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16/05/2018
Projeto de Resolução Nº 1620/XIII/3ª - Implementação de medidas de reforço da capacidade de intervenção das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ)
A Declaração Universal dos Direitos da Criança, proclamada pela Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas n.º 1386, de 20 de Novembro de 1959, e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, adotada em 1989 e que entrou em vigor em 2 de setembro de 1990, ano em que Portugal a ratificou, reconhecem e consagram um amplo conjunto de direitos fundamentais, que englobam as obrigações das famílias, da sociedade e do Estado em relação à criança e ao adolescente que, pela sua vulnerabilidade, têm uma condição específica dentro da proteção estabelecida nos direitos humanos.

Esta Convenção não constitui apenas uma declaração de princípios gerais, pois a sua ratificação representa um vínculo jurídico para os Estados que a ela aderem.

Uma das formas de dar resposta à proteção das crianças e jovens em risco foi a criação, em 1991, através do Decreto-Lei n.º 189/91, de 17 de maio, das CPCJ - Comissões de Proteção de Crianças e Jovens -, instituições oficiais que visam promover e proteger os direitos das crianças e dos jovens e que, ao longo dos anos, foram alvo de algumas remodelações, nomeadamente através da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro (Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo), a que se seguiram várias alterações através da Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto, da Lei n.º 142/2015, de 08 de setembro e da Lei n.º 23/2017, de 23 de maio.

Desta forma, a Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo explicita que a proteção das crianças e jovens e a promoção dos seus direitos incumbe às Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude (ECMIJ), às Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) e aos Tribunais.

Assim, as CPCJ têm como missão intervir quando está em risco ou perigo a segurança, a saúde, a educação ou o desenvolvimento integral da criança, como nos casos de abandono, maus tratos físicos e psíquicos, abuso sexual, trabalho infantil ou comportamentos desviantes, e são constituídas por técnicos com valências e origens institucionais diversificadas, que analisam anualmente milhares de processos.

As CPCJ apresentam duas modalidades de funcionamento: as comissões alargadas, cuja competência é promover os direitos das crianças e jovens, bem como prevenir as situações de perigo que podem afetar os mesmos, e as comissões restritas, às quais compete a intervenção nas situações identificadas como de risco ou perigo para a criança ou jovem, devendo proceder ao diagnóstico e instrução do processo, decisão, acompanhamento e revisão das medidas de promoção e proteção.

De acordo com os dados revelados pelo relatório de avaliação da atividade das CPCJ referente a 2016, durante esse ano foram comunicadas às CPCJ 39.194 situações de crianças e jovens em perigo, cujas sinalizações foram feitas por entidades públicas e privadas e por cidadãos.

As 308 CPCJ (apesar de existir mais uma, apenas foi instalada no final do ano) e os respetivos membros acompanharam 72.177 processos, correspondendo a 71.016 crianças ou jovens. Quer isto dizer que 3,7 em cada 100 crianças portuguesas foram acompanhadas por estas Comissões, em 2016. Durante esse ano, foram arquivados 38.845 processos e transitaram 33.332 para o ano seguinte.

As principais razões que levam as CPCJ a intervir são a violência doméstica, a negligência, onde se destacam as situações em que as crianças e jovens ficam entregues a si próprias durante largos períodos do dia, e o abandono escolar ou faltas persistentes na escola.

É de salientar que os técnicos das CPCJ, e as instituições que representam (autarquias, serviços da Segurança Social, serviços ligados à educação e à saúde, entre outras), lidam diariamente com problemas particularmente complexos e, muitas vezes, com um número muito elevado de casos. Em 2016, houve 44 comissões que acompanharam mais de 500 processos, e 11 tiveram mais de mil processos.

Apesar da existência de um conjunto de legislação nacional e internacional, a realidade é que, nos dias de hoje, milhares de crianças e jovens em Portugal veem-lhes ser negados os seus direitos, vivendo sob várias formas de discriminação e de violência, impondo-se, há vários anos, um reforço das medidas de apoio às CPCJ, para que sejam garantidas todas as condições indispensáveis ao seu funcionamento e para que possam dar uma resposta célere e eficaz a todas as situações, tendo presente que o próprio contexto económico e social e a falta de meios condicionam a capacidade de intervenção de muitas CPCJ.

