|
05/07/2017 |
Sobre o contrato com a Sociedade SIRESP, SA (DAR-I-105/2ª) |
|
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 5 de julho de 2017
1ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Sandra Cunha, como muito bem referiu da tribuna, o SIRESP resulta de uma parceria público-privada e, como sucede nas parcerias público-privadas, também nesta o interesse público ficou para trás.
Neste caso, aliás, basta constatar que os portugueses vão pagar cinco vezes mais do que o valor despendido pelo consórcio nesta rede de comunicações de emergência.
Portanto, é um bom negócio para os privados, mas é um negócio desastroso do ponto de vista financeiro, mas não só, para o Estado e para os contribuintes.
Mas o processo do SIRESP é ainda um processo com muitos sobressaltos, desde a sua criação ou, até mesmo, antes da sua criação. É um processo pouco transparente, obscuro e com muitos elementos estranhos à mistura.
Tratou-se de uma parceria público-privada criada por um governo de gestão do PSD/CDS, com pareceres da Procuradoria-Geral da República a dizer que um governo de gestão não tinha competência para aprovar um negócio com a importância do SIRESP.
Mais: tratou-se de um processo com atos que foram anulados, com o Tribunal de Contas a duvidar da legalidade do concurso e a criticar o prazo dado pelo Governo de Durão Barroso para a apresentação das propostas a concurso, que foi de apenas 52 dias. Foi um concurso em que só apareceu um concorrente — a Motorola, em parceria com a Sociedade Lusa de Negócios —, um concurso em que o Governo de Durão Barroso permitiu que o único concorrente reformulasse a sua proposta, porque, inicialmente, era inadequada ao interesse público a prosseguir.
Tratou-se, portanto, de um processo muito estranho.
Sr.ª Deputada, para além disso, temos ainda as fragilidades que o SIRESP tem vindo a demonstrar ao longo do tempo. Infelizmente, toda a gente conhece o SIRESP, mas conhece-o, sobretudo, por causa das suas falhas, das suas fragilidades e das suas insuficiências.
Nós também consideramos que, dada a importância que o sistema integrado das redes de emergência representa para o País, é necessário trazer o interesse público para a equação e, nesse sentido, acompanhamos o Bloco na necessidade de o Estado chamar a si as responsabilidades que atualmente estão entregues ao consórcio que gere o SIRESP.
Mas, Sr.ª Deputada Sandra Cunha, quando olhamos para todo o processo do SIRESP, nomeadamente para o curto prazo dado para a entrega das propostas a concurso no tempo do Governo de Durão Barroso — provavelmente, até para afastar outros concorrentes —, quando olhamos para a faculdade que esse mesmo Governo acabou por dar ao concorrente para reformular a sua proposta, em vez de abrir um concurso novo, ficámos com a ideia de que esse concurso ou esse negócio foi exatamente feito à medida da Motorola e da Sociedade Lusa de Negócios e não à medida do interesse público, como se impunha e como deve ser.
Ora, esta situação desvirtua tudo o que se pretende salvaguardar com os concursos públicos, nomeadamente a transparência dos contratos, mas afasta, ainda, o interesse público, que devia ser a premissa maior nestes contratos e também nestes concursos.
O que pergunto à Sr.ª Deputada Sandra Cunha é se partilha da leitura que fazemos relativamente ao concurso que deu origem ao SIRESP.
2ª Intervenção
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Como hoje já tive oportunidade de recordar, o processo do SIRESP está rodeado de singularidades, desde o concurso público que lhe deu suporte, passando pelo prazo para a entrega das propostas, até à faculdade que o Governo de Durão Barroso deu ao único concorrente para corrigir a sua proposta inicial, em vez de fazer um novo contrato ou um novo concurso. Tudo isto mostra bem os contornos deste contrato e, também, as preocupações com o interesse público, que, normalmente, ficam de fora nas negociações das parcerias público-privadas, como aconteceu no caso do SIRESP.
O percurso não só da formação do contrato do SIRESP mas também do seu desenvolvimento é pouco claro, ou mesmo obscuro, repleto de elementos estranhos. A estes factos temos ainda de somar as próprias fragilidades que o SIRESP tem vindo a demonstrar ao longo do tempo, no que diz respeito à prossecução das responsabilidades que decorrem do contrato, fragilidades que não começaram apenas com a tragédia de Pedrógão Grande, remontam, pelo menos, a 2014, logo após os trágicos acontecimentos de Carregal do Sal. E não são apenas os relatos das populações que indiciam falhas no SIRESP, são também as próprias autoridades que nos dão conta das falhas nas comunicações não só durante o combate aos incêndios mas também em operações de simulacro.
O pior é que o Estado não tem o poder de, por exemplo, exigir ao consórcio um tempo máximo de reposição da rede de emergência, se esta deixar de operar numa determinada zona. Ou seja, numa situação de emergência, se a rede falha, o Estado fica de pés e mãos atados, mas, numa situação de emergência, isto não pode acontecer.
Para terminar, quero dizer que Os Verdes também consideram que o SIRESP se tem mostrado ineficaz e, portanto, incapaz de garantir a segurança e a proteção das populações, motivo pelo qual, e em nome do interesse público, também entendemos que o Estado deve chamar a si o Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal.