O turismo em Portugal tem crescido nos últimos anos a um ritmo bastante significativo. Não procuraremos aqui avaliar das causas desse crescimento, sabendo que têm origem interna e externa, mas importa que nos questionemos sobre que tipo de turismo estamos a construir.
A verdade é que o crescimento turístico não raras vezes representa uma destruição dos «ecossistemas» ambientais, sociais e culturais das localidades: veja-se o que representam muitos empreendimentos turísticos, promotores do turismo de massas, quantas vezes construídos numa verdadeira lógica de desordenamento do território, quantas vezes construídos em franca oposição à preservação de valores ambientais, e que são verdadeiras localidades dentro das localidades, ou veja-se a forma como o alojamento local está hoje a esvaziar as cidades dos seus moradores.
Para além disso, o turismo em Portugal tem uma característica de sazonalidade bastante marcada, uma vez que a maior parte da oferta está ligada à praia e à preferência por épocas onde as condições meteorológicas sejam favoráveis. Com esta característica, não é de estranhar que 73% das dormidas do país se concentrem sobretudo no Algarve, na Madeira e na Área Metropolitana de Lisboa. Especificamente no continente, 90,3% das dormidas concentram-se no litoral, o que é um indicador muito claro de uma falta de diversidade de oferta turística.
Estes dados apresentados revelam também que no setor do turismo existe, também, um contributo efetivo para as assimetrias regionais no nosso país.
Os Verdes consideram o setor do turismo relevante, do ponto de vista da dinâmica económica, como não poderia deixar de ser. Porém, o PEV considera que o país está a perder a oportunidade de gerar uma oferta turística sustentável, quase que opondo ou impondo o turismo às populações locais e às atividades económicas locais, sem a devida interação e sem uma matriz ambiental bem vincada.
É com o objetivo de procurar alterar esta realidade que os Verdes propõem, através do presente projeto de lei, que Portugal pense e planeie a melhor forma de implementar e generalizar o ecoturismo, com vantagens muito apreciáveis para o país.
Com efeito, quando falamos da promoção do ecoturismo, falamos de uma política sustentável de turismo que agregue uma componente ambiental social e económica. O ecoturismo implica, assim, necessariamente a manutenção da paisagem característica dos locais, bem como a preservação dos ecossistemas naturais básicos. Por outro lado, integra e interage com as populações locais, com a cultura própria das gentes locais e implica, igualmente, uma simbiose com outros setores económicos, promovendo também a sua dinamização, como o artesanato, a agricultura, a pesca artesanal, o comércio local, gerando aquilo a que se pode chamar de uma dinâmica económica local, com vantagens para as populações locais.
O ecoturismo tem um potencial grande no interior do país, onde o contacto com a natureza pode ser bastante valorizado, e a realização de inúmeras atividades ligadas à natureza podem ser empreendidas, possibilitando a retirada de uma carga pesada de sazonalidade ao turismo.
Mas, para a promoção, o incentivo e a criação de condições para o desenvolvimento do ecoturismo, há todo um conjunto de pressupostos que devem ser garantidos, designadamente (i) a preservação de património cultural e histórico; (ii) o combate e o controlo da poluição, de modo a que não se ofereça às populações locais e aos ecoturistas cenários tão desagradáveis como, por exemplo, os que infelizmente temos conhecido no rio Tejo; (iii) uma rede de transportes públicos sustentável, que facilite a mobilidade das populações e também dos ecoturistas; (iv) uma cultura de segurança que gere confiança nos locais, sendo bastante relevante uma atenção particular sobre a floresta e sobre a dimensão dos fogos florestais.
Para além disso, o ecoturismo pode ser potenciado através de redes nacionais e regionais de promoção e publicidade de centros e produtos de ecoturismo, sendo que os sistemas de certificação podem ter um papel relevante nesse aspeto. Relevante pode também ser o lançamento de programas específicos de apoio financeiro, e não só, aos micro, pequenos e médios operadores, incentivando escolhas ambientalmente sustentáveis, nomeadamente no que respeita à redução e bom encaminhamento de resíduos, ao uso eficiente da água e à eficiência energética.
