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05/06/2017
Projeto de Lei nº 537/XIII/2ª - Estabelece medidas de proteção aos carvalhos e a outras espécies autóctones da flora portuguesa
As florestas, e os ecossistemas que as mesmas suportam, constituem um património natural e ambiental, fonte de vida e de biodiversidade, parte importantíssima e absolutamente insubstituível da riqueza do nosso país.

Essa riqueza não deve ser aferida apenas de um ponto de vista puramente económico e imediatista, medido em termos do PIB nacional, mas também enquanto componente ambiental fundamental do desenvolvimento sustentável e em harmonia com a Natureza, sem esquecer a sua importância cultural, de memória, e de identidade local, regional e nacional.

A floresta espontânea e as espécies da flora autóctone portuguesas, por estarem particularmente adaptadas ao nosso clima e aos nossos solos, representam uma enorme mais-valia ambiental, que se reflete ao nível da conservação da natureza - pela diversidade de vegetação e da fauna silvestre que albergam -, do equilíbrio climatérico e da qualidade do ar, da estabilidade e da recarga dos aquíferos, da preservação dos solos e no combate aos incêndios pela reconhecida resistência e capacidade regenerativa que apresentam.

Além disso, a floresta espontânea desempenha ainda um papel económico-social de grande relevo, com importantes reflexos nos sectores agroflorestal e do turismo da natureza, geradores de emprego e riqueza, pelo que é dever do Estado, conforme está previsto na Lei de Bases da Política Florestal (artº 10º da Lei n.º 33/96, de 17 de Agosto), dotar essas espécies de um estatuto legal conforme à sua importância e ao lugar que devem ocupar na nossa floresta e nos nossos ecossistemas.

De acordo com a Greenpeace, as florestas de origem primária ocupam atualmente menos de 10% da superfície terrestre e tendem a desaparecer, o que constitui uma das principais ameaças à perda de biodiversidade e à extinção de espécies.

Torna-se, por isso, absolutamente fundamental preservar, conservar, consolidar e desenvolver os nossos biótopos e habitats naturais, bem como as espécies que neles sobrevivem, com particular acuidade, as das nossas fauna e flora autóctones, designadamente as espécies vegetais de porte arbustivo e arbóreo, por constituírem o pilar fundamental e basilar dos diferentes ecossistemas.

No panorama da flora autóctone portuguesa, e em particular das árvores autóctones portuguesas, destacam-se, pelo seu porte nobre e importância ambiental e cultural, as quercíneas, de que fazem parte os carvalhos (Quercus faginea -carvalho cerquinho, Quercus robur -carvalho alvarinho ou roble, Quercus pyrenaica -carvalho negral, Quercus coccifera L. –carrasco), mas também o Sobreiro (Quercus suber) e a Azinheira (Quercus ilex).
Infelizmente, ao contrário do Sobreiro e da Azinheira (que representam, em conjunto e como espécies dominantes, cerca de 37% da área total de povoamento florestal no nosso país, o que se deve sem dúvida, à mais valia que reconhecidamente representam em termos de produção agroflorestal, designadamente na produção de cortiça, de biomassa florestal e de carvão e na alimentação natural de gado de elevada qualidade, mas que se deve também ao facto de gozarem, há longa data, de um estatuto de proteção legal), os Carvalhos representam apenas 4% daquela mancha de povoamento florestal, cuja realidade continua a ser dominada pelas espécies típicas da frente florestal industrial (pinheiro bravo e eucalipto), que ocupam só por si 52%, regra geral em manchas de monocultura sem qualquer descontinuidade. Com efeito, reconhecendo embora que os montados de sobro e azinho também se debatem com alguns problemas e dificuldades (entre as quais uma elevada taxa de mortalidade por causas ainda não completamente compreendidas), é forçoso reconhecer que as restantes espécies arbustivas e arbóreas da nossa flora natural, têm sofrido, ao longo dos tempos, um progressivo desaparecimento (causado pelo abate não seguido de reflorestação, pela construção de infraestruturas e edificações, por pastoreio, pela substituição por outras espécies –como o eucalipto- ou pela ação do fogo), com redução da mancha florestal que as mesmas ocupam, para áreas francamente preocupantes. Importa alterar este panorama em nome dos valores da conservação da natureza e da biodiversidade.

