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03/12/2009
Combate à Corrupção
Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
sobre o combate à corrupção,
proferida na Assembleia da República a 3 de Dezembro de 2009
 
 

 

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

O combate à corrupção volta a ser tema nesta Assembleia mas com uma substancial diferença. Desta vez poderemos estar mais perto de promover uma verdadeira inversão, não do ónus da prova, mas do resultado da votação. Vamos esperar que sim.

São várias as iniciativas legislativas em discussão mas todas elas convergem, de uma forma ou de outra, num único propósito: combater a corrupção.

Um combate que se impõe, por imperativos éticos, para melhorar a nossa vivência democrática e credibilizar as suas instituições. Um combate na defesa e na afirmação de uma cultura de responsabilidade.

E neste combate, ganha uma importância decisiva a necessidade da criação do crime de enriquecimento ilícito, aplicável quer a funcionários públicos, quer aos titulares de cargos políticos.

A criação deste tipo criminal pode não ser a solução para acabar com a corrupção, que certamente não será, mas reveste uma importância decisiva para o sucesso no seu combate.

A impunidade com que os cidadãos tantas vezes vão assistindo, perante o enriquecimento “estranho” de pessoas que exercem Funções Publicas, não fragiliza apenas a ideia da Justiça, acaba por descredibilizar também o conjunto das instituições democráticas, criando fortes desconfianças sobre o seu funcionamento.

É também por isso que entendemos que a transparência que deve nortear a gestão da coisa pública e, sobretudo, a responsabilização das pessoas que têm essa missão, perante os restantes cidadãos, exige, a nosso ver, a criminalização do enriquecimento ilícito.

Naturalmente que essa criminalização deve ser feita no respeito pelas garantias Constitucionais, tanto a nível Penal, como a nível Processual Penal e, em primeiro lugar, a presunção da inocência e tudo o que ela pressupõe, desde logo, o Ónus da prova que tem, obviamente, de recair sobre o Ministério Público.

Ora, a nosso ver, tanto o Projecto de Lei do Bloco de Esquerda como o do PCP, não procedem a nenhuma inversão do ónus da prova e, portanto, pretendem promover o enriquecimento ilícito a crime, respeitando as garantias Constitucionais.

Em ambos os projectos é ao Ministério Público que, no âmbito dos seus poderes de investigação, compete fazer prova da desproporção entre o património e os rendimentos normais que decorrem do exercício de determinada função e se essa desproporção for obtida de forma lícita, está obviamente excluída a ilicitude.

Não vemos pois qualquer inversão do ónus da prova e surpreende-nos a insistência neste virtual obstáculo por parte do Partido Socialista.

Desde logo porque o Estado Português, através da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, assumiu o dever de introduzir o crime de enriquecimento ilícito na sua arquitectura legislativa em matéria penal.

E quando essa Convenção, a Convenção de Mérida, subiu a Plenário nesta Assembleia, em Junho de 2007, que recorde-se foi aprovada por unanimidade, ninguém levantou reservas sobre a sua conformidade com a nossa Constituição, ninguém questionou a sua Constitucionalidade, ninguém veio dizer que Portugal não podia assumir esse compromisso porque ao faze-lo estaria a violar o princípio constitucional da presunção da inocência, ninguém vislumbrou a inversão do ónus da prova. Pois não, porque de facto não há qualquer inversão do ónus da prova.
Quanto ao Projecto do BE que pretende derrogar o sigilo bancário, ou melhor, pretende dotar o fisco de informações para poder actuar e combater o crime económico e a corrupção:
Na posse dessas informações, o fisco estaria em condições de analisar as discrepâncias substanciais, entre os saldos e movimentos de depósito nas contas individuais, e as respectivas declarações fiscais, para posteriormente e sendo caso disso, proceder à sua comunicação ao Ministério Público.
Trata-se, na nossa perspectiva, de uma medida indispensável para reforçar o combate à fraude fiscal.
Também estamos de acordo, não só que a moldura penal seja igual tanto para a corrupção activa como passiva, como também com a criação de um único tipo criminal de corrupção, seja própria, ou seja imprópria, deixando, depois, o grau da ilicitude do acto, ser reflectido ao nível da culpa e da determinação da medida concreta da pena.

E estamos de acordo porque, de facto, o bem jurídico que se pretende proteger é o mesmo, a manutenção do Estado de direito.
E este bem jurídico encontra-se sempre ameaçado em qualquer uma daquelas situações porque em qualquer uma delas estamos sempre a falar de corrupção.
Em síntese, nós consideramos que todas as contribuições que, de uma forma ou de outra, potenciem e reforcem a eficácia no combate à corrupção, são sempre bem-vindas, respeitando, obviamente, as respectivas garantias Constitucionais, tanto a nível Penal, como a nível Processual Penal o que, a nosso ver, sucede nos Projectos em discussão e, portanto, vamos votá-los favoravelmente.

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