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05/05/2011
Declaração política da deputada Heloísa Apolónia sobre pedido de ajuda externa e negociações entre o Governo e a tróica
Assembleia da República
5 de Maio de 2011
 
 
 
 
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:
Julgo que todos saberão que uma visão ecologista da política não se mede por vistas curtas, tem sempre uma visão de médio e longo prazo extraordinariamente importante, que nos leva a agir pela construção de uma sociedade melhor mas também com o princípio da precaução muito presente.
Fazemos sempre muitos avisos. Fizemos em relação ao nuclear e aquilo que parecia improvável aconteceu. Hoje, o mundo confronta-se com isso. Fizemos muitos outros avisos relativamente a muitas outras matérias, e talvez seja importante começar, de uma vez por todas, a ouvir o que Os Verdes dizem.
Neste momento, podendo não ser simpático, é imperioso dizer: «nós bem avisámos». Mais: é imperioso continuar a avisar, esperando agora resultados diferentes dos «avisos à navegação».
Nós bem avisámos que liquidar a produção nacional era a maior asneira que Portugal podia fazer. Essa destruição progressiva do aparelho produtivo nacional levaria a que nos tornássemos mais e mais dependentes do exterior, que gerássemos mais desemprego em Portugal e que aumentássemos os nossos níveis de endividamento.
O certo é que a produção nacional foi paulatinamente destruída e, quando uma crise internacional nos bateu à porta, Portugal estava já fragilizado. Ora, em vez de mudar de rumo de modo a robustecer-se, afundou-se ainda mais, com mais PEC e orçamentos económica e socialmente recessivos.
Nós bem avisámos que o capitalismo é selvagem e que quando se trata de decidir entre o bem-estar do capital ou o bem-estar da população o capitalismo não olha para trás e não quer nem saber dos efeitos que as suas consequências trazem para as pessoas. No capitalismo não há sacrifícios distribuídos igualmente por todos.
Por isso, quando uma crise internacional nos bateu à porta, houve dinheiro para injectar e salvar a banca, para gerar todo o tipo de garantias ao sector financeiro, mas não houve dinheiro para aumentar salários e pensões, para gerar poder de compra, fundamental para as pessoas dinamizarem o nosso mercado interno e, assim, poderem contribuir para o não encerramento de tantas empresas, para o que a diminuição do investimento público também contribuiu grandemente. E a banca retribui… quando não quiser, não empresta mais dinheiro a Portugal!
Nós bem avisámos que precisávamos de um modelo europeu diferente, porque era nítido que países grandes, como a França e a Alemanha, conduziriam os destinos desta União Europeia a seu favor e de modo a tornar outros países, como o nosso, dependentes das suas economias. Assim, deram-nos dinheiro para construir betão e pagaram-nos para deixarmos de produzir.
Quando falávamos de uma Europa não defensora de Estados iguais e solidários entre si era disto que falávamos. E quantas vezes denunciámos este escândalo do Banco Central Europeu emprestar dinheiro aos bancos a uma taxa de 1%, para estes, depois, emprestarem aos Estados a taxas muitíssimo superiores, de 7% ou 8%? Por que razão não empresta o BCE directamente aos Estados? Por que razão a Europa troca este empréstimo directo do BCE aos Estados por fundos à FMI? Porque este modelo não tem como objectivo servir as pessoas mas, sim, o sistema financeiro!
Hoje até o europeísta dos europeístas, Mário Soares, contesta o caminho trilhado pela Europa e reconhece a fragilização que provocou a países como Portugal.
Nós bem avisámos que os pacotes de austeridade eram recessivos e trariam maus resultados à nossa economia. Vem agora o Primeiro-Ministro demissionário dizer que estamos na situação em que estamos porque o PEC 4 foi chumbado. Mas quem é que se está a querer enganar?! Então, cada pacote de austeridade não gerou mais desemprego? Cada pacote de austeridade não fechou mais a nossa economia? Cada pacote não nos tornou mais dependentes de ajuda externa? E queriam mais um?! É caso para dizer: deixem de brincar com isto! Esses pacotes de austeridade resultaram na entrada do FMI na Grécia e na Irlanda, não os salvaram, afundaram-nos ainda mais!
Sr.as e Srs. Deputados, uma coisa que fique clara: se estamos em situação de emergência, foram estas políticas que nos colocaram nesta situação. Neste País, o que se discute, hoje, é se é preciso ajuda externa — chame-se-lhe intercalar ou outra coisa qualquer — ou se é preciso ou não vir o FMI. Tudo soluções para mais afundamentos! Ao ponto a que chegámos!
Mas alguém, alguma vez, viu o Governo a procurar renegociar dívida? Ou a procurar renegociar metas de défice? Não, o que vimos é um Governo desistente, que nos leva para um buraco sem fundo. Não se perceberá que a única forma de ganharmos credibilidade no exterior (e de baixarmos o juro da dívida) é começarmos a gerar riqueza urgentemente e, logo, capacidade de pagamento? E isso remete-nos para a palavra-chave da solução: produzir. Justamente o que tem sido negado por estes agentes políticos.
Agora, o que vemos são esses agentes, os responsáveis por esta situação, porque responsáveis por estas políticas, a procurar dizer vergonhosamente que a culpa foi do outro. Mas eles têm nome: chamam-se PS, que tem estado no governo, chamam-se PSD, que também esteve no governo e que agora, na oposição, ajudou o PS a concretizar os males para Portugal, e também se chamam CDS-PP, que nestas décadas, no governo ou na oposição, lá foi «dando a sua mãozinha» quando necessário.
E estes responsáveis agora, com eleições à vista, têm comportamentos inqualificáveis: o PS vitimizar-se-á até à exaustão, referindo que a culpa foi o chumbo do PEC 4. Evitará que alguém se lembre que em todas as aprovações dos outros PEC o desemprego cresceu, a economia piorou e os juros da dívida aumentaram?! O PS jogará até à exaustão com a memória curta e sem pudor de dizer que nunca disseram ou fizeram o que realmente disseram ou fizeram.
O PSD procura desde já deixar claro que prosseguirá a mesma política, por exemplo, anunciando um hipotético aumento do IVA, que é recessivo para a economia, mas o que interessa é que querem ser eles a estar no governo — não lhes importa mudança de políticas mas, sim, quem é que as protagoniza.
O CDS não quer discutir responsabilidades do passado para que ninguém se lembre de lhes apontar o dedo. E assim vai este País…
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os Verdes, com a legitimidade de quem sempre foi realista, sempre contestou esta política e sempre propôs outra em alternativa, querem dizer que este País tem solução, mas só com opções políticas diferentes, que levantem Portugal, que o «arejem» deste «mofo» em que nos encontramos, que nos gerem melhoria das condições de vida, desenvolvimento sustentável e esperança na sobrevivência das gerações futuras.
Não queremos cá as opções à FMI, sejam elas protagonizadas pelo próprio FMI ou pelo FMI à portuguesa, ou seja, PS e PSD. Queremos um País levantado do chão, a produzir, a gerar riqueza. Os Verdes estarão sempre prontos para dar o seu contributo à concretização de políticas de esquerda que floresçam neste País com força, com determinação e com muita lucidez, para o levantarem do «buraco» em que foi colocado pelas opções de direita.
Portugal precisa de voltar a acreditar, Portugal precisa de esquerda. Os Verdes cá estão, inegavelmente, para dar o seu contributo.
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