A flora autóctone portuguesa tem sido, até à data, salvo as honrosas exceções dos Decretos-Lei nº 169/2001, de 25 de Maio (Proteção do Sobreiro e da Azinheira) e nº 423/89, de 4 de Dezembro (Proteção do Azevinho Espontâneo), votada a um quase total desprezo do ponto de vista legislativo nacional, não tendo merecido qualquer proteção ou consagração legal que lograsse reconhecer as nossas espécies como património natural nacional, dotando-as dum adequado regime de salvaguarda. A transposição (feita pelo Decreto-Lei nº49/2005 de 24 de Fevereiro, depois do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias ter concluído que o Estado português, através do anterior diploma – D.L. nº140/99 de 24-04 –, não tinha realizado a transposição na íntegra) e entrada em vigor no nosso país da Diretiva Habitats (Diretiva 92/43/CEE do Conselho de 21 de Maio de 1992), veio consagrar a possibilidade de proteção a alguns biótopos e a algumas espécies da nossa flora autóctones, proibindo, designadamente, «a colheita, o corte, o desenraizamento ou a destruição das plantas ou partes de plantas no seu meio natural e dentro da sua área de distribuição natural». No entanto, a maior parte das espécies vegetais, designadamente as de médio e grande porte, só são protegidas pelo D.L. nº49/2005 indiretamente, isto é, se se encontrarem, e por se encontrarem, dentro de um Sítio de Interesse Comunitário (Zona Especial de Conservação ou Zona de Proteção Especial) reconhecido no âmbito da Rede Natura 2000, o que se apresenta manifestamente insuficiente para travar o desaparecimento da nossa floresta autóctone e auxiliar à sua recuperação.

O presente Projeto de Lei visa, assim, consagrar um estatuto mínimo de proteção para os Carvalhos e outras espécies da nossa flora autóctone, no intuito da sua preservação como património, mas também de aproveitar todo o seu potencial para valorizar e proteger a floresta portuguesa. Procurou-se ter em conta experiências legislativas anteriores, designadamente do estatuto de proteção do montado, que constituiu uma vanguarda no nosso país na proteção de espécies arbóreas nacionais, o que pareceu adequado às necessidades das espécies agora em causa.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar Os Verdes, apresenta o seguinte Projeto de Lei com vista à proteção dos Carvalhos e de outras espécies autóctones da flora portuguesa:

Artigo 1º
Objeto
1 - A presente Lei estabelece medidas de proteção às espécies de carvalhos e outras espécies arbustivas e arbóreas da flora espontânea autóctone do território nacional.
2 – Para efeitos do presente diploma, são consideradas espécies arbustivas e arbóreas da flora autóctone nacional:
a) Árvores:
i) Quercus faginea Lam. (Carvalho cerquinho, Carvalho-português)
ii) Quercus robur L. (Carvalho roble, Carvalho alvarinho)
iii) Quercus pyrenaica L. (Carvalho negral)
iv) Quercus coccifera L. (Carrasco, Carrasqueiro)
v) Quercus canariensis (Carvalho de Monchique)
vi) Quercus ilex var. rotundifolia Lam. (Azinheira-da-bolota-doce)
vii) Quercus suber L. (Sobreiro)
viii) Acer monspessulanum (Zelha)
ix) Acer pseudoplatanus (Padreiro)
x) Alnus glutinosa [L.] Gaertn. (Amieiro)
xi) Betula celtiberica Rothm. & Vasc. (Bétula, Vidoeiro)
xii) Castanea sativa Miller (Castanheiro)
xiii) Celtis australis L. (Lódão bastardo, Agreira)
xiv) Ceratonia siliqua L. (Alfarrobeira)
xv) Corylus avellana (Aveleira)
xvi) Crataegus monogyna (Pilritiero)
xvii) Frangula alnus (Sanguinho das ribeiras)
xviii) Fraxinus angustifolia L. (Freixo)
xix) Ilex aquifolium (Azevinho)
xx) Olea europaea L. var. sylvestris (Miller) Lehr. (Zambujeiro)
xxi) Pinus pinea L. (Pinheiro manso)
xxii) Pinus sylvestris L. (Pinheiro de casquinha, Pinheiro silvestre)
xxiii) Prunus avium (Cerejeira brava)
xxiv) Populus nigra (Choupo negro)
xxv) Populus alba (Choupo branco)
xxvi) Salix atrocinerea (Borrazeira negra ou salgueiro negro)
xxvii) Salix alba (Salgueiro branco ou borrazeira branca)
xxviii) Salix salvifolia (Salgueiro)
xxix) Sorbus aucuparia (Sorveira dos pássaros)
xxx) Sorbus latifolia (Mostajeira)
xxxi) Ulmus minor (Ulmeiro)
xxxii) Ulmus procera (Ulmeiro)
b) Arbustos:
i) Arbutus unedo L. (Medronheiro, Ervodo, Ervedeiro)
ii) Corema album (Camarinha)
iii) Juniperus oxycedrus (Zimbro)
iv) Juniperus phoenicea L. (Sabina, Zimbro, Zimbreira)
v) Juniperus turbinata (Sabina-das-praias)
vi) Laurus nobilis (Loureiro)
vii) Phillyrea latifolia (Aderno)
viii) Pistacia lentiscus (Aroeira)
ix) Prunus lusitanica L. ssp. lusitanica (Azereiro)
x) Rhamnus alaternus L. (Sanguinho-das-sebes, Aderno-bastardo)
xi) Rhamnus frangula (Espinheiro)
xii) Taxus baccata L. (Teixo)
xiii) Viburnum tinus (Folhado)
3 – As espécies da flora autóctone enumeradas no número anterior, de ora em diante designadas por «espécies protegidas», constituem património natural e de biodiversidade nacional de Portugal.

