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18/05/2016 |
Sobre a proibição da aplicação de produtos contendo glifosato (DAR-I-69/1ª) |
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Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia - Assembleia da República, 18 de maio de 2016
1ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Sr. Ministro, a posição de Os Verdes, relativamente a esta matéria, é conhecida. De resto, no passado mês de abril, foi também aqui discutido um projeto de resolução de Os Verdes, que propunha justamente a interdição do uso do glifosato, dado aquilo que se conhece em termos dos seus efeitos para a saúde pública. Infelizmente, esse projeto de resolução foi chumbado, com os votos contra do PSD e do CDS, a abstenção do PS e os votos a favor dos restantes grupos parlamentares.
Também no último debate quinzenal, o Sr. Ministro, uma vez que esteve presente, ouviu Os Verdes interpelarem o Sr. Primeiro-Ministro relativamente a esta matéria do glifosato, pedindo mão firme ao Governo, em Bruxelas, para a não renovação da licença do uso do glifosato.
O Sr. Ministro vem aqui hoje anunciar que a posição do Governo não será contra, mas de mera abstenção. Quero dizer-lhe, cara a cara, Sr. Ministro, que Os Verdes não se identificam com essa posição do Governo português. Consideramos que o Governo, face a tudo aquilo que se conhece e a mais uma coisa que já vou referir, deveria assumir um voto contra. E essa coisa que quero referir chama-se «princípio da precaução», o princípio da precaução que toda a gente usa nos discursos, mas, quando é para passar à prática, é só para pontapear.
E, Sr. Ministro, aquilo que o princípio da precaução diz é que, caso os dados científicos não permitam uma avaliação completa do risco — e, como sabemos, já foram aqui anunciados vários estudos —, caso não se chegue mesmo a essa avaliação completa do risco, pode impedir-se a distribuição ou retirar do mercado produtos suscetíveis de serem perigosos. E é perante isso que estamos.
De facto, a Organização Mundial de Saúde, através da sua Agência Internacional de Investigação em Cancro, veio associar o glifosato à potencialidade de cancro.
E, Sr. Ministro, nós sabemos que a Monsanto, que é quem ganha muito neste mundo com a comercialização do glifosato, só em 2015, lucrou mais de 1000 milhões de euros com herbicidas à base de glifosato.
E, agora, pergunto: alguém nesta Casa é ingénuo? Alguém nesta Casa desconhece qual é o peso do grande poder económico sobre o poder político? Mas alguém nesta Casa quer que esse peso do poder económico sobre o poder político continue? É que alguém nesta Casa quer o poder político a liderar as relações económicas e o bem-estar das populações — e esse alguém somos também nós, Os Verdes.
É por isso, Sr. Ministro, que há coisas que nos fazem uma confusão tremenda. Sabendo que o glifosato não é pesquisado, digamos, em coisas que afetam diretamente a saúde humana, como a água ou os alimentos, por que é que não se fazem essas análises completas? Porquê esta necessidade do desconhecimento? Porquê este assobiar para o lado, sabendo que o cancro causado pelo glifosato, o linfoma não-Hodgkin, tem uma incidência larguíssima em Portugal? Porquê ignorar estas situações?
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, em particular, Os Verdes registam esta intenção do Governo, de proibir o glifosato em determinadas áreas urbanas. Mas devemos ir mais longe, não devemos tomar só medidas parciais. Quando um produto é perigoso, é perigoso em todo o lado. E, então, devemos ser determinados na sua erradicação. Por exemplo, num projeto que Os Verdes apresentaram, defendíamos a necessidade de um período de adaptação e de um período transitório, porque também não somos levianos a ponto de pensarmos que isto acaba de um dia para o outro — não! Mas essa responsabilidade tinha de ser assumida, Sr. Ministro.
Nesse sentido, o que Os Verdes pedem é que o Governo pondere se, na Comissão Europeia, a nível europeu, não deve mesmo alterar a sua posição. Esse é o pedido que Os Verdes fazem. O voto contra é um voto determinado na defesa da saúde pública e do ambiente.
2ª Intervenção
Sr. Presidente, senti necessidade de dar uma resposta ao Sr. Deputado Álvaro Batista, do PSD, não tanto por se ter referido à CDU, como é evidente, mas porque disse um conjunto de coisas que, na minha perspetiva, são absolutamente perigosas.
O Sr. Deputado acaba por ser — não me leve a mal a expressão que vou utilizar — um político perigoso. Sabe porquê? Porque subvaloriza completamente o risco para a saúde humana de determinadas substâncias.
Se eu lhe der exemplos como o amianto, como o glifosato, que hoje estamos a discutir, ou como os organismos geneticamente modificados, para o Sr. Deputado isso é tudo irrelevante. Sabe porquê? Porque as pessoas não inalam amianto, ou glifosato ou outra substância qualquer e caem para o lado; se caíssem para o lado, o Sr. Deputado despertava. Mas, como estas coisas têm efeito a médio e a longo prazos, o Sr. Deputado não se preocupa, o que é muito grave, porque nós, na nossa atuação política, devemos, de facto, ter uma perspetiva de curto prazo, mas com um olhar para o médio e para o longo prazos. É isto que faz a responsabilidade. É isto que faz adotar um princípio da responsabilidade e um princípio da precaução, que deveria movê-lo para atuar. Mas, como o Sr. Deputado não vê perigo à vista, não faz mal. E depois utiliza a demagogia para encher o seu discurso de argumentos, dizendo: «Qualquer dia as pessoas ficam proibidas de ir à praia porque o sol pode provocar cancro»!
Mas o Sr. Deputado esquece uma coisa fundamental, que é a pessoa voluntariamente querer…
Dizia eu que o Sr. Deputado esquece uma coisa fundamental, que é a pessoa voluntariamente querer agir de uma determinada forma ou não poder e, involuntariamente, sujeitar-se a determinados perigos.
É isso que o senhor está a oferecer, ou seja, está a querer expor as pessoas, involuntariamente, a determinados perigos.
Isso não faz um político responsável.