As assimetrias regionais constituem um problema estrutural em Portugal, que, pese embora as proclamadas intenções de as combater, têm sido agravadas por sucessivos Governos.
Com efeito, as desigualdades territoriais num país tão pequeno como Portugal, que opõem o litoral ao interior, foram fomentadas por décadas de políticas de desinvestimento no interior do território.
Sempre que um Governo decidiu encerrar no interior do país um estabelecimento de ensino, uma unidade de saúde, um posto da GNR, uma estação dos CTT, uma repartição de finanças, uma linha ou um ramal ferroviário, ou qualquer outro serviço público, contribuiu diretamente para a perda de potencialidade de desenvolvimento daquele território, para que essas zonas, desprovidas de serviços, gerassem menos capacidade de atrair pessoas e empresas, formando-se um ciclo vicioso de esvaziamento e despovoamento do interior – se há menos população encerram-se serviços e se não há serviços não se fixa população e atividade económica.
A promoção de uma política de destruição da atividade produtiva do país, com grande impacto no abandono da agricultura e da pastorícia por milhares de pequenos produtores, bem como o isolamento de certas regiões e localidades pela ausência de transportes públicos, que garantam a mobilidade necessária dos cidadãos e o escoamento dos produtos das empresas, formaram também o conjunto de fatores que, entre outros, têm contribuído para a «anulação» do interior e o alargamento de territórios de baixa densidade.
A verdade é que se podem criar sólidos planos, programas, estratégias e leis do ordenamento do território e para a coesão territorial, mas uma coisa é certa: se não houver financiamento/investimento adequado e incentivos apropriados para promover o objetivo de combater as assimetrias regionais, a realidade prática não se alterará, manter-se-á o desperdício do potencial de desenvolvimento de uma parte muito significativa do nosso território, e a situação continuará a agravar-se.
Foi, justamente, com essa preocupação que o PEV, logo no início da legislatura, exigiu que na posição conjunta assinada com o PS, constasse expressamente o impedimento de o Governo encerrar serviços públicos de proximidade. Com efeito, é preciso que o Estado contribua para criar condições de fixação das populações, e não o oposto.
Para além disso, os Verdes apresentaram propostas muito concretas, que ficaram consagradas em Orçamento do Estado, como a criação de benefícios fiscais, em sede de IRC, às micro, pequenas e médias empresas com atividade no interior do país. Propusemos também a eliminação de portagens das ex-SCUT, de modo a diminuir os encargos que estas empresas têm com as deslocações, assim como os cidadãos em geral, que se deslocam no e para o interior do país. Uma outra vertente, para a qual o PEV tem insistentemente apresentado propostas, prende-se com a necessidade de ligar o país através de uma rede de transportes públicos adequada, em particular da rede ferroviária nacional, que permita a mobilidade regular de passageiros e também o transporte de mercadorias.
Temos um país com uma diversidade paisagística e cultural muito rica, e com uma capacidade produtiva amplamente subaproveitada. Serviços públicos diversificados e de qualidade, criação de emprego com o fomento de atividade produtiva sustentável, transportes públicos com condições de conforto e rapidez são chaves essenciais para criar condições de repovoamento do nosso interior, para lhe gerar dinâmica e para que conheça um rejuvenescimento tão necessário.
Para além de questões tão relevantes como a criação das regiões administrativas (completando o quadro do poder local consagrado na Constituição da República Portuguesa), as opções de investimento público são determinantes para trabalhar progressivamente para o objetivo de coesão territorial, o qual deve ser tomado como um verdadeiro desígnio nacional.
Ora, os Orçamentos do Estado traduzem, por definição, as diretrizes e as opções políticas de investimento a ter lugar num determinado ano civil, pelo que o PEV considera ser fundamental que, aquando das negociações e da apresentação do Orçamento do Estado e das respetivas propostas de alteração, a Assembleia da República tenha um conhecimento efetivo sobre aquela que é a situação e a evolução do país em termos de desigualdades territoriais. Este conhecimento, por parte da Assembleia da República, sobre a realidade e as necessidades do território, é fundamental para que as opções de investimento possam ser analisadas e propostas com vista a uma eficácia desejada. O objetivo é que, com conhecimento da realidade concreta, possam ser traçados investimentos adequados para prosseguir os desígnios nacionais propostos.
Os Verdes, através do presente Projeto de Lei propõem que, antes da apresentação de cada Orçamento do Estado, o Governo apresente à Assembleia da República um relatório que retrate a situação das assimetrias regionais no país e a evolução dos parâmetros de coesão territorial que se vão atingindo (ou não) ano após ano. No fundo, este relatório permite avaliar investimentos necessários, bem como avaliar o impacto que, ano após ano, os investimentos realizados vão tendo no território, no que concerne ao combate às desigualdades territoriais.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei:Artigo 1º
Objeto
A presente lei define a obrigatoriedade de o Governo elaborar e apresentar à Assembleia da República um relatório sobre as assimetrias regionais em Portugal.
Artigo 2º
Âmbito
1 - O Relatório sobre as assimetrias regionais, adiante designado por Relatório, apresenta um diagnóstico, incluindo informação estatística, da situação sobre as desigualdades territoriais no país, no que se refere, designadamente, à caracterização da oferta de serviços públicos de proximidade, dimensão e tipo de atividade económica existente, oportunidades de emprego, oferta de transporte de passageiros e de mercadorias, estado dos ecossistemas sensíveis.
2 - O Relatório promove, igualmente, uma avaliação do impacto das políticas públicas sobre a dimensão da coesão territorial, salientando a situação e a evolução verificada nos territórios de baixa densidade.
3 - O Relatório deve apontar um conjunto de políticas públicas urgentes e de necessidades de investimento mais prementes para a promoção da coesão territorial.
Artigo 3º
Competência
A elaboração do Relatório é da responsabilidade do Governo, competindo-lhe determinar por quem, como e em que moldes é construído.
Artigo 4º
Periodicidade e prazo
1- O Relatório é apresentado anualmente e o Governo procede à sua entrega à Assembleia da República até ao dia 1 de outubro de cada ano.
2- Quando, por motivo de realização de eleições legislativas, não for possível cumprir o prazo previsto no número anterior, o Governo apresenta o Relatório à Assembleia da República juntamente com a proposta de Orçamento do Estado.
Artigo 5º
Regulamentação
O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 90 dias após a sua entrada em vigor.
Artigo 6º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Acompanhe
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