Artigo 2º
Extensão da proteção
O disposto no presente diploma aplica-se, ainda, a todas as espécies da flora autóctone que, como tal, venham a ser expressamente reconhecidas, mediante despacho conjunto dos Ministérios do Ambiente e da Agricultura.

Artigo 3º
Definições
1 - Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por:
a) «Áreas classificadas» - áreas que são consideradas de particular interesse para a conservação da natureza, nomeadamente áreas protegidas, sítios da Lista Nacional de Sítios, sítios de interesse comunitário, zonas especiais de conservação e zonas de proteção especial, criadas nos termos das normas jurídicas aplicáveis;
b) «Árvores, arbustos e conjuntos exemplares» – plantas ou conjuntos de plantas de espécie protegida que, pelo seu potencial genético, idade, porte, CAP, raridade, localização, importância ambiental, histórica, cultural, paisagística, patrimonial ou outra, merecem proteção individual, apesar de não se encontrarem em povoamento referido na alínea d) deste número;
c) «Conversão» - alteração que implica a modificação do regime ou da composição ou a redução de densidade do povoamento abaixo dos valores mínimos definidos referidos na alínea c) do presente número;
d) «Corte de conversão» - intervenção em que, através de arranque ou corte de plantas, se reduz a densidade do povoamento abaixo dos valores mínimos definidos referidos na alínea c) do presente número;
e) «Desbaste» - operação em que, através do arranque ou corte seletivo, são eliminadas plantas mortas, caducas ou fortemente afetados por pragas ou doenças ou que prejudicam o desenvolvimento de outras, igualmente protegidas, em boas condições vegetativas;
f) «Empreendimento agrícola de relevante e sustentável interesse para a economia local» - empreendimento agrícola com importância para a economia local, avaliada em termos de criação líquida de emprego e valor acrescentado superior ao do uso atual da terra, com viabilidade económica e financeira, que dê origem a produtos com escoamento garantido no mercado e que não sejam alvo de mecanismos de suporte dos preços de mercado, apoios à produção, à exportação ou ao rendimento e cuja localização, não possuindo alternativa, apresenta adequada aptidão edafo-climática para o uso agrícola em causa;
g) «Empreendimento de imprescindível utilidade pública» – infraestrutura de interesse público considerada fundamental, estruturante e imprescindível para dar resposta a uma necessidade pública.
h) «Espécie protegida» – espécie arbustiva ou arbórea da flora autóctone nacional sujeita a medidas de proteção previstas no presente diploma;
i) «Planta de espécie protegida» – planta individual de espécie protegida por este diploma ou por despacho conjunto referido no artigo anterior, em qualquer fase do seu desenvolvimento biológico;
j) «Povoamento de espécie protegida» - formação vegetal onde se verifica a presença de plantas de uma ou mais espécies protegidas, em povoamento puro ou associadas entre si ou com outras espécies, com os parâmetros mínimos de densidade individualmente definidos para cada espécie;
k) «Povoamento espontâneo» – povoamento de espécie protegida de geração espontânea, subespontânea ou com intervenção humana, desde que não tenha sido plantado especificamente com vista ao seu abate para produção de madeira ou outra matéria-prima;
2 – Para efeitos da determinação do previsto na alínea b) do número anterior, o Governo define por Portaria, no prazo máximo de um ano, a «idade» mínima, o CAP, bem como os restantes critérios referidos, para a classificação como «exemplar», estabelecidos para cada uma das espécies protegidas.
3 - Para efeitos da determinação do previsto na alínea j) do número anterior, o Governo define por Portaria, no prazo máximo de um ano, os «parâmetros mínimos de densidade» estabelecidos para cada uma das espécies protegidas.

