A profissão centenária de guarda-rios, que perdurou entre os séculos XIX e século XX foi extinta em 1995, pelo governo do PSD de Cavaco Silva, através do Decreto-lei 143/95, de 14 de junho, uma carreira no âmbito do domínio hídrico, com competências atribuídas pelo Decreto n.º 8 de 5 de dezembro de 1892.
Os guarda-rios assumiam um papel central na gestão das áreas pertencentes aos Domínio Público Hídrico. No início do século o território hidrológico estava dividido e coberto em cantões, centrada na bacia-vertente como unidade de planeamento permitindo um melhor desempenho dos guarda-rios no exercício das suas funções.
Aos guarda-rios cabia a função polivalente de guarda, vigilância, proteção e conservação das margens, rios, ribeiros, canais, valas, pontes e aquedutos, dos marcos quilométricos e higrométricos, passando pela fiscalização da extração clandestina das areias dos rios, da pesca clandestina, do corte de árvores, situações de depósito de resíduos e de descargas de águas residuais, entre outras.
Para além das funções referidas anteriormente, devido ao trabalho e conhecimento de terreno, os guarda-rios emitiam igualmente informações e pareceres sobre determinadas obras, nomeadamente muros de suporte junto aos rios.
Os guarda-rios, para além de serem agentes de fiscalização pela sua presença constante nas zonas ribeirinhas, tinham um papel persuasor, de sensibilização e informação, acompanhando as pessoas e as suas atividades procurando igualmente solução in loco para determinados problemas ligados aos recursos hídricos. Mais do que levantar autos de notícia, e de uma atitude repressiva, o guarda-rios tinha um papel protetor e preventivo de forma a evitar a ocorrência de infrações.
Pela sua presença e função os guarda-rios, podemos dizer, eram um elemento constituinte dos ecossistemas ribeirinhos, um agente de proximidade reconhecido e respeitado pela população que dava vida às margens dos cursos de água. Ainda hoje, passados mais de duas décadas da extinção da profissão, nas áreas rurais muitas pessoas ainda se lembram destes guardas e das suas histórias e até dos seus percursos pelas margens dos rios e ribeiros.
A sua importância foi uma evidência, uma vez que, tendo por base a sua função e a necessidade de salvaguarda dos rios e ribeiros existem hoje associações e entidades que promovem ações junto das populações e das escolas alusivas aos guarda-rios.
No início dos anos 90 houve uma inversão do seu papel de décadas, pois os serviços centrais estavam mais preocupados com os resultados e lucros das coimas, do que com a prevenção, levando a que alguns destes guardas abandonassem a profissão. Em 1994, um ano antes da sua extinção, existiam em todo o país cerca de 400 guarda-rios, um número muito diminuto quando comparado com o existente em meados do século XX.
Em 1995, a figura de guarda-rios foi extinta e integrada na carreira de vigilante da natureza. Numa lógica de esvaziamento de meios humanos e materiais dos serviços públicos em geral, e dos serviços florestais e de conservação da natureza em particular, associada à intenção e privatização de bens ambientais, nomeadamente a água, o número de efetivos dos vigilantes da natureza, nos últimos 15 anos foram reduzidos para metade.
Os Verdes, no âmbito desta solução governativa, têm negociado com o Partido Socialista aumentar o corpo de vigilantes da natureza, tendo o governo aumentado em 50, no ano de 2017, prevendo-se mais 30 em 2018, no entanto continuam a ser manifestamente insuficientes face aos setecentos que seriam necessários para exercerem funções.
Face aos problemas ambientais, nomeadamente de descargas de águas residuais que se têm verificado de forma transversal pelos vários cursos de água no país, sejam este de maior ou menor caudal, e à reduzida monitorização e fiscalização, face ao número extremamente reduzido de recursos humanos, tem sido abordada e discutida na opinião pública a necessidade de ressurgir a figura do guarda-rios.
Nas jornadas parlamentares do Partido Ecologista Os Verdes, realizadas nos dias 26 e 27 de março, sob o tema “Rio Tejo – Poluição e outros conflitos”, foi referida, nas visitas e na audição pública promovidas, a importância dos guarda-rios na preservação dos recursos hídricos e a necessidade de recuperar esta profissão para travar os sucessivos atentados ambientais no meio hídrico.
Os rios e ribeiros têm sido expostos a grandes atentados ambientais, uns mais mediatizados do que outros, e que têm sido encarados como um autêntico cano de esgoto a céu aberto e/ou uma ETAR para depurar e diluir a matéria orgânica, com impactos extremamente negativos para a biodiversidade, levando à morte dos elementos vivos dos rios (fauna e flora), paras as atividades lúdicas e económicas e para a própria saúde pública, pois muitas destas águas servem para irrigação e para abastecer a população.
Por muito que se constate a poluição jusante, e que esta advém de atividades agro-pecuárias e industriais, da falta de saneamento, ou da inexistência deste e ou debilidades do seu tratamento e se conheçam os efeitos, continua a existir um desconhecimento efetivo, relativamente às fontes concretas de poluição e a sua localização, por falta de fiscalização face aos limitados recursos humanos.
Atualmente, face às políticas seguidas pelos diversos governos, o número de vigilantes da natureza, na ordem dos 300 efetivos são manifestamente inferiores ao necessário e por outro lado, face ao reduzido corpo estão afetos principalmente à vigilância das áreas protegidas.
De forma a complementar a atividade de vigilância da natureza, por um lado, e em complemento do Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente da GNR, que têm intervenção muito ampla, torna-se necessário recuperar uma função específica de vigilância dos rios e suas bacias hidrográficas, que era desempenhada pelos guarda-rios.
Neste sentido, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Resolução:Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera recomendar ao Governo a recuperação da profissão de guarda-rios, com o número adequado de recursos humanos necessários à preservação e fiscalização dos recursos hídricos.
Acompanhe
aqui a evolução deste Projeto do PEV.