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07/07/2010
Debate de actualidade sobre cortes nos apoios públicos à actividade cultural
Intervenção da Deputada Heloísa Apolónia
- Assembleia da República, 7 de Julho de 2010 -
 
 
 
 
Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares — é bom não nos esquecermos de que é o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares que está presente neste debate e não a Sr.ª Ministra da Cultura —, Sr.as e Srs. Deputados: Sr.ª Deputada Inês de Medeiros, se me permite, começo por fazer um comentário à sua intervenção.
A Sr.ª Deputada disse que o sector cultural está muito consciente das dificuldades que o País atravessa, tendo chegado a dizer qualquer coisa parecida com, se não entendi mal, que o sector da cultura quer esta medida do Governo. Só faltou a Sr.ª Deputada dizer que se não tiver «isto» o sector da cultura fica chateado com o Governo! Só faltou dizer isso! E o que é «isto», para que nos entendamos bem? São os cortes na área da cultura.
Sr.ª Deputada, julgo que aquele sintoma de alheamento da verdadeira realidade do País já não está só com o Sr. Primeiro-Ministro, já passou para todos os Srs. Deputados do Partido Socialista. E isso é muito mau, Sr.ª Deputada!
É bom que os Srs. Deputados do Partido Socialista se consciencializem bem daquilo que se está a passar no País e, fundamentalmente, do sentimento desses agentes dos diferentes sectores, que, como a Sr.ª Deputada sabe — e nós sabemos que sabe —, andam a contestar profundamente esta medida do Governo.
Portanto, a Sr.ª Deputada não diga que toda a gente aplaude e que todos ficam contentes, porque não ficam, Sr.ª Deputada! O descontentamento é generalizado e não é um descontentamento qualquer, porque há um prejuízo real na área da cultura, como muito bem já aqui disseram outros grupos parlamentares.
Dirijo-me agora ao Sr. Ministro — que não sei se pretende ouvir o debate ou se já traz o discurso feito, não lhe importando os argumentos que aqui venham a ser invocados — para lhe perguntar concretamente se se lembra do erro assumido pelo Sr. Primeiro-Ministro em campanha eleitoral, ou seja, apresentou-se ao eleitorado referindo que houve um erro crasso cometido na anterior Legislatura, que foi a pouca aposta na cultura em Portugal. É, pois, importante que o Sr. Ministro relembre a esta Câmara as palavras do Sr. Primeiro-Ministro, na altura da campanha eleitoral, sobre o desinvestimento real que foi feito na área da cultura.
Mas o Sr. Primeiro-Ministro não disse só isso. Também disse que no próximo mandato esse erro seria ultrapassado e deveria haver, de facto, um investimento muito mais significativo na área da cultura. Ora, não é isso que se está a verificar, como bem conseguimos perceber através das medidas que vão sendo tomadas — não apenas esta, mas as do PIDDAC. O PIDDAC do Orçamento do Estado para 2010 já tinha dado uma resposta concreta com os cortes reais efectuados na área da cultura e, portanto, essa opção estava manifestamente tomada.
Isto tem uma causa, Sr.ª Deputada. Não invoque sempre a crise! É uma opção política muito concreta. Sabe porquê, Sr.ª Deputada Inês de Medeiros? Se, de facto, esta crise requeresse respostas excepcionais e com coragem, aquilo que o Governo teria feito, como nós já aqui temos tantas vezes invocado — e, se calhar, a Sr.ª Deputada concorda com isso —, seria ter eventualmente criado, ainda que a título transitório, um imposto sobre as grandes fortunas; ter taxado a banca à mesma medida que taxa as pequenas e médias empresas, ao nível do IRC; ter taxado as mais-valias, não de uma forma do género brincadeira mas, de facto, todas e as grossas mais-valias bolsistas. Estas, Sr.ª Deputada, é que eram medidas de coragem, estas é que eram aquelas medidas excepcionais de coragem que trariam uma resposta concreta ao País, ao nível das suas contas públicas.
Mas não o fez e, portanto, este Governo não foi corajoso. E sabe porquê, Sr.ª Deputada? Quando se toca só nos mais frágeis desta sociedade não se demonstra coragem, demonstra-se uma grande irresponsabilidade política, e é isso que o Governo tem demonstrado, completa e permanentemente!
E o desrespeito é de tal ordem que estas pessoas, que dedicam toda a sua vida, como a Sr.ª Deputada bem sabe, à área da cultura, quantas vezes com esforços supremos, assumiram já compromissos financeiros, designadamente bancários — é sempre a banca a ganhar, como nós percebemos —, com projectos já acordados, e agora aquilo que o Governo vem dizer é «corte-se!».
Sr.ª Deputada, nesta situação e com este tipo de políticas e de medidas que o Governo vai tomando, sem olhar, de facto, às suas consequências concretas, quem é que não fica na miséria — entendamos aqui miséria a todos os níveis?!
O Governo, que prometeu investir na cultura, está neste momento a dar uma machadada na área da cultura. Lembra-nos aquele seu primeiro mandato, em que a área da educação era a grande relevância e, depois, viu-se o que aconteceu ao nível da política da educação. Não vale a pena meterem-se em mais nenhum sector, Sr. Ministro, senão a miséria será maior.
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