Artigo 4º
Proibição de corte, arranque ou destruição
1 – É proibido o corte, o arranque, o desenraizamento, a colheita ou a destruição, totais ou parciais, de plantas ou parte de plantas de espécies protegidas existentes em povoamento espontâneo, bem como de plantas isoladas ou em povoamento de densidade inferior aos valores mínimos estabelecidos para a espécie em causa no caso de árvores, arbustos ou conjuntos exemplares.
2 – Excetuam-se do disposto no nº 1:
a) os cortes de desbaste autorizados ou promovidos, mediante ato devidamente fundamentado, pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais;
b) as podas ou outras intervenções necessárias e justificadas por motivos fitossanitários ou de melhoria da condição geral da planta, desde que não ponham em causa a sobrevivência da mesma e sejam autorizadas pelos serviços regionais do Ministério da Agricultura e feitas de acordo com as instruções dadas pelos mesmos;
c) as intervenções levadas a cabo ao abrigo de orientações estratégicas para rearborização definidas pelo Governo, ou em situações de emergência pela proteção civil para combater incêndios ou outras catástrofes naturais em progressão;
d) os cortes de conversão de povoamento visando a realização de empreendimento de imprescindível utilidade pública, quando for a única solução possível, autorizados e realizados nas condições referidas na autorização;
e) os cortes de conversão de povoamento visando a realização de empreendimento agrícola com relevante e sustentável interesse para a economia local, quando for a única solução possível, autorizados e realizados nas condições referidas na autorização;
f) os cortes ou abates em povoamento espontâneo destinados a produção de madeira ou outra matéria prima, desde que, cumulativamente:
i) estejam previstos em Plano de Gestão Florestal;
ii) não reduzam a densidade mínima prevista para a espécie em causa;
iii) não ultrapassem o máximo de 33 % do número de árvores existentes;
iv) esteja autorizados e sejam realizados nas condições referidas na autorização;
g) as podas, colheitas ou corte de partes de plantas que correspondam a um normal, tradicional ou prudente uso silvícola, sem colocar em perigo a sobrevivência ou o bom estado vegetativo da planta;
h) os cortes em regime de talhadia, desde que se praticasse já este regime no prédio em causa, à altura da publicação deste diploma ou desde que previsto em Plano de Gestão Florestal.
3 - As autorizações previstas nas alíneas a), d), e) e f) do número anterior competem à Direcção-Geral dos Recursos Florestais, após parecer dos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente e de parecer vinculativo dos Serviços do Ministério do Ambiente, sem prejuízo da apresentação das declarações de imprescindível utilidade pública ou de relevante e sustentável interesse para a economia local, quando a natureza das conversões as exija.
4 – As autorizações previstas na alínea b) do nº 2 competem aos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente após parecer vinculativo dos Serviços do Ministério do Ambiente.
5 - No caso de plantas de espécies protegidas fora dos casos previstos no nº 1 do presente artigo e fora de povoamentos plantados com vista ao seu abate, nos termos previstos neste diploma, o seu corte ou arranque fica condicionado ao seu transplante, caso a planta seja ainda jovem, se viável com sucesso, ou à plantação de pelo menos uma nova planta da mesma espécie por cada planta arrancada, acompanhado de informação prestada aos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente e aos Serviços do Ministério do Ambiente com a antecedência mínima de trinta dias relativamente à data prevista para a intervenção.
6 – Nos casos de corte ou arranque previstos no nº 2 e no nº 5 do presente artigo, o interessado fica obrigado à implementação de medidas previstas no artigo 11º.
7 - Os cortes necessários aos empreendimentos agrícolas a que se refere a alínea e) do nº 2 só podem ser autorizados quando reúnam, cumulativamente, as seguintes condições:
a) A área sujeita a corte não ultrapassar o menor valor entre 10% da superfície do povoamento de espécie protegida ou 20 ha, limite este que deve manter-se válido no caso de transmissão ou divisão da propriedade;
b) Verificar-se uma correta gestão e um bom estado vegetativo e sanitário da restante área ocupada por qualquer das espécies protegidas.
8 - As áreas sujeitas a corte a que se refere o número anterior não podem ser desafetadas do uso agrícola durante 25 anos.
9 - A Direcção-Geral dos Recursos Florestais e os Serviços Desconcentrados da Direção Geral dos Recursos Florestais podem, desde que de forma devidamente fundamentada, alterar o critério e a intensidade dos cortes ou arranques ou adiar a sua execução.
10 - Para efeitos do disposto no presente diploma, designadamente na alínea g) do anterior nº 2, o Governo definirá e regulamentará, por Decreto-Lei, no prazo máximo de um ano:
a) as formas permitidas de uso e aproveitamento agrícola, silvícola, pecuário e pastoril das espécies protegidas respeitando os princípios da salvaguarda, sustentabilidade e proliferação das espécies protegidas;
b) os casos em que se dispensa qualquer procedimento e aqueles em que se exige a prestação de mera informação prévia aos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente.

