Quando falamos de desperdício alimentar, falamos de alimentos destinados ao consumo humano que acabaram por ser inutilizados em quantidade ou em qualidade.
Do ponto de vista ambiental é doloroso que sejam esbanjados recursos naturais para produzir bens alimentares que depois acabam no lixo. Os impactos ambientais das diferentes fases da cadeia alimentar (e.g. degradação do solo, saturação de recursos hídricos, perda de biodiversidade, produção de resíduos, gasto de energia, emissão de gases com efeito de estufa) poderiam ser significativamente reduzidos se não se verificassem altos níveis de desperdício.
Do ponto de vista social é angustiante que se deitem literalmente fora um conjunto significativo de alimentos que poderiam contribuir para satisfazer necessidades básicas alimentares de uma parte da população. A injusta repartição da riqueza e as políticas de empobrecimento repercutem-se de uma forma inaceitável no acesso aos bens fundamentais para satisfação das mais elementares necessidades da população, como têm demonstrado diversos relatórios como o do INE sobre a pobreza, as desigualdades e a privação material em Portugal.
É ao longo de toda a cadeia agroalimentar que se verificam situações de desperdício alimentar com causas variadas – dos solos ao prato: na produção, no processamento, no armazenamento, no embalamento, no transporte, na disponibilização nos pontos de venda e no consumo. Quanto mais longa for essa cadeia, maior é a probabilidade de desperdício. Essa tem sido a tendência decorrente da deslocalização de grande parte da população para as cidades, ou da globalização do setor alimentar, que geram um distanciamento imenso entre o produtor e o consumidor, obrigando à existência de uma longa corrente de intermediários e a que os produtos levem mais tempo a chegar ao consumidor, com enormes prejuízos ambientais.
O primeiro passo necessário para combater as perdas alimentares é ter consciência que o problema existe. O segundo passo é perceber com rigor as suas causas. Conhecidos os fatores que geram o desperdício, ficam criadas as condições para a definição de objetivos e metas para pôr fim ao problema. Realçamos também que o sucesso da aplicação de medidas para cumprimento dos objetivos depende do forte envolvimento da sociedade e de todos os agentes implicados.
Já foi produzido um estudo em Portugal sobre as perdas alimentares - o PERDA (Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar) - que veio concluir que anualmente se desperdiça mais de 1 milhão de toneladas da produção alimentar, representando um valor na ordem de, pelo menos, 17% de desperdício, embora se reconheça da necessidade de aprofundar estes números e precisar os valores. Este estudo, sendo bastante relevante, constitui apenas uma estimativa.
Ora, para intervir eficazmente sobre o problema é importante conhecer os valores de que partimos e, para o efeito, conhecer mais aproximadamente os níveis e fatores de desperdício alimentar em Portugal, nas diversas fases da cadeia alimentar e tendo em conta todos os projetos que já se encontram implementados «no terreno», de modo a combater esta realidade.
Por outro lado, é imprescindível que se conheça quais são os obstáculos, legais e outros, ao combate ao desperdício alimentar, ou, dito de outra forma, que, mesmo inconscientemente, acabam por fomentar as perdas e a falta de qualidade alimentar, como, por exemplo, o facto de nas cantinas públicas se relevar o preço, em detrimento do valor económico, social e ambiental dos alimentos.
Tendo em conta os objetivos que levaram à criação da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, criada pelo Despacho nº14202-B/2016, de 25 de novembro (sustentado na Resolução da Assembleia da República nº65/2015, de 17 de junho, a qual resultou de uma iniciativa do PEV – o Projeto de Resolução nº1506/XII/2ª), Os Verdes consideram muito relevante que a elaboração de uma Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (ENCDA) e de um Plano de Ação de Combate ao Desperdício Alimentar (PACDA) não afaste a realização do diagnóstico que é preciso fazer. São instrumentos que podem ser construídos em paralelo, acabando por se cruzar pela monitorização e adaptação de objetivos que será sempre necessário ir fazendo.
Assim, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Resolução:Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo que seja elaborado um diagnóstico - com a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, equipas multidisciplinares e a participação de associações e entidades responsáveis - que vise o conhecimento mais pormenorizado sobre os níveis e fatores de desperdício alimentar em Portugal, assim como dos obstáculos existentes ao seu efetivo combate.
Acompanhe
aqui a evolução do Projeto de Resolução.