É de destacar que, ao longo dos anos, têm sido identificados vários constrangimentos ao cumprimento da missão das CPCJ, regularmente referidos nos seus relatórios de avaliação da atividade, como o facto da informação de que os técnicos dispõem ser, por vezes, limitada; a carência de recursos, agravada pela saída de técnicos, sendo inaceitável que um técnico tenha que acompanhar 80 ou 100 processos; o insuficiente número de horas atribuído pelas entidades aos seus representantes; a falta de apoio financeiro; o aumento da complexidade do acompanhamento dos processos, a que não correspondeu um reforço das equipas; a carência de técnicos a tempo inteiro nas comissões restritas, o que pode prejudicar a natureza multidisciplinar das equipas (há CPCJ sem um técnico a tempo inteiro, o que é inadmissível); a falta de condições dos espaços onde estão instaladas as CPCJ; a escassez de estruturas de acolhimento temporário e de emergência; a falta de respostas sociais e de tempo para trabalhar presencialmente com as famílias, entre outros.

Ora, é entendimento do Partido Ecologista Os Verdes que não podemos continuar a assistir a uma desresponsabilização da Administração Central nesta matéria, ao mesmo tempo que vai empurrando essa responsabilidade para as autarquias, nomeadamente, a nível da dinamização das comissões restritas. Efetivamente, hoje, o funcionamento de muitas CPCJ está dependente da resposta dada pela autarquia, designadamente a nível das instalações e dos próprios técnicos disponibilizados.

É igualmente importante recordar que as CPCJ passaram a poder englobar, nas suas medidas de proteção, jovens até aos 25 anos de idade, se estiverem a estudar ou em processo de formação profissional, e cujo pedido de manutenção de apoio seja renovado pelo jovem, sendo fundamental adequar e reforçar as respostas às novas realidades.

Em 2016, as CPCJ tinham registados 5.422 membros, dos quais 4.144 (76,4%) em representação de entidades e 1.278 (23,6%) cooptados. Do total de membros, 2.443 (45,1%) integravam a modalidade restrita e, destes, 707 eram cooptados.

Os Municípios e a Segurança Social disponibilizaram em média, respetivamente, 15 e 12 horas aos seus representantes, enquanto o Ministério da Saúde disponibilizou 7 horas e o Ministério da Educação disponibilizou, em média, 29 horas semanais aos seus representantes. A este propósito, importa esclarecer que a avaliação de desempenho docente também acaba por representar prejuízos para os professores que prestam serviços nas CPCJ.

Ora, o número de horas semanais, em média, afetadas pelas entidades aos seus representantes nas comissões restritas, é manifestamente insuficiente.

A realidade evidencia-nos que, apesar da entrada de alguns técnicos a nível das comissões alargadas, as equipas das comissões restritas têm vindo a diminuir desde 2013, ano em que o número total de processos ultrapassou a barreira dos 70 mil. Ou seja, mais processos foram acompanhados por menos profissionais que trabalham diretamente nos casos.

Esta questão coloca-se com maior relevância para os membros que integram as comissões restritas, pela natureza das suas atribuições, mas subsiste, igualmente, para os membros das comissões alargadas.

Face ao exposto, e tendo em conta que a proteção de crianças e jovens é um assunto de extrema importância, facilmente se depreende que todas estas situações trazem dificuldades acrescidas às CPCJ, pondo em risco as suas atribuições, funcionamento e missão de proteção das crianças e jovens em risco, situação que é urgente inverter.

Perante esta realidade, é fundamental valorizar o papel das CPCJ, compreender a complexidade da sua ação, de quem tem a vida de crianças nas suas mãos e de quem, com todas as limitações e constrangimentos conhecidos, tenta diariamente, com toda a dedicação e empenho, fazer tudo para proteger as crianças.

Há muito ainda a fazer e as CPCJ e as crianças precisam de mais para que se consiga responder a cada situação em concreto, dando especial atenção à ação preventiva, pelo que se impõe que o Estado cumpra com as suas obrigações consagradas na Constituição da República Portuguesa, no que diz respeito à proteção das crianças e jovens.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Partido Ecologista Os Verdes apresentam o seguinte Projeto de Resolução propondo que a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1. Adote as diligências necessárias com vista a resolver a significativa falta de técnicos afetos às CPCJ, considerando a realidade de cada Comissão, por forma a garantir a sua capacidade de intervenção e o efetivo cumprimento da sua missão.

2. Em articulação com as CPCJ, implemente as medidas necessárias com vista a resolver o problema de falta de estruturas de acolhimento temporário e de emergência, permitindo dar uma resposta mais célere e eficaz às crianças e jovens em risco.

3. Desenvolva os procedimentos necessários, em articulação com as CPCJ, com vista a colmatar a falta de respostas sociais e garantir condições efetivas para o trabalho presencial e integrado com as famílias das crianças e jovens.

4. Diligencie no sentido da resolução dos problemas a nível das instalações das CPCJ, garantindo a qualidade, a adequação, a segurança e a igualdade de tratamento a todas as crianças acompanhadas por estas Comissões.

Acompanhe aqui a evolução deste Projeto do PEV.
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