Artigo 5º
Inibição de alteração do uso do solo
Ficam vedadas, por um período de 25 anos, quaisquer alterações ao uso do solo em áreas ocupadas por povoamento espontâneo que tenham sofrido conversões por:
a) Terem sido percorridas por incêndio, sem prejuízo das restantes disposições previstas no Decreto-Lei n.º 327/90, de 22 de Outubro, alterado pela Lei n.º 54/91, de 8 de Agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 34/99, de 5 de Fevereiro;
b) Terem sido realizados cortes ou arranques não autorizados;
c) Ter ocorrido anormal mortalidade ou depreciação do arvoredo em consequência de ações ou intervenções por qualquer forma prejudiciais que determinaram a degradação das condições vegetativas ou sanitárias do povoamento.

Artigo 6º
Corte ou arranque ilegal
Nos terrenos em que tenha ocorrido corte ou arranque ilegal de espécie protegida é proibido, pelo prazo de 25 anos a contar da data do corte ou arranque:
a) Toda e qualquer conversão que não seja de imprescindível utilidade pública;
b) As operações relacionadas com edificação, obras de construção, obras de urbanização, loteamentos e trabalhos de remodelação dos terrenos, de acordo com o definido nas alíneas a), b), h), i) e l) do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro;
c) A introdução de alterações à morfologia do solo ou do coberto vegetal;
d) O estabelecimento de quaisquer novas atividades, designadamente agrícolas, industriais ou turísticas.

Artigo 7º
Utilidade pública e empreendimentos de relevante e sustentável interesse para a economia local

1 - As declarações de imprescindível utilidade pública e de relevante e sustentável interesse para a economia local previstas nas alíneas d) e e) do nº 2 do artigo 4º, competem ao Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, ao Ministro da tutela do empreendimento, se não se tratar de projeto agrícola, e, no caso de não haver lugar a avaliação de impacte ambiental, ao Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território.
2 - Para efeitos da emissão da declaração de relevante e sustentável interesse para a economia local prevista na alínea e) do nº 2 do artigo 4º, os projetos dos empreendimentos são submetidos ao parecer do Conselho Consultivo Florestal.
3 - Para efeitos do nº 1 do presente artigo, o proponente deve apresentar:
a) Uma memória descritiva e justificativa que demonstre tecnicamente o interesse económico e social do empreendimento, a sua sustentabilidade e a inexistência de alternativas válidas quanto à sua localização;
b) A declaração de impacte ambiental quando esta for exigível.
4 – As declarações de imprescindível utilidade pública e de relevante e sustentável interesse para a economia local previstas nas alíneas d) e e) do nº 2 do artigo 4º devem referir, sob pena de invalidade, expressamente, na sua fundamentação, as razões que concreta e casuisticamente justificam a sua emissão.

Artigo 8º
Pedido de autorização
1 - Os pedidos de autorização previstos no artigo 4º são feitos mediante requerimento a apresentar na Direcção-Geral dos Recursos Florestais ou nos Serviços Desconcentrados da Direção Geral dos Recursos Florestais competentes, podendo ainda ser apresentados nos Serviços do Instituto da Conservação da Natureza, caso incidam em superfícies incluídas em áreas classificadas.
2 - Em qualquer circunstância de corte ou arranque é obrigatória a prévia cintagem das árvores a abater com tinta indelével e de forma visível.
3 - A decisão relativa aos pedidos de autorização referidos no artigo 4º deve ser comunicada:
a) No prazo de 60 dias, para os pedidos de autorização elaborados ao abrigo da alínea b) do nº 2 do artigo 4º;
b) No prazo de 90 dias, para os pedidos de autorização elaborados ao abrigo das alíneas a), d), e) ou f) do nº 2 do artigo 4º.
4 - Findo o prazo referido na alínea a) do número anterior sem que tenha sido comunicada a decisão final sobre o respetivo pedido de autorização, deve considerar-se o mesmo tacitamente deferido.
5 - Findo o prazo referido na alínea b) do n.º 3 sem que tenha sido comunicada a decisão final sobre o respetivo pedido de autorização, deve considerar-se o mesmo tacitamente indeferido.
6 - Os prazos referidos nos números anteriores contam-se a partir da data da entrada do requerimento no serviço competente para a decisão de autorização.
7 - O prazo para a remessa do requerimento à entidade competente para a decisão de autorização é de cinco dias.
8 - A Direcção-Geral dos Recursos Florestais e os Serviços Desconcentrados da Direção Geral dos Recursos Florestais devem dar mútuo conhecimento das decisões finais da sua competência no prazo de 15 dias após a conclusão dos respetivos processos.
9 – A Direcção-Geral dos Recursos Florestais faz publicar todos os pedidos de autorizações previstos neste diploma, acompanhados da respetiva decisão e seus fundamentos, em site da Internet da sua responsabilidade e através de editais a afixar na sede dos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente, e nos locais de estilo das Freguesias e Municípios envolvidos.

