Pesquisa avançada
 
 
Projetos de Resolução
Partilhar

|

Imprimir página
22/01/2016
Projeto de Resolução 110/XIII - Por uma gestão pública e ao serviço das populações do Hospital de São João da Madeira e pelo necessário melhoramento em meios humanos e materiais
Ver progresso desta inciativa clique aqui

A política de saúde do anterior governo PSD/CDS-PP pode ser sintetizada em quatro pontos: primeiro, cortes cegos; segundo, encerramento de serviços por todo o País; terceiro, um esforço deliberado no sentido de empurrar os custos para o utente; quarto e último, uma clara e indisfarçável preocupação com os interesses do setor privado na área da saúde, incluindo a privatização/concessão de hospitais de gestão pública.

Orientações claramente indisfarçáveis e inseparáveis da linha ideologia intrínseca à direita, que colocou em causa o acesso aos cuidados de saúde pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e que teve repercussões não só a curto, mas também como se está a constatar, a médio e longo prazo.

A opção ideológica do anterior governo está claramente vincada no Decreto-Lei n.º 138/2013, de 9 de Outubro, ou seja: desmantelar o Serviço Nacional de Saúde, enquanto realça um claro favorecimento das entidades privadas.

O referido Decreto-Lei para além de definir as formas de articulação do Ministério da Saúde e dos estabelecimentos e serviços do SNS com as Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), estabelece também o regime de devolução dos hospitais das misericórdias que foram integrados no setor público, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 704/74, de 7 de dezembro e do Decreto-Lei n.º 618/75, de 11 de novembro, e que são atualmente geridos por estabelecimentos ou serviços do SNS.

Segundo o artigo 13.º, do Decreto-Lei n.º 138/2013, de 9 de Outubro, os hospitais que foram integrados no setor público e que são atualmente geridos por estabelecimentos ou serviços do SNS, podem ser devolvidos às misericórdias mediante a celebração de acordos de cooperação com a duração de 10 anos e diminuindo os encargos globais do SNS, em 25%, relativamente à alternativa de prestação de serviços públicos pelo setor público.

Ora, o caminho que estava a ser seguido pelo PSD/CDS de passar a gestão dos hospitais para as misericórdias era uma privatização encapotada com o objetivo de desmantelar o Serviço Nacional de Saúde. A redução em 25% da despesa global face à gestão pública mais não é mais que uma falácia, pois pressupõe a redução de serviços, de meios humanos e materiais e, claro, também uma redução dos direitos laborais dos trabalhadores.

O Hospital Distrital de São João da Madeira que está integrado desde 2009, em conjunto com o Hospital de São Miguel (Oliveira de Azeméis) e o Hospital de São Sebastião (Santa Maria da Feira) no Centro Hospitalar Entre o Douro e Vouga, EPE (CHEDV) recebe utentes de uma área geográfica que abrange a população de S. João da Madeira, Vale de Cambra, Arouca e também de Oliveira de Azeméis e Santa Maria da Feira.

O Hospital Distrital de São João da Madeira tem, na última década, de forma progressiva e continuada, perdido valências e serviços. De referir, em primeiro lugar, o encerramento do serviço de atendimento de urgência, mas também das especialidades de Cirurgia, Ortopedia, Urologia, Oftalmologia e Otorrinolaringologia. Com a redução de valências e serviços, o hospital tem vindo paralelamente a perder os seus meios humanos e materiais, sem que tenham sido devidamente acautelados os interesses dos utentes.

O esvaziamento deste hospital, sobretudo o encerramento do serviço de urgência, em conjunto com o emagrecimento de outras unidades de saúde da região, através da redução dos serviços e horários, de valências e de profissionais, criam um efeito de sobrecarga e de afunilamento em outros hospitais, nomeadamente no Hospital de São Sebastião (previsto e construído para um âmbito e abrangência inferior à que agora detém) e que se vê incapaz de dar uma resposta adequada ao aumento de doentes, por falta de meios humanos e materiais, como se constatou no início de 2015.

O Hospital de São Sebastião não satisfaz plenamente as necessidades da população da área geográfica abrangida pelo Hospital Distrital de São João da Madeira, que não só se relaciona com a diminuição da proximidade e de acessibilidade aos cuidados de saúde urgentes deste hospital, como também com a morosidade dos tempos de espera no atendimento, sobretudo devido ao efeito de concentração dos utentes.

No seguimento da redução de serviços e valências, depois de algumas tentativas como em outras unidades de saúde pelo país, a gestão do Hospital de São João da Madeira foi transferida para a Santa Casa da Misericórdia de São João da Madeira através de acordo de cooperação. Trata-se de uma privatização encapotada, que veio prosseguir a opção ideológica da direita de desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde, favorecendo claramente os privados, dificultando e limitando cada vez mais o acesso dos utentes aos serviços públicos de saúde.

