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29/06/2010 |
Projecto de Resolução Nº. 197/XI APOIO À CANDIDATURA DA ARRÁBIDA A PATRIMÓNIO MUNDIAL |
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A Arrábida é um sítio natural de valor profundamente reconhecido, reforçado nos seus conteúdos pelos contrastes que nos oferece, entre o mar e a terra, a serra, os vales e as magníficas praias, a natureza e as obras construídas, a influência mediterrânica e atlântica, constituindo um relevo natural que divide litoral e interior.
Constituindo a própria Arrábida uma paisagem magnífica, possível de apreciar de numerosos locais da região envolvente, dela também é possível uma panorâmica sobre uma vastíssima área circundante. Do Formosinho é possível apreciar a beleza do Estuário do Sado e diversas serras (Louro, Risco, S.Luis e Gaiteiros). De resto, a serra do Risco possui as maiores falésias à beira-mar de todo o continente, sendo esta a escarpa calcária mais elevada de todo o nosso litoral.
A Arrábida integra em si fenómenos geológicos de profunda relevância científica, que permitem acesso ao conhecimento de vários estádios da evolução (da abertura do Atlântico norte à colisão com a placa africana) e comporta outros fenómenos geológicos muito importantes como a falha normal El Carmen ou a Brecha da Arrábida.
O seu rico coberto vegetal, com origem de há cerca de 180 milhões de anos, fez a sua evolução milenar com fonte mediterrânica, mas também com influências atlânticas, o que lhe confere características únicas. Há locais onde a vegetação conserva parâmetros muito próximos das originais. Nela encontram-se espécies como o carvalho português, o medronheiro, o loureiro, o zambujeiro, o carrasco. Há locais onde a densidade arbórea é de tal ordem, que representa dos últimos vestígios de maquis mediterrâneo. Este património é criado por um micro-clima muito específico, temperado com influências atlânticas, numa nítida transição das componentes climáticas marítima e continental, conjugadas num relevo acidentado.
Estas características são igualmente propícias para a variedade de fauna que é possível encontrar na Arrábida, das mais diversas espécies: coelho-bravo, gato-bravo, geneta, texugo, toirão, doninha, raposa, bufo-real, águia-de-Bonelli, francelho-de-dorso-liso, falcão peregrino, morcego-rato-grande, morcego-de-ferradura-mourisco, morcego-de-peluche, borboletas (estão inventariadas 130 espécies de Lepidópteros), escaravelhos (estão inventariadas 450 espécies de Coleópetros). Em termos de vertebrados estão identificadas 213 espécies no Parque Natural da Arrábida. A acrescer a todo este riquíssimo património, o Parque Natural Luiz Saldanha apresenta uma vasta biodiversidade, tendo já aí sido identificadas mais de 1000 espécies de fauna e flora marinhas. Há uma espécie, Anapistula Ataecina, da família Symphytognathidae, que é uma aranha tropical mais pequena da Europa e das mais pequenas ao nível mundial – é a única registada na Europa até à data.
A ocorrência de micro-climas na Arrábida permite também a criação de endemismos, que tornam certas áreas muito particulares e únicas. Ao nível da flora existem dois endemismos únicos (Convolvulus fernandesii e Euphoria Pedroi) que surgem entre o Cabo Espichel e o Cabo de Ares.
As grutas existentes na Arrábida, o cabo Espichel, toda a costa Arrábida-Espichel, o parque marinho são apenas alguns exemplos de locais determinantes para a sobrevivência de muitas destas espécies.
A par deste vastíssimo e valiosíssimo património que a Natureza gerou na Arrábida, esta zona aglomera um riquíssimo património cultural.
É de salientar que a imediação de mar, de praias, de grutas e de outras características da Arrábida foram relevantes para a fixação humana, cujos indícios de ocupação remontam a cerca de um milhão e duzentos mil anos atrás. No Portinho da Arrábida, na Lapa de Sta. Margarida existem vestígios arqueológicos do paleolítico inferior, na Roça do Casal do Meio existem vestígios do calcolítico e da idade do bronze final, no Creiro existem sinais da época romana e muitos outros vestígios foram encontrados que nos indicam presenças de comunidades pré-históricas, fenícias, romanas e árabes.
