta possível, que não ultrapasse em muito a garantia legal, para que o próprio consumidor seja novamente obrigado a adquirir um produto igual ou similar.

Neste contexto, os materiais utilizados são frequentemente de má qualidade, embora existindo materiais melhores e mais adequados que poderiam duplicar e triplicar a durabilidade dos produtos, sem que representasse um acréscimo muito superior ao preço final a pagar pelo consumidor.

A utilização de materiais muito à base de plásticos faz com que, perante a mais insignificante avaria, os produtos tenham de ser substituídos por novos, quando na verdade se utilizassem materiais mais resistentes poderia ser possível a sua própria reparação com custos muito mais reduzidos para os próprios consumidores.

Por outro lado, em muitas situações em que é possível proceder à reparação dos respetivos produtos, as peças, amiúde, quando são disponibilizadas pelas empresas, tornam-se mais caras do que a compra de um produto novo, sendo colocada de parte a opção da sua reparação.

Há inclusivamente empresas que utilizam materiais, processos de fabrico e até simples parafusos extremamente personalizados, para que se torne praticamente impossível a substituição ou reparação de uma pequena componente do equipamento que esteja danificada, obrigando o próprio consumidor a adquirir um novo produto, como é o caso de telemóveis, contribuindo para o acumular de resíduos e consequentemente mais pressão sobre os próprios recursos naturais.

Em 2016, segundo as Nações Unidas, no âmbito do estudo Observatório Global de Lixo Eletrónico 2017, foram produzidos quase 45 milhões de toneladas de lixo eletrónico, valor que tem vindo a aumentar. Mantendo-se a mesma tendência, as previsões para 2021 apontam para a produção de mais de 52 milhões de toneladas deste tipo de resíduos.

Uma grande parte destes resíduos descartados, em particular eletrónico, não está a ser reciclado sendo enviado, sobretudo, para países mais pobres, nomeadamente do continente africano, muito do qual enviado de forma informal, onde por vezes são amontoados ou incinerados a céu aberto, provocando contaminação, devido à existência de mercúrio nesses materiais, tornando-se uma das maiores preocupações ambientais à escala global, situação que também afeta a saúde humana.

Atualmente, no que se refere ao lixo eletrónico, os maiores produtores, segundo um relatório apresentado em Davos pelas Nações Unidas, são a Austrália, China, União Europeia, Japão, América do Norte e Coreia do Sul. Na União Europeia cada pessoa produz em média 17,7kg anuais de resíduos eletrónicos, contrastando com 1,9kg no continente africano.
Os custos económicos e ambientais, associados às perdas dos produtos, são extremamente lesivos não só pelo lixo produzido, mesmo que possa ser reciclado, mas também pela pressão que tem sido exercida sobre os recursos naturais.

Para além de medidas, que fomentem a própria reciclagem e reutilização desde tipo de produtos, é necessário em primeiro lugar atuar a montante, no sentido da indústria, desde logo utilizar materiais de melhor qualidade, aumentando a durabilidade e recuperação dos respetivos produtos.

Para além da durabilidade contribuir para a sustentabilidade ambiental e poupanças para os consumidores, pelo facto de os produtos apresentarem melhor qualidade dos materiais, havendo a possibilidade de reparação, poderá levar à dinamização das economias locais como se pode constatar, embora cada vez menos, com as microempresas dedicadas à reparação de eletrodomésticos que têm vindo a desaparecer.

Na perspetiva de melhorar a durabilidade dos produtos e da alteração do paradigma que tem balizado os fabricantes, bem como proteger e salvaguardar os consumidores desta imposição do mercado dos produtos serem cada vez mais descartáveis e de má qualidade, torna-se assim fundamental expandir a garantia dos produtos comercializados.

O Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, e respetivas alterações, veio salvaguardar aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, estabelecendo em dois anos a garantia dos bens móveis, independentemente da aquisição se realizar numa loja tradicional ou on-line, e cinco anos para os imóveis.

Se no passado a expansão da garantia para dois anos para os bens móveis foi uma mais valia salvaguardando os consumidores, este prazo está a inibir os fabricantes de melhorarem a qualidade dos seus produtos, desprotegendo os consumidores que são praticamente obrigados a adquirirem um novo produto passado este tempo.

A necessidade de expandir a garantia é tão evidente que, há cada vez mais vendedores, embora numa perspetiva de negócio, a “vender” a expansão da garantia dos seus produtos para três a cinco anos, através de seguros, por vezes pagos a preços exorbitantes.

Por se tratar de um seguro, esta garantia não está regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, mas pelas clausulas do respetivo seguro, não raras vezes de difícil ativação em caso de avaria dos equipamentos.

Para além dos bens móveis, o prazo de garantia para os imóveis é de 5 anos, contudo é igualmente insuficiente, não tanto do ponto de vista ambiental, mas sobretudo económico e social, em particular no que se refere à habitação.

A habitação para além de ser um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa, representa uma parte considerável do orçamento das famílias, pelo que os cidadãos devem estar salvaguardados, por um período nunca inferior a dez anos, de defeitos relacionados com a sua construção.

Neste sentido, uma forma de melhorar a qualidade dos bens móveis e imóveis, salvaguardar os direitos do consumidor e reduzir os impactos no ambiente, diminuindo a nossa pegada ecológica, será aumentar o prazo de garantia dos bens para um período superior ao que existe atualmente na legislação.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Partido Ecologista Os Verdes, apresentam o seguinte Projeto de Lei:


Artigo 1º
Objeto
A presente Lei procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril que “Transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio, sobre certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, e altera a Lei n.º 24/96, de 31 de julho”.

Artigo 2º
Alteração ao Decreto-Lei 67/2003, de 08 de abril
Os artigos 3º, 5º e 6º do Decreto-Lei 67/2003, de 08 de abril, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de maio, passam a ter a seguinte redação:

“Artigo 3.º
Entrega do bem
1- (…)
2 - As faltas de conformidade que se manifestem num prazo de cinco ou de dez anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respetivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade.

Artigo 5.º
Prazo de Garantia
1 - O consumidor pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de cinco ou de dez anos a contar da entrega do bem, consoante se trate, respetivamente, de coisa móvel ou imóvel.
2 - Tratando-se de coisa móvel usada, o prazo previsto no número anterior pode ser reduzido a dois anos, por acordo das partes.
3 - Havendo substituição do bem, o bem sucedâneo goza de um prazo de garantia de cinco ou de dez anos a contar da data da sua entrega, conforme se trate, respetivamente, de bem móvel ou imóvel.
4 - O prazo referido no n.º 1 suspende-se, a partir da data da denúncia, durante o período em que o consumidor estiver privado do uso dos bens.

Artigo 6.º
Responsabilidade direta do produtor
1 - (…)
2 - (…)
a) (…);
b) (…);
c) Poder considerar-se, tendo em conta as circunstâncias, que o defeito não existia no momento em que colocou a coisa em circulação;
d) Não ter fabricado a coisa nem para venda nem para qualquer outra forma de distribuição com fins lucrativos, ou não a ter fabricado ou distribuído no quadro da sua atividade profissional;
e) Terem decorrido mais de 15 anos sobre a colocação da coisa em circulação.
3 - (…)

Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente Lei entra em vigor um ano após a sua publicação.

Acompanhe aqui a evolução deste Projeto de Lei de Os Verdes.
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