A transferência do Hospital de São João da Madeira para a Misericórdia teve a contestação e o desacordo de profissionais de saúde e de utentes. Entre outras ações, foram realizadas uma manifestação em julho de 2015 e a elaboração de uma petição subscrita por 9201 cidadãos, reivindicando a reabertura do serviço de urgência do Hospital de S. João da Madeira e a continuidade desta unidade hospitalar no Serviço Nacional de Saúde, de gestão pública.

Embora com a evidente oposição da população, o anterior governo PSD/CDS prosseguiu com o acordo de cooperação com a Santa Casa da Misericórdia de São João da Madeira, afirmando que a transferência tinha em vista os interesses da população. Uma estranha forma de governar. De salientar que o acordo foi celebrado a 12 de novembro, numa altura em que o governo PSD/CDS já estava demitido de funções pela Assembleia da República.

O acordo de cooperação previa a transmissão da gestão do Hospital para a Misericórdia a partir de 1 de Janeiro de 2016, para a Santa Casa da Misericórdia de São João da Madeira por um período de 10 anos, prevendo a redução do orçamento geral, de forma falaciosa, em 25%, pois seria à custa da redução de salários, meios materiais e serviços, sem que se verificasse alguma mais valia para os serviços e utentes.

Recentemente, o Ministério da Saúde decidiu anular a passagem do Hospital para a alçada da Santa Casa da Misericórdia de São João da Madeira, considerando que existem fundadas dúvidas sobre a efetiva defesa do interesse público e “que os Acordos de Cooperação foram objeto de homologação pelo então Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, em 12 de novembro de 2015, após a rejeição do Programa do XX Governo, de que era membro, a 10 de novembro de 2015, não tendo sido acompanhados de qualquer fundamentação quanto à necessidade urgente e inadiabilidade do ato, ao contrário do que exige a Constituição da República Portuguesa”.

Esta decisão vem de encontro ao que “Os Verdes” defendem, que só a gestão pública dos hospitais públicos, tais como o Hospital Distrital de São João da Madeira, assegura as condições de acesso aos cuidados de saúde dos utentes do SNS, de forma universal.

Contudo, com o processo de transferência do Hospital para a misericórdia local, iniciado há algum tempo, acentuou-se, direta e indiretamente, a redução de valências, de meios humanos e materiais. Por exemplo, devido à instabilidade gerada, alguns profissionais de saúde optaram por solicitar a transferência para outros locais e postos de trabalho.

Ao nível das valências, o acordo de cooperação assinado com a misericórdia e a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. (ARS Norte) pressupunha a saída da valência da unidade de dor (em 2013, foram realizadas 641 sessões da consulta de dor) e do hospital de dia de psiquiatria. Neste sentido, estando a transferência prevista para o início de 2016, a unidade de dor aberta em outubro de 2010, passou desde o início do ano para o Hospital de São Miguel, em Oliveira de Azeméis.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a transferência para os privados, conforme pretendia o PSD/CDS, é lesiva para o interesse das populações abrangidas por esta unidade de saúde, sendo necessário garantir que o Hospital de Distrital de São João da Madeira, que está integrado no CHEDV, se mantenha na esfera pública integrado no Serviço Nacional de Saúde, pelo preceito constitucional de que a saúde é um direito universal, geral e tendencialmente gratuito, garantido pelo Estado.

Em segundo, face à complexidade e instabilidade que este processo gerou é necessário que o governo trave o esvaziamento do hospital, nomeadamente no que estava previsto no acordo de cooperação, como o encerramento do hospital de dia de psiquiatria, mas também que garanta o retorno de valências e serviços, desde logo a unidade de dor.

Em terceiro, é necessário dotar o hospital com profissionais de saúde e meios materiais capazes de garantir a qualidade dos serviços de saúde que os utentes necessitam.

Por último, tendo em conta o esvaziamento que se tem verificado em anos anteriores é necessário que o governo reponha os serviços e valências que foram retirados do hospital no passado.

O Grupo Parlamentar “Os Verdes” propõe, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1- Mantenha o Hospital Distrital de São João da Madeira na esfera pública, integrado no Serviço Nacional de Saúde, rejeitando a entrega da sua gestão a entidades privadas, como a Santa Casa da Misericórdia;

2- Assegure e restabeleça os serviços e valências que estavam previstas com o acordo de cooperação com a Santa Casa da Misericórdia de São João da Madeira;

3- Dote o hospital com profissionais de saúde e meios materiais capazes de garantir a qualidade dos serviços de saúde que os utentes necessitam, libertando-se assim igualmente, o hospital de São Sebastião da superlotação que alguns serviços padecem;

4- Restabeleça e alargue os serviços e valências retirados nos últimos anos do Hospital de S. João da Madeira, em prol de um melhor serviço de saúde na região.

Assembleia da República, 22 de janeiro de 2016
Os Deputados,
José Luís Ferreira
Heloísa Apolónia
Voltar