Artigo 9º
Restrições às práticas culturais
Nos povoamentos espontâneos ou a menos de 5 metros de árvores, arbustos ou conjuntos exemplares, não são permitidas:
a) Mobilizações de solo profundas que afetem o sistema radicular das árvores ou aquelas que provoquem destruição de regeneração natural;
b) Mobilizações mecânicas em declives superiores a 25%;
c) Mobilizações não efetuadas segundo as curvas de nível, em declives compreendidos entre 10% e 25%;
d) Intervenções que desloquem ou removam a camada superficial do solo.

Artigo 10º
Manutenção dos povoamentos
1 - Os possuidores de povoamentos espontâneos são responsáveis pela sua manutenção em boas condições vegetativas, através de uma gestão ativa e de uma correta exploração, devendo ser, para tanto, apoiados pelos Serviços do Ministério da Agricultura.
2 - Nos casos de manifesto abandono dos povoamentos, ou de falta de intervenções culturais por períodos prolongados que possam conduzir à sua degradação ou mesmo perecimento, a Direcção-Geral dos Recursos Florestais notificará os seus possuidores para executarem as ações conducentes a uma correta manutenção dos mesmos.
3 - Os organismos do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas competentes na área florestal articular-se-ão com as estruturas representativas dos interesses dos possuidores de povoamentos de espécies protegidas com vista à promoção de uma correta gestão dos mesmos.
4 - É proibida qualquer operação que mutile ou danifique exemplares de espécies protegidas, bem como quaisquer ações que conduzam ao seu perecimento ou evidente depreciação.
5 – O Ministério da Agricultura deve promover e apoiar a realização de estudos e a publicação e divulgação de manuais silvícolas e de informação sobre as espécies protegidas, com vista a aumentar o conhecimento disponível sobre as mesmas, condição indispensável à sua proteção, promoção do seu plantio e aproveitamento de todas as suas potencialidades ambientais e económicas.
6 – O Estado goza de direito de preferência em caso de venda de prédios ocupados por povoamentos espontâneos de espécies protegidas.

Artigo 11º
Manutenção da área de floresta autóctone
1 - O Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas condicionará a autorização das intervenções previstas nas alíneas d) a f) do número 2 do artigo 4º sobre povoamentos espontâneos, à obrigatoriedade da entidade interessada, como forma compensatória, proceder, sob proposta da Direcção-Geral dos Recursos Florestais, à constituição de novas áreas de povoamento, reposição ou beneficiação de áreas existentes, devidamente geridas, expressas em área ou em número de árvores das mesmas espécies abatidas ou de outras espécies protegidas, caso se mostrem em concreto mais adequadas.
2 - A constituição de novas áreas de espécies protegidas ou a beneficiação de áreas preexistentes devem efetuar-se em prédio com condições edafo-climáticas adequadas à espécie do qual a entidade proponente detenha a propriedade ou o direito de superfície, e abranger uma área nunca inferior à afetada pelo corte ou arranque multiplicada de um fator de 1,25.
3 - Para a elaboração da proposta a apresentar à tutela, a Direcção-Geral dos Recursos Florestais deve solicitar à entidade interessada na intervenção a apresentação de um projeto de arborização e respetivo plano de gestão, e proceder, conjuntamente com os Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente, à sua análise e aprovação.
4 – No caso previsto no número 5 do artigo 4º, o transplante ou plantação de nova planta é obrigatoriamente realizado pelo interessado, em prédio com condições edafo-climáticas adequadas à espécie do qual detenha a propriedade ou o direito de superfície.
5 - Quando a compensação em prédio sobre o qual a entidade interessada detenha a propriedade ou o direito de superfície se mostre impossível ou demasiado oneroso, em virtude de inexistir um tal prédio ou área em prédio adequados, podem os Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente, a pedido daquele, autorizar, em alternativa, a substituição daquela obrigação pelo pagamento de uma taxa, a calcular em função do número e espécie das plantas abatidas, que reverterá para o Fundo Florestal Permanente, com vista a financiar a compensação através do transplante ou plantação devida, em prédio público com as condições exigidas.
6 - Para efeitos do disposto no n.º 1, pode ainda ser exigida à entidade promotora a constituição de garantia bancária, a favor da Direcção-Geral dos Recursos Florestais, com o objetivo de assegurar o cumprimento das medidas nele previstas.
7 – O Ministério da Agricultura faz publicar, de dois em dois anos, um relatório donde conste:
a) a situação e a evolução das espécies protegidas e seus povoamentos em Portugal;
b) balanço das medidas criadas e aplicadas com vista à proteção e fomento das espécies protegidas;
c) inventário dos processos de autorizações previstas neste diploma concedidas e recusadas, bem como das ações de acompanhamento e fiscalização realizadas.
8 – O Governo regulamenta, no prazo de um ano, por portaria, a forma de cálculo da taxa referida no número 5.

