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06/07/2016 |
Transparência, suplemento de reformas privatização da segurança social (DAR-I-87/1ª) |
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Intervenção do Deputado José Luís Ferreira - Assembleia da República, 6 de Julho de 2016
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Nuno Magalhães, certamente que não o irá reconhecer, mas a leitura que fazemos das políticas dos últimos quatro anos em matéria de segurança social, portanto, das políticas do Governo que o CDS integrou, e nesta matéria com particulares responsabilidades, é a de que elas tinham dois propósitos muito claros.
Em primeiro lugar, a privatização progressiva do sistema, com a introdução do plafonamento e, em segundo lugar, a redução da despesa com prestações em pagamento, de que, aliás, os tais 600 milhões de euros que o Governo anterior pretendia retirar às pensões é apenas um exemplo.
Em matéria de segurança social, o controlo do aumento da despesa pública foi a única preocupação das várias alterações ao sistema da segurança social. Vou dar exemplos.
Primeiro, a suspensão da antecipação da idade de reforma, que teve, como consequência, que, entre 2012 e 2014, os trabalhadores estivessem impedidos de se reformarem com idade inferior à idade legal de reforma.
Segundo, a indexação da idade de reforma à esperança média de vida, uma medida que veio penalizar ainda mais a reforma antes da idade legal.
Terceiro, o agravamento do fator de sustentabilidade feito pelo anterior Governo, que veio penalizar, de forma muito violenta, as pessoas que anteciparam a idade de reforma.
Aliás, o Governo PSD/CDS acabou por nem publicar sequer a portaria com os coeficientes de revalorização dos salários que servem para o cálculo das pensões e, com essa omissão — não sei se intencional ou não, se calhar o Sr. Deputado ou alguém da sua bancada poderá esclarecer… —, a verdade é que as pessoas que se reformaram em 2015 estão a receber pensões mais baixas do que aquelas a que teriam direito se a portaria tivesse sido publicada pelo anterior Governo.
Mais: a obsessão do Governo PSD/CDS com a austeridade acabou por multiplicar não só o desemprego como também a emigração, que são dois fatores decisivos para a sustentabilidade da segurança social, e que teve ainda reflexos ao nível da natalidade, agravando as condições dessa sustentabilidade.
Hoje, o CDS-PP apresenta-nos um projeto de lei sobre a segurança social e esta iniciativa legislativa, a nosso ver, assenta basicamente, por um lado, num pretendido reforço da transparência do sistema — e, apesar de a transparência ser, de facto, uma premissa essencial no sistema, não nos parece que o modelo de informação proposto pelo CDS-PP seja o mais adequado, para além de registarmos que o CDS, agora que está na oposição, está preocupado com essa transparência quando, na anterior Legislatura, rejeitou projetos de resolução — e, por outro, na criação de um suplemento para a reforma. Sucede que o suplemento para a reforma já existe e já existe desde a criação do Regime Público de Capitalização.
Portanto, a criação de um suplemento para a reforma não é novidade. Oiçam o resto: a novidade que o CDS pretende com o modelo de pensões é que este Regime Público de Capitalização seja apenas uma das várias ofertas onde convivam também produtos de oferta privada.
Essa é que é a vossa aspiração e é nesta pretensão que reside a única novidade desta iniciativa legislativa.
O CDS, com esta proposta, pretende promover e valorizar os produtos de outros regimes de natureza privada, ou seja, os PPR privados, os PPR em potência. Dito de outra forma, foi esta a fórmula encontrada pelo CDS, mais ou menos encapotada, para privatizar o sistema de segurança social.
Em síntese, o CDS, nesta proposta, mais não faz do que assumir expressamente a defesa dos regimes privados complementares de pensões privadas e, sendo a adesão automática, acaba por atribuir-lhe também uma natureza obrigatória.
Sr. Deputado Nuno Magalhães, a pergunta que lhe deixo é esta: é ou não legítimo concluir que a verdadeira intenção do CDS nesta proposta, como disse há pouco, uma intenção mais ou menos disfarçada, é a de introduzir o pilar de capitalização enquanto pilar obrigatório e, assim sendo, as preocupações com a transparência do sistema servem apenas para disfarçar essa intenção e aparecem como uma espécie de adereço de decoração?
Além disso, o Sr. Deputado disse, da tribuna, que este não é um projeto de lei sobre a sustentabilidade da segurança social, mas isso já sabemos, este é um projeto de lei sobre a insustentabilidade da segurança social, disso não há dúvidas.
Mas também percebemos por que é que o CDS não quer falar da sustentabilidade da segurança social. É que ao falar de segurança social teremos de falar, forçosamente, da sua sustentabilidade e este é um assunto que exige que se tomem medidas de facto e que se combata a evasão e a fraude contributiva, que atingem hoje níveis muito elevados.
Estas não são as únicas preocupações. É preciso também falar — e se calhar é também por isso que o CDS não quer falar da sustentabilidade da segurança social — sobre a erosão da base contributiva. Neste sentido, seria importante saber se o CDS está ou não disponível para procurar soluções legislativas com vista a alargar a base de cálculo das contribuições das empresas, de forma a considerar toda a riqueza criada no País e não apenas a parte dos ordenados e dos salários. É importante que isto aqui seja dito.
Sr. Deputado, por fim, é também importante saber se esta proposta constitui um elemento para a sustentabilidade da segurança social ou se, pelo contrário, vai fragilizar ainda mais a segurança social.
Já que se falou de provérbios, Sr. Deputado Nuno Magalhães, sabe por que estamos preocupados com esta proposta? Porque, como se diz na minha terra, «quando a esmola é muita, o pobre desconfia», e ver o CDS preocupado com o sistema público de segurança social é, de facto, motivo para desconfiar.