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21/12/2010
Debate de Actualidade sobre política de transportes

Intervenção do Deputado José Luís Ferreira
Assembleia da República, 21 de Dezembro de 2010

 
 
 
 
 
Ainda há duas semanas, ouvimos aqui, um Senhor Deputado do Partido Socialista congratular-se com a política do Governo para os transportes e mais concretamente com os investimentos do Governo na Ferrovia.

Mas afinal a política de transportes do Governo, mais não tem sido que transportar os portugueses para fora dos transportes públicos e sobretudo para fora dos comboios.

As intenções anunciadas recentemente de despedir centenas ou milhares de trabalhadores do sector dos transportes, em particular do transporte ferroviário, e de eliminar um conjunto de serviços de transporte colectivo, nomeadamente comboios regionais da CP e carreiras fluviais da Transtejo, é a todos os títulos inaceitável.

As medidas de reestruturação anunciadas pela CP e que implicarão, não só a redução de postos de trabalhos, como também a eliminação do serviço prestado às populações, só visam preparar e tornar apetecível a privatização do sector ferroviário.

De facto, o anúncio da reestruturação dos serviços de transportes nas regiões mais povoadas do País, Lisboa e Porto, e a abertura da concessão das linhas ferroviárias suburbanas, são a ponta do iceberg e uma prenda de natal descarada ao “lobby” rodoviário o qual está intrinsecamente ligado, como se sabe, às grandes empresas de construção.

“Os Verdes” não têm dúvidas que estas intenções, caso venham a concretizar-se, terão impactos sociais e ambientais gravíssimos, tanto a nível de emprego como a nível do agravamento do tempo passado em deslocações.

O alcance das intenções do Governo, para além de representarem um roubo de tempo às pessoas, tempo que deveria ser consumido com a família, representa ainda um forte aumento da factura energética, o agravamento da emissão de gases com efeito de estufa e da desertificação do interior.

São medidas que vêm contrariar a tendência que, fruto da crise, se estava a fazer sentir, ainda que de forma tímida, na deslocação do transporte individual para o transporte colectivo, e vêm completamente ao arrepio do que seriam as necessidades do presente e do futuro.

Num momento de crise económica e ambiental profundas, onde os transportes públicos, nomeadamente o transporte ferroviário, deveria ser um pilar fundamental de uma estratégia para um desenvolvimento que aliviasse a factura energética, que promovesse o emprego, que facilitasse a mobilidade e que combatesse as assimetrias regionais, faz-se exactamente o inverso.

E esta obsessão do Governo em desmantelar a Rede Ferroviária Nacional, em criar um modelo de gestão incoerente, que penaliza fortemente os utentes e que os afasta do transporte ferroviário, que fragiliza os meios de transporte que mais servem os portugueses das zonas do interior, no seu dia-a-dia, não é infelizmente novo. Já vem do tempo dos Governos de Cavaco Silva.

O problema foi que encontrou fiéis seguidores que pretendem cumprir, ao nível da política de transportes, as linhas essenciais, os traços mais marcantes, das políticas desses Governos de Cavaco Silva.

A ferrovia, que deveria ser encarada como um sector estratégico para o desenvolvimento do País e para combater as assimetrias regionais, acaba por ser objecto de uma constante cedência aos interesses declarados do lobby rodoviário.

A tão propagandeada reabertura da linha do Douro entre Pocinho até Barca de Alva fica à espera de nova campanha eleitoral.

A modernização anunciada da Linha do Oeste e o desvio da Linha do Norte ficam à espera de melhores dias.

O Ramal da Lousã, as Linhas do Tua, do Corgo e do Tâmega foram encerradas por este Governo.

O Alfa deixou de parar em localidades importantes como Santarém e Pombal, e deixou de parar em sítios estratégicos do ponto de vista ferroviário, como o Entroncamento.

E agora quando olhamos para o Plano de Actividades e Orçamento para 2011 da CP, só vemos supressões e mais supressões. É a página 29, repleta de supressões.

E para completar o cenário só faltavam mesmo os aumentos dos títulos de transporte e dos passes sociais.

Um aumento que vai, não só agravar a vida das famílias e dos trabalhadores, como também penalizar aqueles que, por opção, mas sobretudo aqueles que por necessidade, recorrem ao que representa uma boa prática ambiental, ao preferirem a utilização do transporte público em detrimento da utilização da viatura particular.

Perante este cenário, só falta mesmo atribuir uma medalha ao Senhor Ministro dos Transportes e ao Senhor Secretário de Estado dos Transportes.

E o que continua a faltar aos Portugueses é uma boa política de transportes públicos, que é, aliás, uma exigência dos nossos dias, mas que para a qual o Governo não está definitivamente virado.

O Governo, pelos vistos, apanhou outro comboio.

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