Artigo 12º
Fundo Florestal Permanente
1 - É criado no âmbito do Fundo Florestal Permanente:
a) um programa de reflorestação de espécies autóctones destinado a apoiar o fomento e a proteção dos povoamentos florestais de espécies protegidas da flora autóctone portuguesa, bem como a reflorestação de novas áreas, incluindo áreas ardidas, afetadas por doença, desérticas ou em processo de desertificação ou de erosão;
b) um programa de subsidiação à plantação de espécies protegidas a fim de incentivar o seu fomento por parte dos produtores florestais;
c) um programa de compensações para os proprietários que mantenham povoamentos de espécies protegidas em boas condições vegetativas.
2 – O Fundo Florestal Permanente será financeiramente comparticipado por 30% do produto das coimas e pelo produto das taxas previstas, respetivamente, no número 4 do artigo 11º e artigo 15º deste diploma.

Artigo 13º
Embargo
A Direcção-Geral dos Recursos Florestais e os Serviços Desconcentrados da Direção-Geral dos Recursos Florestais poderão requerer ao Tribunal competente o embargo de quaisquer ações em curso que estejam a ser efetuadas com inobservância das determinações expressas no presente diploma.

Artigo 14º
Medidas preventivas
A Direcção-Geral dos Recursos Florestais e os seus Serviços Desconcentrados podem apreender provisoriamente os bens utilizados nas operações ou intervenções em áreas ocupadas por povoamentos de espécies protegidas, ou por exemplares isolados destas espécies, efetuadas com desrespeito ao disposto no presente diploma, assim como adotar as medidas destinadas a fazer cessar a ilicitude.

Artigo 15º
Contraordenações
1 - As infrações ao disposto no presente diploma constituem contraordenações, puníveis com as seguintes coimas:
a) Se implicarem o perecimento de plantas de espécie protegida, com coima de € 150 a € 5.000 no caso de pessoas singulares e de € 5.000 a € 50.000 no caso de pessoas coletivas;
b) Se implicarem apenas a depreciação de plantas de espécie protegida, com coima de € 50 a € 2.500 no caso de pessoas singulares e de € 2.500 a € 15.000 no caso de pessoas coletivas;
c) Se implicarem apenas a violação de outros procedimentos administrativos sem afetar plantas de espécie protegida com coima de € 25 a € 500 no caso de pessoas singulares e de € 500 a € 5.000 no caso de pessoas coletivas;
2 - A tentativa e a negligência são puníveis.

Artigo 16º
Sanções acessórias
Sempre que a gravidade da infração ou da culpa do agente o justifique, o Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas pode aplicar ao infrator as seguintes sanções acessórias:
a) Perda, a favor do Estado, de maquinaria, veículos e quaisquer outros objetos que serviram ou estavam destinados a servir para a prática da contraordenação;
b) Perda, a favor do Estado, dos bens produzidos pela prática da infração, incluindo a cortiça extraída e a lenha obtida;
c) Privação de acesso a qualquer ajuda pública por um período máximo de dois anos.