A Arrábida foi, ao longo dos séculos, objecto de preferência para muitas opções de património construído, que dão hoje um significado cultural diverso e rico àquela região: o Convento da Arrábida, o Forte de Sta. Maria da Arrábida, os castelos medievais, como o de Sesimbra e de Palmela, as fortalezas de S. Filipe, Santiago e Outão, edificações religiosas, palácios, quintas, as quais são muito afamadas e apreciadas.
Para além deste património construído, há ainda um vastíssimo património cultural agregado a diversas actividades humanas que caracterizam muito particularmente e largamente a Arrábida – da gastronomia, às práticas agrícolas, de pesca e de pastorícia, até a manifestações e festividades religiosas de cariz popular que são bem características desta zona. São tradições populares que passam de geração em geração e que criam um forte laço entre a cultura e as componentes sociais e naturais.
O que aqui ficou descrito é apenas uma brevíssima síntese de tudo quanto nos oferece a Arrábida e de tudo quanto, pelo seu alto valor e relevância, merece um reconhecimento efectivo, bem como um estatuto de protecção e de valorização importante.
É bem verdade que há sítios na Arrábida que já foram objecto de classificação – o Parque Natural da Arrábida, o parque marinho Luiz Saldanha, a baía de Setúbal como uma das mais belas baías do mundo, o cabo de espichel como zona de protecção especial, a Gruta do Zambujal como sítio classificado com interesse espeleológico, algumas espécies através da convenção de Berna, entre outras.
Ocorre, porém, que se torna evidente a importância da classificação de toda uma área contínua (desde o morro do castelo de Palmela até à plataforma do cabo Espichel, incluindo o Parque Marinho Luis Saldanha, abrangendo os concelhos de Palmela, Sesimbra e Setúbal) que integra todo um património que importaria não espartilhar e que tem muito mais valor pela sua diversidade e simultânea unificação como património a preservar.
Para além disso, a Arrábida merece uma classificação que consiga promover a ligação da componente ambiental (o único critério que tem gerado classificações da área) com uma componente cultural, história e social porque são todas essas diversas componentes que geram uma riqueza completa e única que merece ser encarada numa dimensão global e não meramente sectorial, porque essa dimensão global lhe conferirá um valor ímpar e muito mais rico, porque diverso e completo, numa ligação que se quer sempre harmoniosa entre a presença humana e os valores naturais.
É com estes objectivos que está já “no terreno” uma candidatura da ARRÁBIDA a património mundial, suja classificação é atribuída pela UNESCO.
Essa candidatura foi promovida pela Associação de Municípios do Distrito de Setúbal e foi já assinado um protocolo de colaboração e pareceria entre esta entidade e o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), com vista à elaboração do processo de candidatura da Arrábida a património mundial.
A estrutura de apoio à elaboração desta candidatura está também já constituída através de uma comissão executiva, de uma comissão técnica, de uma comissão de acompanhamento e de um fórum da candidatura, estruturas que agregam múltiplas instituições e entidades da região, num processo que se quer agregador, participativo e bastante amplo.
É entendimento do PEV que este processo é de tal forma enriquecedor para o país, que a Assembleia da República não deveria ficar alheia a esta candidatura e deveria contribuir, no âmbito das suas competências, para lhe atribuir força e para lhe reconhecer a importância que tem. Daí a proposta que o Grupo Parlamentar “Os Verdes” apresenta ao Parlamento, no presente Projecto de Resolução:
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República, reunida em plenário, resolve:
1. Saudar a candidatura da Arrábida a património mundial, agregando a sua riqueza natural, cultural, social e histórica numa dimensão global, que lhe confere um riqueza ímpar e completa, digna de um reconhecimento universal.
2. Recomendar que as entidades públicas nacionais manifestem o seu apoio a esta candidatura.
3. Recomendar ao Governo que disponibilize financiamento para a valorização desta candidatura.
Palácio de S. Bento, 29 de Junho de 2010
Os Deputados
Heloísa Apolónia
José Luís Ferreira