A raposa e o saca-rabos são duas espécies de mamíferos de pequeno porte, da fauna selvagem portuguesa, relativamente comuns nas nossas paisagens e zonas rurais.
Estas duas espécies não têm interesse gastronómico nem constituem, comprovadamente, perigo para a segurança, a saúde pública ou para os ecossistemas do nosso país.
A raposa (Vulpes vulpes) é um mamífero canídeo bastante comum em Portugal, existindo em todo o território, excetuando-se as ilhas dos Açores e da Madeira. Apesar de habitar preferencialmente em zonas de floresta, matagal e campos agrícolas, pode também ser encontrada perto das zonas urbanas. O estado de conservação da espécie no nosso território não é preocupante, mas tal como para outras espécies, isso não justifica o seu estatuto de espécie cinegética.
O saca-rabos (Herpestes icneumon) é um mamífero carnívoro que habita em zonas de matagal, e raramente em zonas de pouca vegetação, e, tal como a raposa, apresenta um estatuto de conservação pouco preocupante. Este estatuto de conservação «pouco preocupante» não justifica, em nosso entender, a sua consideração enquanto espécie cinegética.
A preservação da biodiversidade e da função que as espécies desempenham nos ecossistemas gera-nos a responsabilidade de atuar para que os estatutos de proteção (mesmo que com graus diferenciados) não se cinja aos animais domésticos (fundamentalmente o cão e o gato) ou às espécies em vias de extinção. A responsabilidade que temos de valorizar a biodiversidade deve levar-nos, relativamente a espécies não ameaçadas de extinção nos nossos dias, a não aceitar a teoria de que tudo o que mexe pode ser caçado.
O argumento do controlo de populações de espécies não é, no entendimento do PEV, também argumento para manter a raposa ou o saca-rabos entre as espécies cinegéticas, na medida em que, a haver necessidade de controlo de populações, ela deve fazer-se sob a vigilância ou determinação de órgãos que devem ter como preocupação central a erradicação de ameaças à biodiversidade, como o Instituto para a Conservação da Natureza (ICNF).
Com este projeto do PEV, cria-se um mecanismo de proteção adequado para as duas espécies em causa e nem sequer se põe em causa aquilo a que se poderia chamar a verdadeira caça, que nunca por nunca poderá significar atingir um animal pelo simples prazer de matar.
Assim, com o objetivo de retirar a raposa e o saca-rabos da lista de espécies cinegéticas, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projeto de Lei:Artigo 1º
Objeto
1 – A presente Lei proíbe a caça à raposa e ao saca-rabos.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, a presente Lei procede à oitava alteração ao Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto, que estabelece o regime jurídico da conservação, fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua gestão sustentável, bem como os princípios reguladores da atividade cinegética.
Artigo 2º
Interdições
Excecionando os casos a que se refere o artigo 3º da presente Lei:
1 - É interdita a caça à raposa (Vulpes vulpes) e ao saca-rabos (Herpestes icneumon), não podendo estas espécies ser consideradas cinegéticas.
2 - É ainda interdita a captura ou o abate de espécimes de raposa ou saca-rabos em qualquer altura do ano, assim como a perturbação dos seus locais de reprodução e repouso.
Artigo 3º
Correção de efetivos populacionais
Verificando-se a necessidade de se proceder à correção de efetivos populacionais das espécies a que se refere o artigo anterior, a respetiva correção só poderá ocorrer nas seguintes condições:
1 - A existência de censos consistentes, reconhecidos pelo organismo que tutela a conservação da natureza, que comprovadamente revelem um excesso populacional que possa pôr em causa o equilíbrio dos ecossistemas ou constituir perigo para a saúde pública;
2 - As correções populacionais só poderão ser efetuadas por pessoal técnico do organismo que tutela a conservação da natureza, por processos definidos pela equipa técnica e em cada situação.
Artigo 4º
Lista de espécies cinegéticas
É retirado da lista de espécies cinegéticas constante do Anexo I do Decreto Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, a raposa (Vulpes vulpes) e o saca-rabos (Herpestes ichneumon).
Artigo 5º
Alterações ao Decreto-Lei nº 202/2004, de 18 de agosto
Os artigos 87º e 89º do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 87º
Cavalo
1 - A utilização de cavalo só é permitida na caça às espécies de caça maior, à lebre e na caça de cetraria.
2 – (…)
Artigo 89º
Dias de caça
1 – (…)
2 – (…)
3 – (…)
a) A caça ao javali prevista no n.º 2 do artigo 105º, nos meses de janeiro e fevereiro, que pode ser exercida aos sábados;
b) A caça de cetraria e a caça com arco ou besta, que se exerce às quartas-feiras e aos sábados, não coincidentes com dia de feriado nacional obrigatório.
4 – (…).»
Artigo 6º
Revogação
É revogada a alínea c) do número 1 do artigo 84º do Decreto -Lei n.º 202/2004, de 18 de Agosto, e o artigo 94º do Decreto -Lei n.º 202/2004 de 18 de Agosto.
Artigo 7º
Contraordenações
Constituem contra-ordenações a caça e o abate deliberado de espécimes de raposa e saca rabos, salvo as situações previstas na presente lei.
Artigo 8º
Regime sancionatório
As contraordenações podem ser punidas com coima de €500 a €3700.
Artigo 9.º
Aplicação e destino das coimas
O produto das coimas é distribuído da seguinte forma:
a) 10 % para a entidade autuante;
b) 20 % para a entidade que instrui o processo;
c) 10 % para a entidade que aplica a coima;
d) 60 % para o Estado.
Artigo 10.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 5 junho de 2017
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