Artigo 17º
Rearborização de áreas afetadas
1 - Nos casos em que tenha ocorrido corte ou arranque ilegal de povoamento de espécie protegida, os serviços competentes do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas determinarão a rearborização ou beneficiação da área afetada com as espécies previamente existentes.
2 - Os serviços competentes do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas determinarão o prazo, que não poderá exceder os dois anos, e as condições da rearborização ou beneficiação, podendo substituir-se ao possuidor do povoamento na execução destas ações quando este não cumpra a obrigação no prazo e demais condições que lhe forem fixados.
3 - As despesas decorrentes das operações previstas no número anterior constituem encargo do responsável pela obrigação de reposição e a sua falta de pagamento determina a cobrança coerciva do crédito correspondente em processo de execução fiscal.

Artigo 18º
Reflorestação, descontinuidade florestal e espaços verdes
1 - Nos processos de reflorestação de novas áreas ou de recuperação de áreas ardidas, afetadas por doença, desérticas ou em processo de desertificação ou de erosão, será dada preferência às espécies protegidas que, em cada zona, melhor se adaptem às respetivas condições edafo-climáticas.
2 – No caso de área ardida antes ocupada por espécies florestais destinadas primordialmente à produção industrial, designadamente eucalipto e pinheiro bravo, a reflorestação pode ser feita com base nessas espécies mas conterá obrigatoriamente um mínimo de 25% de área de povoamento de espécies protegidas, realizando faixas de descontínuo florestal de, no mínimo, 500 em 500 metros.
3 – No fim do período de exploração de uma área ocupada por espécies florestais destinadas primordialmente à produção industrial, designadamente eucalipto e pinheiro bravo, quando se operar a revolução silvícola com base naquelas espécies, a nova reflorestação terá que conter um mínimo de 25% de espécies protegidas, realizando faixas de descontínuo florestal de, no mínimo, 500 em 500 metros.
4 – Na recuperação, remodelação ou criação de novos espaços verdes ou jardins da responsabilidade de entes públicos, será dada preferência à utilização de espécies protegidas, em particular às mais bem adaptadas ao local em concreto, salvo se houver a específica intenção de criar um jardim botânico para o estudo, conhecimento e divulgação de espécies exóticas.
5 – O Ministério da Agricultura auxiliará os privados que estiverem interessados em recuperar, remodelar ou criar um espaço verde ou ajardinado de fruição pública a adquirir as espécies protegidas mais indicadas.

Artigo 19º
Fiscalização
1 - A fiscalização do disposto no presente diploma compete ao Serviço de Proteção da Natureza (SEPNA) da GNR e restantes forças policiais, bem como aos guardas e vigilantes da natureza.
2 - A instrução dos processos das contraordenações previstas no presente diploma é da competência dos Serviços Desconcentrados da Direção-Geral dos Recursos Florestais.
3 - A aplicação das coimas e a proposta de sanções acessórias competem à Direcção-Geral dos Recursos Florestais ou aos Serviços Desconcentrados da Direção-Geral dos Recursos Florestais, de acordo com as suas competências, nos termos deste diploma.
4 - O produto das coimas, mesmo quando estas são fixadas em juízo, reverte:
a) 10% para a entidade que levantou o auto;
b) 10% para a entidade instrutora;
c) 20% para a entidade que aplicou a coima;
d) 30% para o Estado;
e) 30% para o Fundo Florestal Permanente.

Artigo 20º
Aplicação nas áreas classificadas
1 - Nas áreas classificadas as competências previstas no presente diploma atribuídas ao Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e aos Serviços do Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas são exercidas, respetivamente, pelo Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território e pelos Serviços do Instituto da Conservação da Natureza.
2 - No caso de autorizações concedidas ao abrigo do número anterior, os Serviços do Instituto da Conservação da Natureza deverão comunicar essas autorizações aos Serviços Desconcentrados da Direcção-Geral dos Recursos Florestais competente.
3 - Nos sítios da Lista Nacional de Sítios, nos sítios de interesse comunitário, nas zonas especiais de conservação e nas zonas de proteção especial o exercício das competências previstas no artigo 4º e no artigo 17º carece de parecer favorável do Instituto da Conservação da Natureza.
4 - O parecer mencionado no número anterior deve ser emitido no prazo de 20 dias e dá lugar à suspensão dos prazos previstos no número 3 do artigo 8º, interpretando-se como favorável a falta da sua emissão no referido prazo.

Artigo 21º
Lei especial
O disposto neste diploma não se sobrepõe ao disposto nos restantes regimes legais específicos de determinadas espécies.

Artigo 22º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor um ano após a sua publicação.

Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 5 de junho de 2017.

Acompanhe aqui a evolução desta iniciativa legislativa.
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