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09/02/2011 |
Projecto de Resolução Nº. 396/XI REVOGAÇÃO DO DESPACHO 19 264, QUE PROCEDE AOS CORTES NO TRANSPORTE DE DOENTES NÃO URGENTES |
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O Despacho nº 19264/2010, de 29 de Dezembro, do Secretário de Estado da Saúde e a Circular Informativa da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) nº 2 de 07/01/2011, vieram materializar a decisão do Governo em efectuar cortes profundos no transporte de doentes não urgentes, o que está a causar situações graves e dramáticas na vida de milhares de doentes, utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
As orientações aí inscritas reflectem um corte generalizado e quase integral da atribuição de credenciais de transporte aos utentes que necessitem deslocar-se a consultas e tratamentos, o que abre o caminho a grandes injustiças sociais e impossibilita a universalidade e acessibilidade dos serviços de saúde públicos, contrariando uma imposição constitucional.
Estas medidas, que entraram em vigor no passado dia 1 de Janeiro, fazem com que o SNS apenas garanta o pagamento do transporte de doentes não urgentes nos casos em que, simultaneamente, se verifiquem dois pressupostos, a justificação clínica e a insuficiência económica, o que põe claramente em causa a acessibilidade das populações ao SNS.
Ora, milhares de utentes, em todo o país, são afectados por esta medida, deixando de ter acesso ao direito aos cuidados de saúde, por não terem condições para assegurar os custos deste serviço, vendo-se agora obrigados ao pagamento desse transporte, que pode chegar a atingir valores bastante elevados e incomportáveis.
De salientar que o acesso a estes cuidados de saúde é ainda mais escasso e difícil em regiões onde as condições socioeconómicas das populações são inferiores e as distâncias impõem maiores dificuldades, o que tende a agravar a situação.
Ou seja, um número considerável de utentes não detém recursos económicos nem meios de transporte e, mesmo assim, é-lhes negada a atribuição da credencial de transporte, fazendo com que não se possam deslocar ao serviço de saúde.
É, ainda, de referir que o Governo encerrou dezenas de Serviços de Atendimento Permanente (SAP), garantindo que reforçaria significativamente os meios de transporte aos utentes, mas a realidade está à vista e, actualmente, os SAP estão encerrados e o transporte não está minimamente assegurado.
Tendo em conta que o acesso aos cuidados de saúde está inscrito na Lei nº 48/90, de 24 de Agosto, que determina como objectivo fundamental da política de saúde o acesso aos cuidados de saúde, garantindo o SNS a equidade a fim de “atenuar os efeitos das desigualdades económicas, geográficas e quaisquer outras”, e tendo em conta que é um direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa que confere a sua universalidade, este direito deve ser urgentemente restituído às populações.
Por outro lado, e para além das repercussões que afectam directamente as populações, esta medida está a criar cenários de graves dificuldades financeiras nas associações humanitárias de bombeiros, o que poderá levar a despedimentos de bombeiros e outros funcionários, pondo em causa a capacidade para efectuarem o referido transporte, mas também a capacidade necessária à realização de outras actividades.
Acresce a esta situação que, em 2009, a Liga dos Bombeiros Portugueses celebrou um contrato, definindo as normas do transporte de doentes em ambulância, nunca chegaram a ser totalmente aplicadas no território nacional, uma vez que seriam admitidas diferentes aplicações segundo o entendimento dos responsáveis de cada Administração Regional de Saúde (ARS).
De facto, nos últimos tempos as corporações de bombeiros têm manifestado a sua crescente preocupação relativamente a esta matéria devido às medidas assumidas pelo Governo.
Face a esta situação inadmissível, “Os Verdes” consideram urgente que o Governo revogue rapidamente as medidas adoptadas relativamente ao corte no transporte de doentes não urgentes, garantindo uma efectiva acessibilidade dos utentes do SNS aos serviços públicos de saúde, e garanta o rigoroso cumprimento do contrato assinado com a Liga dos Bombeiros Portugueses;
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar “Os Verdes” propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1. Revogue urgentemente as medidas de corte no transporte de doentes não urgentes, que constam do Despacho nº 19264/2010, de 29 de Dezembro, do Secretário de Estado da Saúde.
2. Garanta, na revisão da legislação sobre a matéria, a acessibilidade e a universalidade no acesso dos utentes aos serviços de saúde, tal como imposto pela Constituição da República Portuguesa.
3. Garanta o cumprimento do contrato celebrado com a Liga dos Bombeiros Portugueses relativamente ao transporte de doentes não urgentes, e proceda à definição, ouvindo a Liga dos Bombeiros, das normas essenciais à sua aplicação.
Assembleia da República, 9 de Fevereiro de 2011
Os Deputados,
José Luís Ferreira
Heloísa Apolónia