A recolha, desmantelamento e abate de Veículos em Fim de Vida (VFV) é um processo já profundamente implementado no nosso país, em centros devidamente licenciados para o efeito e em sintonia com a legislação nacional e comunitária, constituindo um processo fundamental à sustentabilidade.
De facto, através deste processo, estamos a dar expressão à politica dos 3 R’s, Reduzir, Reutilizar e Reciclar, orientação que deve estar presente sempre que falamos de resíduos e sobretudo da politica pública de resíduos e que resulta também de compromissos assumidos pelo nosso país no plano internacional, nomeadamente na Conferência do Rio 92.
Assim, não só, se evita a produção de resíduos, ganhando enfoque o primeiro “erre” e, por outro lado, prolonga-se o tempo de vida útil de muitas peças, que são reutilizadas e, por fim, é dado um destino adequado aos materiais não reutilizáveis.
Ou seja, este processo potencia o aumento da taxa de preparação de resíduos para reutilização e reciclagem, dando outro destino aos resíduos suscetíveis de valorização que não a sua deposição em aterro, e promove simultânea e significativamente a redução da produção de resíduos.
Atualmente os Veículos em Fim de Vida encontram-se, e bem, sujeitos ao regime jurídico estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro.
Sucede que este diploma legal, como decorre do n.º 7 do seu artigo 87.º, obriga os operadores licenciados para estes processos, a proceder ao desmantelamento de todos os VFV no prazo máximo de um ano, após a respetiva receção.
Ora, a imposição, para o desmantelamento dos VFV, deste prazo, ou de qualquer outro, acaba por ter um efeito antagónico a uma verdadeira política dos 3 R’s no que respeita à gestão de resíduos, uma vez que limita e reduz significativamente as possibilidades de reutilização de peças e componentes automóveis, muitas vezes recuperados de VFV e contraria grosseiramente a filosofia que norteou a construção do próprio Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro, comprometendo, portanto, os seus objetivos.
Com efeito, a grande vantagem que obtemos do ponto de vista ambiental com a existência de um sistema de gestão de veículos em fim de vida, ou seja, a redução da produção de resíduos, nomeadamente promovendo a reutilização, fica comprometida com a imposição de prazos.
Como bem se percebe, nem sempre o mercado automóvel, mais especificamente o mercado de peças e componentes usados, consegue dar escoamento a todos estes componentes no prazo estabelecido no referido diploma, o que obriga os gestores de VFV a optar por operações de reciclagem ou eliminação, o que em nada contribui para uma melhor e mais adequada gestão de resíduos.
Acresce que esta obrigação interfere com aspetos internos e comerciais das empresas que fazem a gestão dos VFV e coloca os centros de abate nacionais em situação de desvantagem concorrencial em relação aos seus congéneres europeus uma vez que este prazo só existe em Portugal.
Por outro lado, a fixação deste prazo é injustificada no que diz respeito à proteção da Saúde Pública e do Ambiente, já que os centros de abate são sujeitos a um processo de licenciamento rigoroso e possuem instalações e equipamentos adequados.
No processo de licenciamento participam diversas autoridades nacionais, tais como representantes dos Ministérios da Economia e do Ambiente, da Proteção Civil, delegados de saúde, entre outros.
Para operarem, os centros de abate de veículos têm de estar dotados de equipamentos e instalações adequados para o exercício da atividade de despoluição/desmantelamento de VFV (superfícies impermeabilizadas; sistemas de recolha e tratamento de águas pluviais, de limpeza e de derrames que asseguram o cumprimento da legislação nacional relativa a descarga de águas residuais; equipamentos adequados para a despoluição, desmantelamento e movimentação de VFV; vedações que impedem o livre acesso e diminuem o impacte visual, entre outros).
Para além disso, os operadores são obrigados a despoluir, em 15 dias, todos os VFV que recebem. Após esta operação, que se destina a remover todos os componentes perigosos (combustível, óleos, bateria, pirotécnicos, entre outros), os VFV perdem o seu “estatuto” de resíduos perigosos e passam a ser classificados como resíduos banais.
São ainda abrangidos por um vasto conjunto de legislação complementar, que oferece garantias de proteção suplementares (Lei n.º 54/2012, que prevê a instalação de sistemas de videovigilância para controlo efetivo de entradas e saídas nas instalações; Decreto-Lei n.º 147/2008, que estabelece o regime jurídico relativo à responsabilidade ambiental aplicável à prevenção e reparação dos danos ambientais; Regime Jurídico de Segurança Contra Incêndio em Edifícios, que prevê a obrigatoriedade de realização de simulacros e da implementação de medidas de autoproteção aprovadas pela ANPC).
O próprio Decreto-Lei 152-D/2017, que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2000/53/CE, estabelece já um conjunto de normas de gestão que visa a criação de circuitos de receção de VFV, o seu correto transporte, armazenamento e tratamento, designadamente no que respeita à separação de substâncias perigosas neles contidas e ao posterior envio para reutilização, reciclagem ou outras formas de valorização, desencorajando, sempre que possível, o recurso a formas de eliminação tais como a sua deposição em aterro.
Por fim, a Diretiva 2000/53/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de setembro, alterada pelas Diretivas 2008/112CE, de 16 de dezembro, 2011/37/UE, de 30 de Março, 2013/28/UE, de 17 de maio, 2016/774/UE, de 18 de maio, e 2017/2096/UE, de 15 de Novembro, que “define o regime aplicável à gestão de VFV, tendo em vista, a prevenção da produção de resíduos provenientes de veículos e a promoção da reutilização, da reciclagem e de outras formas de valorização de VFV” não contempla qualquer prazo limite para o desmantelamento de VFV.
Face a este quadro, Os Verdes consideram que a imposição de um prazo, para os operadores licenciados procederem ao desmantelamento de todos os VFV, faz mais parte do problema do que da solução, uma vez que condiciona os próprios objetivos do Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro e, por isso, propõem, através da presente iniciativa legislativa, a eliminação do prazo previsto no número 7 do artigo 87.º deste Diploma Legal.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Partido Ecologista “Os Verdes”, apresentam o seguinte Projeto de Lei:Artigo 1º
Objeto
A presente Lei procede à alteração ao Decreto-Lei n.º 152-D/2017 de 11 de dezembro, que estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a gestão dos fluxos específicos de resíduos nomeadamente VFV.
Artigo 2º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 152-D/2017 de 11 de dezembro
O artigo 87º do Decreto-Lei n.º 152-D/2017 de 11 de dezembro, passa a ter a seguinte redação:
“Artigo 87º
Operadores de gestão de VFV
1 - …
2 - …
3 - …
4 - …
5 - …
6 - …
7 – Os operadores de desmantelamento ficam obrigados a realizar as operações descritas no n.º 2.2 do anexo XIX.
8 - …
9 - …”
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente Lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
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