A Estratégia Turismo 2027 – liderar o turismo de futuro, lançada em março de 2017, assume a natureza como um ativo estratégico do turismo nacional e assume, também, que esse ativo pode ser perdido em caso de sobrecarga turística. É uma evidência, tendo em conta as muitas experiências a esse nível que, infelizmente, já temos em Portugal. É, por isso, determinante que não se perca de vista um sistema de capitação e de respeito pela capacidade de carga dos locais, que garanta a sustentabilidade local e regional do turismo, num exercício de ecoturismo. Uma coisa é evidente – uma opção política pela aposta no ecoturismo é uma opção que contraria a generalização do turismo de massas e põe os olhos num turismo ligado ao contacto e ao conhecimento das pessoas, dos hábitos, das culturas, do património natural, do respeito pelos ecossistemas. Sublinhamos aqui que este é um potencial de valor para a dinamização do interior do país e, em particular, do nosso mundo rural.
O ecoturismo é mais abrangente, a vários níveis, do que o turismo da natureza, sendo este último mais vocacionado para as áreas protegidas em concreto, e programado através da Resolução do Conselho de Ministros nº 51/2015, de 21 de julho, a qual aprova o novo Programa Nacional de Turismo da Natureza, revogando o de 1998.
Com o objetivo de desenvolver o ecoturismo em Portugal e de promover uma rede de oferta ecoturística, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1º
Objeto
A presente lei visa a criação de programas regionais de ecoturismo, adiante designados por PRE.
Artigo 2º
Âmbito
Para efeitos do presente diploma, o ecoturismo abrange os estabelecimentos, as estruturas e as atividades turísticas certificados pelos Ministérios que tutelam o ambiente e o turismo, com base, designadamente, na garantia cumulativa de:
a) preservação das paisagens características;
b) conservação da biodiversidade e dos ecossistemas naturais básicos;
c) integração e promoção de relações de proximidade com as populações locais e com a sua cultura própria;
d) articulação com outros setores económicos locais e atividades sustentáveis;
e) eficiência no uso de água, de energia e contenção na produção de resíduos.
O modelo de certificação previsto no número anterior é definido pelo Governo.
Artigo 3º
Programas regionais de ecoturismo
1 - Até à instituição das regiões administrativas, são criados cinco PRE, correspondentes às áreas geográficas abrangidas pelas Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR).
2 - Para cada PRE é constituído um grupo de trabalho, criado por despacho dos Ministérios que tutelam o ambiente e a economia.
3 - Os grupos de trabalho que têm por missão construir os PRE são compostos, designadamente, por:
a) um representante do Ministério da Economia;
b) um representante do Ministério do Ambiente;
c) um representante do Ministério da Agricultura;
d) um representante do Ministério da Cultura;
e) um representante da CCDR respetiva;
f) um representante de cada um dos municípios da região;
g) dois representantes de organizações não-governamentais de ambiente.
4 - Os PRE determinam e programam, designadamente:
a) a aplicação do sistema de certificação previsto no artigo 2º da presente lei;
b) a capacidade de carga de cada área geográfica em causa, e sua distribuição, no que respeita a projetos de ecoturismo;
c) as formas de promoção do ecoturismo na região;
d) os programas e os modos de apoio ao ecoturismo, com prevalência para as estruturas familiares e micro, pequenas e médias operadoras;
e) o sistema de transportes públicos que gere mobilidade e acessibilidade para as estruturas, equipamentos e atividades de ecoturismo;
f) a divulgação do património natural, cultural e histórico da região;
g) as necessidades de investimento na preservação do património natural, cultural – material e imaterial - e histórico da região;
h) a valorização dos produtos regionais;
i) a importância do ecoturismo para a sensibilização, a educação ambiental e escolhas ambientalmente responsáveis
Artigo 4º
Monitorização
Os Ministérios do Ambiente e da Economia têm a responsabilidade de elaborar, e tornar público, um relatório nacional bianual de acompanhamento e monitorização da aplicação dos PRE e de avaliação da evolução da oferta ecoturística nas diversas regiões.
Artigo 5º
Regulamentação
O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 90 dias.
Artigo 6º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à data da sua publicação.
Acompanhe
aqui a evolução deste Projeto.